Não é novidade para ninguém que processos podem envolver uma quantidade enorme de pessoas, bens e documentos de diversos locais de um país. Nessas situações dentro de uma disputa judicial, o termo carta precatória aparece.
Mas, afinal, o que é uma carta precatória? Qual é a sua função dentro do sistema judiciário e por que ela é tão importante para que os processos possam ter continuidade? E o que mudou a partir do CPC/15? Confira as respostas para essas e outras perguntas neste artigo. Boa leitura!
A carta precatória é o istrumento que cria uma ponte entre juízes de diferentes jurisdições, com a finalidade de que um deles solicite ao outro que tome uma ação necessária ao andamento processual. É, portanto, uma forma de comunicação entre juízos de distintos Estados ou Comarcas.
As autoridades jurídicas possuem limitações de atuação geográficas ou administrativas. Um juiz da Comarca de Florianópolis, por exemplo, não possui o poder de intimar ou de determinar certos atos na Comarca de São Paulo.
Já que os processos judiciais podem envolvem diferentes jurisdições dentro do território nacional, é importante que exista uma ferramenta que possibilite que os juízes de diferentes localidades possam solicitar que certas ações sejam tomadas fora do alcance do seu poder, para que o processo possa continuar.
Dessa forma, a carta precatória é a ferramenta utilizada para que os juízes, em relação horizontal, de cooperação, possam citar pessoas, apreender bens, tomar depoimentos de testemunhas, adquirir provas e realizar outras ações fora do alcance dos seus poderes, pedindo para que outro juiz as realize no lugar.
No Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15), a regras para a carta precatória estão dispostas na sessão II (da verificação dos prazos e das penalidades), no capítulo III (das cartas), do artigo 260 ao artigo 268.
O artigo 260 do Novo CPC define quais são os elementos requisitados em uma carta precatória, para que a mesma tenha eficácia e possa ser realizada pelo juiz deprecado.
“Art. 260. São requisitos das cartas de ordem, precatória e rogatória:
I – a indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato;
II – o inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato conferido ao advogado;
III – a menção do ato processual que lhe constitui o objeto;
IV – o encerramento com a assinatura do juiz”.
Veremos cada um desses requisitos individualmente abaixo.
A carta precatória requer que tanto o juiz deprecante quando o deprecado tenham suas informações atribuídas, indicando o nome do juiz, a vara e a comarca em que atua.
Além disso, deve-se colocar dados a respeito das sedes em questão, como a cidade onde se encontra e o endereço.
Deve-se explicar, para o juiz deprecado, toda a situação para que o mesmo compreenda a necessidade da realização de determinada ação por meio de carta precatória.
Nessa parte, o juiz deprecante deve explicar para o juiz deprecado o que deve ser realizado (coleta de testemunho, apreensão de bem…), os dados da pessoa que será intimada, além de fixar o prazo de cumprimento da ação requerida.
Além de indicar a pessoa que será intimada, o que deve ser feito, os prazos que as ações devem ser realizadas e a necessidade do pedido, deve-se também mencionar o ato processual que solicita o ato pedido na carta precatória.
A assinatura do juiz é obrigatória para dar validade à carta precatória. Já que ela é enviada, preferencialmente, por meio eletrônico, a assinatura eletrônica precisa estar conforme a lei requer.
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A carta precatória é utilizada por juízes para que os mesmos possam, por meio da colaboração entre magistrados de diferentes jurisdições, dar continuidade às medidas e decisões judiciais que tomam dentro de um processo.
Dessa forma, a carta precatória deve ser utilizada toda a vez que uma decisão judicial dever ocorrer dentro de um processo em um local onde o juiz responsável pelo mesmo não tenha jurisdição.
Para exemplificar a situação, considere o seguinte: em uma disputa judicial entre duas partes que moram em Joinville (SC), uma das partes pede que uma testemunha seja ouvida.
Entretanto, essa testemunha mora em Porto Seguro (BA). O juiz da Comarca de Joinville, então, não tem poder para intimar a testemunha para depor, pois a pessoa vive fora de sua jurisdição geográfica.
