Direito de Família

Alienação parental: guia completo para advogados [2024]

Compreender sobre a alienação parental e sobre seus desdobramentos legais é de extrema importância para o advogado que deseja lidar com questões do Direito da Família, para representar seus clientes da forma mais profissional possível.

A alienação parental tem uma legislação de apenas dez anos, mas os seus desdobramentos e situações ocorrem em famílias brasileiras há muito mais tempo.

Compreender as condições psicológicas da alienação parental e seus desdobramentos legais, estabelecidos por legislação específica modelo para países do mundo inteiro, é de extrema importância para advogados interessados no Direito da Família.

Este artigo, portanto, tem como objetivo apresentar um guia completo sobre o assunto para advogados, apresentando o que é a alienação parental, a legislação vigente sobre o assunto e outras particularidades. Confira!

O que é a alienação parental?

A alienação parental é um termo utilizado para descrever ações que fazem com que a criança se afaste de um de seus pais por conta da carga negativa colocada naquele parente por um terceiro, que o difama na frente da criança com o objetivo de afastá-la da pessoa.

Uma vez que diferentes situações podem ocasionar a alienação parental, não há uma única ação que defina o termo, mas sim um conjunto de possibilidades, geralmente associadas com a disputa dos pais pela guarda ou pela convivência com o filho.

Como o nome já diz, as ações cometidas alienam a criança de um dos seus pais, por meio de provocações, xingamentos e demais falas e ações que desqualificam a pessoa alienada para o filho, fazendo com que o mesmo não tenha mais interesse em estar próxima do seu pai ou sua mãe.

As discussões acerca da alienação parental e de sua aparição relativamente comum em situações de separação de pais com filhos, principalmente em casos litigiosos, fez com que a legislação brasileira criasse uma Lei de Alienação Parental, que descreve como o caso é visto judicialmente e quais são as possíveis punições.

O que é a síndrome de alienação parental?

Embora os termos sejam utilizados às vezes de forma sinônima, a alienação parental e a síndrome de alienação parental não são a mesma coisa.

De acordo com o psiquiatra Daniel Martins de Barros, a alienação parental é a definição utilizada para apontar ações ou atos que tem como resultado final o alienamento (distanciamento, estranhamento) da figura parental em questão de seu filho.

A síndrome de alienação parental, por sua vez, não é entendida como um transtorno ou uma doença mental, mas aponta a situação onde a criança já se encontra distante e estranha ao pai alienado pela outra parte que está promovendo a alienação.

Dessa forma, a alienação parental aponta as ações e atos que levam a criança a ter a síndrome de alienação parental, que é a situação onde a criança ou adolescente não consegue mais manter um vínculo afetivo com o pai ou mãe alienada por conta das ações da pessoa que está cometendo a difamação.

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Lei nº 12.318/2010

A necessidade de tipificação legal das ações que culminam na alienação parental foi resolvida apenas em 2010, com a homologação da lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010, conhecida como a Lei da Alienação Parental.

A lei apresenta o que é a alienação parental, como ela é judicialmente apurada e quais são as possíveis penalidades ao alienador, como é tratado o pai ou mãe que inicia a campanha de difamação contra o outro pai da criança ou adolescente.

A lei, que possui originalmente apenas 11 artigos, sendo desses dois vetados e outros dois sem disposição ou impacto legal, aparenta ter pouco impacto sobre o direito da família, mas apresenta uma importante evolução sobre a discussão de um tema que sempre existiu, mas não era devidamente avaliado pela Justiça até então.

Ações que caracterizam alienação parental

Como foi abordado anteriormente neste artigo, não há uma definição clara de ações que causam a alienação parental, uma vez que ela é um conjunto de ações, falas e atos que acabam por mudar a percepção da criança a respeito de um dos seus pais.

O artigo 2º da Lei da Alienação Parental a define da seguinte forma:

“Art. 2º. Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.”

Dessa forma, é possível analisar que não há somente uma forma ou um conjunto de situações que causam a alienação parental. Ela ocorre, de fato, a partir de uma série de fatores causados pelo indivíduo alienante, que começa a campanha contra um dos genitores.

