A lei 14.382/2022 veio instituir uma nova possibilidade na regularização imobiliária, que é a adjudicação compulsória extrajudicial. Neste artigo vamos entender mais sobre essa nova possibilidade. Mas antes, é importante fazer uma contextualização.
Segundo o Ministério de Desenvolvimento Regional, calcula-se que de 60 milhões de domicílios urbanos do país, 30 milhões não possuem escritura. São diversos fatores que levam a irregularidade de imóveis no Brasil, o que já se tornou um problema histórico proveniente de invasão, loteamentos sem observância à legislação, terrenos e imóveis vendidos de forma ilegal, além de construções sem projeto aprovado pela prefeitura municipal.
Esses dados são extremamente preocupantes, uma vez que destaca o cenário de insegurança jurídica vivida pelos moradores e municípios. Sabe-se que são diversos os fatores que levaram a irregularidade de imóveis no país. Uma delas é a burocracia e o custo elevado de uma regularização imobiliária.
Para tanto, e devido o contexto histórico, as medidas para regularização das propriedades imobiliárias tem-se descomplicado por alterações na legislação vigente. Dentre as formas de desburocratizações temos como exemplo a possibilidade da usucapião extrajudicial e recentemente com a Lei 14.382/2022, a possibilidade da adjudicação compulsória por meio dos cartórios.
É extremamente comum na prática a compra e venda de imóveis apenas através da “promessa de compra e venda”. Isto gera um problema ao comprador, uma vez que, conforme amplamente demonstrado na legislação e jurisprudência o contrato de promessa de compra e venda possui natureza pessoal. Assim, só adquire a natureza de direito real se levado a registro nos cartórios de imóveis.
Art.1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art.1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
Os requisitos para interposição da ação seriam:
Necessário destacar que o último requisito foi afastado pelo Superior Tribunal de Justiça através da Súmula 239:
“O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.”
A ação de adjudicação compulsória é imprescritível e não está sujeita a prazo decadencial. Ou seja, não se torna obsoleta com o passar dos anos e não pode ser atingida pela decadência.
A Lei 14.382/2022, que dispõe sobre o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos, trouxe em seu artigo 216-B a possibilidade da adjudicação compulsória extrajudicial. Garantindo, assim, celeridade e maior segurança a quem adquire imóvel através da promessa de compra e venda.
O §1º do artigo supracitado determina que são legítimos a requerer a adjudicação:
Os requisitos para o procedimento são cumulativos, sendo necessários, assim:
O pedido de adjudicação compulsória extrajudicial poderá ser formulado após 15 dias do recebimento da notificação pelo promitente vendedor. Acredita-se, então, que o fato da não localização dos promitentes vendedores, devidamente certificado pelo CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS ou REGISTRO DE IMÓVEIS, não deve representar óbice ao pedido na medida em que, a citação editalícia pode ser uma opção, como ocorre inclusive no caso da usucapião extrajudicial.
O texto aprovado pelo Congresso Nacional exigia prévia ata notarial, mas o dispositivo foi vetado pelo Presidente da República, cujo veto foi mantido, sendo dispensada então a lavratura do documento.
Apesar de a apresentação da Ata notarial não ser requisito para o pedido junto ao cartório, é uma aliada indispensável na hora de comprovar fatos. Por exemplo, a comprovação de pagamentos por meio de conversas de aplicativos, se o promitente comprador não dispor do termo de quitação dos valores.
Destaca-se ainda que apesar de a comprovação de quitação do preço ser requisito para a Adjudicação Compulsória extrajudicial, esse requisito pode ser excepcionalmente dispensado, nos casos onde a pretensão de cobrança se encontra prescrita. Nesses termos, então, temos a decisão do TJGO, mantida pelo STJ (AREsp1488606/GO. J. em 17/12/2021), que determinou que “Acolhida a tese da prescrição, a consequência é o reconhecimento da quitação da dívida, com deferimento do pedido de adjudicação compulsória, uma vez que o recorrente não mais dispõe das ferramentas necessárias para a cobrança de seu crédito, já que sua pretensão encontra-se fulminada pelo advento da prescrição”.
A adjudicação compulsória extrajudicial, sem dúvida alguma veio para facilitar a regularização imobiliária. Entretanto, não deverá alcançar a procedência se a titularidade do promitente vendedor, não constar do registro, uma vez que o Princípio da Continuidade impede o lançamento de qualquer ato de registro sem a existência de registro anterior que lhe dê suporte formal e preserva as referências originárias, derivadas e sucessivas, de modo a resguardar a cadeia de titularidade do imóvel.
Anteriormente a adjudicação compulsória inversa era proveniente da construção jurisprudencial e consistia no direito do promitente vendedor de transferir a propriedade ao promitente comprador, agora a Lei 14.382/22 reconhece expressamente o direito do promitente vendedor à adjudicação do imóvel.
Sendo assim, à vista dos documentos a que se referem o § 1º do artigo 216-B, o oficial do registro de imóveis da circunscrição onde se situa o imóvel procederá ao registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título a respectiva promessa de compra e venda ou de cessão ou o instrumento que comprove a sucessão.
A alteração da Lei de Registros Públicos, com inserção da adjudicação extrajudicial, já está em vigor, entretanto os Tribunais de Justiça ainda terão de estabelecer o valor das custas para o procedimento.
É inevitável que problemas surjam com a prática, mas é indispensável que se reconheça as soluções que foram implementadas ao longo dos anos na seara judicial e que já foram incorporadas no procedimento extrajudicial.
Agora, aguarda-se a edição de ato Normativo pelo CNJ, como ocorreu com a Usucapião e o Inventário Extrajudicial, para haver uma melhor aplicação do novo instituto e para que se pratique todos os atos de forma segura à sociedade e aos registradores.
Escrito por: ELLEN QUÉTSIA ALVES CRUZ, advogada, atuante na área imobiliária, sócia proprietária do escritório Sousa e Cruz advogados, associada ao Instituto de Estudos Avançados em Direito e membro do Núcleo de Direito Imobiliário e condominial.
Adjudicação compulsória extrajudicial é um procedimento recentemente permitido pela lei 14382/22 nas ações de contrato de compra e venda de imóveis. É, então, uma ação que visa o registro de imóvel que ainda não possui documentação que a legislação requere.
É cabível sempre que existir impedimento jurídico do registro de imóvel sem documentação necessária requerida pela lei.
O §1º do artigo supracitado determina que são legítimos a requerer a adjudicação: o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou seus sucessores, bem como o promitente vendedor, sendo obrigatória a representação através de um advogado.
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Sem dúvida nenhuma, esta é uma solução que poderá auxiliar uma grande parcela dos promitentes compradores a regularizar seus imóveis.
Muito bom esse procedimento extrajudicial, colabora muito conosco advogado que ñ ficamos no aguardo prolongado do Judiciário inclusive do recebimento dos honorarios.
Bom dia , Presados!
Muito útil essas explicações. Mas preciso saber se realmente os cartórios estão cumprindo com o determinado?
Muito boa a explicação da Dra. Ellen. Gostaria de receber novidades por e-mail: priscilabrac@gmail.com