Para contornar esse problema e dar continuidade ao processo, o juiz da Comarca de Joinville emite uma carta precatória endereçada ao juiz da Comarca de Porto Seguro para que o mesmo intime a testemunha e colete o seu depoimento, com o objetivo de contribuir para o processo que está acontecendo em Joinville.
Dessa forma, pode-se afirmar que a carta precatória tem como objetivo fazer com que o trabalho de juízes seja mais dinâmico e responsivo, uma vez que o instrumento permite que os magistrados complementem o trabalho uns dos outros, quando a limitação de jurisdição ocorre no meio de um processo.
A carta precatória não possui um prazo de cumprimento específico, pois quem definirá o prazo que o juiz deprecado terá para cumprir a execução da ordem definida será o juiz deprecante.
Entretanto, o artigo 261 do Novo CPC pede para que o juiz que emite o instrumento estipule um prazo baseado na natureza da diligência. O artigo 222 do Código de Processo Penal (CPP) pede um “prazo razoável” para o atendimento da mesma.
O prazo para cumprimento da carta precatória, então, é definido exclusivamente pelo juiz que a emite, levando em consideração o trabalho do cotidiano do juiz que a recebe e, ao mesmo tempo, a complexidade do pedido realizado para estipular até quando a determinação deve ser cumprida.
O artigo 267 do Novo CPC define situações onde o juiz deprecado pode recusar o cumprimento da carta precatória, devolvendo-a ao juiz que a emitiu. Essas situações são definidas da seguinte forma:
“Art. 267. O juiz recusará cumprimento a carta precatória ou arbitral, devolvendo-a com decisão motivada quando:
I – a carta não estiver revestida dos requisitos legais;
II – faltar ao juiz competência em razão da matéria ou da hierarquia;
III – o juiz tiver dúvida acerca de sua autenticidade”.
O parágrafo único do artigo 267 permite que o juiz deprecado, caso não possa atender ao pedido por erro de matéria ou de hierarquia de juízo, poderá redirecionar a carta precatória ao juiz ou tribunal competente, evitando, assim, o desperdício de tempo.
O Novo CPC trouxe três principais mudanças para como a carta precatória funciona dentro do direito processual civil brasileiro.
Em primeiro lugar, a preferência pelo envio da carta por meio eletrônico foi disposta no artigo 263 do Novo CPC, dinamizando o processo e facilitando a padronização da comunicação entre juízes de diferentes localidades.
O princípio da cooperação das partes dentro de um processo também ficou mais evidente na escrita atual do Código de Processo Civil.
Os parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 261 do Novo CPC definem que todas as partes devem ser comunicadas sobre as movimentações da carta precatória, além de auxiliar no cumprimento das demandas, na medida do possível.
“Art. 261. § 1º As partes deverão ser intimadas pelo juiz do ato de expedição da carta”.
“§ 2º Expedida a carta, as partes acompanharão o cumprimento da diligência perante o juízo destinatário, ao qual compete a prática dos atos de comunicação”.
“§ 3º A parte a quem interessar o cumprimento da diligência cooperará para que o prazo a que se refere o caput seja cumprido”.
E a última mudança, já comentada neste artigo, é a da possibilidade do juiz deprecado enviar a carta para o juiz ou tribunal competente caso ele não seja o magistrado designado a lidar com o cumprimento das ações pedidas, tanto por ordem de matéria quanto por ordem de hierarquia.
Os artigos que tratam dos regramentos da carta precatória no Novo CPC deram um passo importante na efetivação do princípio de cooperação das partes e na melhoria tecnológica das relações jurídicas dentro do Poder Judiciário.
Com a sobrecarga do sistema judiciário em todo o país, não é surpresa para ninguém que existe a possibilidade de demora no cumprimento de uma carta precatória.
A partir disso, existe jurisprudência sobre diversos casos de juízes deprecados que demoram para cumprir o pedido do juiz deprecante que envia uma carta precatória.
Em via de regra, a jurisprudência aponta para a responsabilização do juiz ou tribunal que demora para acatar ao pedido, não prejudicando a parte interessada e nem extinguindo o processo.
O juiz pode ser notificado para resolver o problema em um curto prazo, caso demore mais do que o tempo previsto pelo juiz que emitiu a carta.