Os incisos I a VII do parágrafo único do mesmo artigo apresentam alguns exemplos de ações que causam a alienação parental. São elas:

“Art. 2º. Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade; 

II – dificultar o exercício da autoridade parental; 

III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; 

IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; 

V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; 

VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; 

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.”

É importante destacar que, embora seja a situação mais comum, a alienação parental não se dá somente pela difamação ou pelo discurso desqualificatório da parte alienadora à parte alienada, mas também pelas ações que visam o afastamento da criança de seu pai ou mãe.

Dessa forma, a legislação específica aborda situações como a transferência da criança de uma escola para outra, a mudança de endereço ou até as atualizações sobre a condição de saúde do filho sem o consentimento e prévia discussão dos pais.

Dentro dos poucos exemplos dados pela lei nº 12.318/2010, é possível analisar que há uma miríade de atos e ações que uma pessoa pode tomar com o objetivo de alienar uma criança ou adolescente de um de seus pais.

É importante destacar que, embora a maior parte das situações de alienação parental ocorra entre os pais da criança, seja com o objetivo de afastar o genitor do filho ou não, a legislação prevê também a possibilidade de enquadramento de alienação parental por terceiros, como aponta o parágrafo único do artigo 2º.

Punições previstas

A Lei da Alienação Parental também aponta possíveis punições, dentro do Direito da Família, para o genitor alienador, ou seja, aquele que faz campanha ou instiga terceiros a difamar o pai ou mãe para o filho, possibilitando que a criança tenha uma percepção irreal do pai ou mãe alienado.

As punições para o genitor alienador estão previstas no artigo 6º da lei nº 12.318/2010, regradas da seguinte forma:

“Art. 6º. Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: 

I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; 

II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; 

III – estipular multa ao alienador; 

IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; 

V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; 

VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; 

VII – declarar a suspensão da autoridade parental. 

Parágrafo único.  Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.”

É importante destacar que as punições podem ir de uma mera advertência até a suspensão da autoridade parental, fazendo com que o pai ou mãe percam a custódia da criança, os direitos de visita-la e as demais prerrogativas dadas aos pais da criança ou adolescente.

O artigo 6º da Lei de Alienação Parental também aponta que as penalidades que ocorrem através da comprovação de ações ou atos que buscam afastar a criança ou adolescente dos seus genitores não impedem as demais representações e responsabilidades civis que vêm com os atos.

Como se comprova judicialmente a alienação parental?

Dentro de um processo judicial, a comprovação de indícios e ações que visam a alienação parental podem ser obtidas através da documentação de e-mails, mensagens trocadas por aplicativos de smartphone, publicações em redes sociais, depoimentos de testemunhas, cartas e outros tipos de documentos.

O testemunho da criança ou do adolescente que se encontra no meio dessa disputa entre os pais também pode ser ouvida pelo juízo responsável pela lide, levando em consideração a necessidade de cumprimento do artigo 699 do Código de Processo Civil de 2015 (Novo CPC).

“Art. 699. Quando o processo envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou a alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá estar acompanhado por especialista.”

A Lei de Alienação Parental também possui, em seu artigo 5º, como deve ser a ação do Poder Judiciário quando uma das partes de um litígio apresenta ações ou atos que indicam tentativa de alienação parental, tanto numa ação autônoma quanto de forma incidental.

“Art. 5º. Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial. 

§1º. O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor. 

§2º. A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.  

§3º. O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.”

A lei específica também trata de como o julgador deve agir ao ver indícios de alienação parental dentro do processo no artigo 4º da mesma lei:

“Art. 4º. Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso. 

Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.”

Afinal, alienação parental é crime?

Embora a lei nº 12.318/2010 não tenha aplicado tipificação penal às ações e atos que apresentam a alienação parental, cometer atos que tenham como objetivo manipular a criança ou adolescente para se voltar contra ou alienar um pai ou mãe é crime, tipificado na lei nº 13.431/2017.

A lei em questão estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, alterando alguns pontos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

No artigo 4º, inciso II, alínea B da lei 13.431/2017, está tipificada a alienação parental como violência psicológica contra a criança e o adolescente, imputando em crime:

“Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipificação das condutas criminosas, são formas de violência:

II – violência psicológica:

b) o ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este.”

Além das punições estabelecidas pelo ECA a respeito do agressor (no caso deste artigo, o indivíduo alienador), como o afastamento da pessoa do convívio familiar, a perda da guarda ou do direito de visita, a pessoa pode ser penalmente responsável pelos atos.

A lei nº 13.431/2017 define que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada de forma subsidiária em casos de violência psicológica à criança ou ao adolescente, implicando em pena de três meses a dois anos de encarceramento.

A pena não imputa na não aplicação de outras sanções, como as apresentadas no artigo 6º da Lei de Alienação Parental.

O que é a auto alienação parental?

A auto alienação parental também é possível, embora não seja muito discutida dentro do âmbito jurídico.

De acordo com a psicóloga forense Beatriz Marinho, a auto alienação parental ocorre quando um dos genitores da criança ou do adolescente propositalmente se afasta de seu filho, não mais participando da sua vida e de suas responsabilidades enquanto pai da criança.

Dessa forma, ocorre uma situação onde o pai ou a mãe some da vida e do desenvolvimento do seu próprio filho, sem procurar seus direitos, sem querer participar da guarda, sem querer ver a criança com frequência, entre outras responsabilidades.

De acordo com a psicóloga, as duas situações mais comuns de auto alienação parental ocorrem no abandono afetivo do filho pelo pai, que não procura participar do crescimento do filho; ou pela participação da vida da criança com violência ou coação, fazendo com que o próprio filho não tenha mais vontade de ficar próximo do pai ou mãe.

Essas situações, quando provadas, podem configurar auto alienação parental, possibilitando, dentro da Justiça, a aplicação das mesmas regras, normas e punições estabelecidas pelas leis específicas e pelo ECA. 

A alienação parental só ocorre entre os pais?

Embora a situação mais corriqueira quando o assunto seja a alienação parental seja o jogo psicológico feito entre os pais com o filho, justificando a linguagem usada durante todo este artigo, a alienação parental não ocorre apenas nessas situações.

Em primeiro lugar, qualquer indivíduo pode realizar as ações que tem como objetivo difamar e alienar algum dos genitores, como aponta a Lei de Alienação Parental.

Em segundo lugar, a lei pode ser aplicada em outras situações que não envolvam diretamente os pais da criança e o adolescente, como em situações onde o jovem é criado por outros parentes ou pessoas.

Dessa forma, a lei não se aplica apenas aos pais e mães da criança, mas às pessoas responsáveis pela sua guarda e criação.

Perguntas frequentes sobre alienação parental

O que é considerado alienação parental?

A alienação parental é um termo utilizado para descrever ações que fazem com que a criança se afaste de um de seus pais por conta da carga negativa colocada naquele parente por um terceiro, que o difama na frente da criança com o objetivo de afastá-la da pessoa.

Quais são as condutas que podem caracterizar a alienação parental?

De acordo com o artigo 2º da Lei de Alienação Parental, são consideradas condutas que implicam em alienação parental:
I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II – dificultar o exercício da autoridade parental;
III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós.

Qual a pena para quem comete o crime de alienação parental?

De acordo com o artigo 6º da Lei de Alienação Parental, as sanções para quem comete alienação parental são:
advertência pelo juiz;
ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
multa;
determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
declarar a suspensão da autoridade parental.

Conclusão

Embora a legislação específica sobre o assunto tenha apenas dez anos, a alienação parental e as práticas que a definem são muito mais antigas, ocorrendo em famílias em colapso em todos os lugares do mundo.

Dessa forma, a legislação brasileira sobre o assunto se apresenta como um exemplo para países do mundo inteiro, tipificando situações onde a manipulação dos pais ou responsáveis pela criança ou adolescente resultam no alienamento de um deles da vida do filho.

Compreender sobre a alienação parental e sobre seus desdobramentos legais é de extrema importância para o advogado que deseja lidar com questões do Direito da Família, para representar seus clientes da forma mais profissional possível.

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