Além disso, a parte interessada na execução da ação requerida através do instrumento pode entrar com recursos para acelerar o processo e cobrar mais agilidade dos magistrados, ou com apelação para quando o processo é extinto por ausência da ação pedida pela carta precatória.
Embora a carta precatória seja geralmente associada a processos no âmbito cível, essa não é a única aplicação do instrumento. Vejamos duas áreas em que ela pode ser utilizada.
Como vimos, a carta precatória cível está regulamentada entre os artigos 260 e 268 do Novo Código de Processo Civil. Entre os dispositivos, então, estão expostos os requisitos das cartas precatórias, seu modo e forma de cumprimento.
Diferentemente do CPC/1973, o Novo CPC trouxe como novidade a preferência da expedição de cartas precatórias por meio eletrônico.
Quando necessita de algum cumprimento de diligência, na área criminal é a mesma coisa. Far-se-á uso da carta precatória criminal, como, por exemplo: citação do réu, oitiva de testemunha e realização de exame pericial, por exemplo.
No entanto, as cartas precatórias criminais não possuem um regramento específico. Assim, baseia-se nas condições do CPC, com adequações para as especificidades da área criminal.
Quanto ao prazo na Direito Penal, o art. 222, caput, do CPP menciona que o prazo a ser dado é o prazo razoável:
Art. 222. A testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se, para esse fim, carta precatória, com prazo razoável, intimadas as partes.
Dessa forma, fica a critério do juízo deprecante estabelecer esse prazo, desde que razoável para cumprimento.
Ainda no que diz respeito à carta precatória criminal o juiz tem a liberdade de dar andamento ao processo ou até mesmo proferir a decisão caso haja mora no cumprimento do disposto no instrumento no prazo estabelecido. Isso porque ele está agindo em prol da celeridade processual, sem ferir nenhum princípio legal.
A carta precatória, embora aparentemente tenha uma função bem direta, cria dúvidas em profissionais do direito e leigos acerca do seu uso e das suas particularidades.
Responderemos abaixo algumas das dúvidas mais comuns sobre esse instrumento e alguns temas relacionados.
Não existe nenhuma relação entre a carta precatória e o precatório, ambos termos comuns no meio jurídico. Embora sejam parecidos na escrita, não tem nenhuma similaridade na aplicação.
A carta precatória, como pudemos ver, é uma ferramenta utilizada entre juízes para que ações judiciais possam ser tomadas fora da jurisdição aonde o processo judicial específico se encontra.
O precatório, por sua vez, é a formalização do requerimento, realizado pelo Poder Judiciário, de pagamento a um credor quando o devedor é a Fazenda Pública, ao ser condenada a pagar um valor específico.
A diferença entre a citação por carta precatória e por mandado é justamente o que faz a carta precatória existir: a diferença de jurisdição.
Quando o réu de uma disputa judicial está localizado na mesma jurisdição do juiz, ou seja, se a pessoa mora na mesma cidade ou localidade onde se encontra o foro onde o processo se encontra, o mesmo será citado através de um mandado expedido pelo juiz.
Quando o réu se encontra em outra jurisdição, essa citação será feita por meio de carta precatória, pois o juiz da comarca onde o processo se encontra não tem poder em outro local para realizar a citação.
Caso uma das partes de um processo tenha interesse em ouvir uma testemunha que se encontra em localidade fora da jurisdição do juiz que é responsável pelo processo, pode-se realizar a oitiva por meio de carta precatória.
Assim, ela é expelida junto com uma petição simples com as perguntas da parte. As outras partes do processo também podem redigir perguntas em petições, se acharem necessário.
Logo, o juiz da jurisdição e da matéria concordante ouvirá a testemunha e fará as perguntas enviadas pelas partes. Por conta da distância, as partes não são obrigadas a estarem no local para o depoimento, embora não seja incomum que advogados escalem representantes para irem ao local.
As perguntas são feitas, o testemunho é gravado e a ata é assinada (caso o processo não seja eletrônico).
Por ser um instrumento importante para que juízes consigam dar continuidade aos processos quando é necessário realizar ações fora da jurisdição, praticamente todos os ramos do direito possuem a carta precatória.
Entretanto, quando não se tem lei específica que reja as suas regras, vale o que os artigos do Novo CPC falam sobre o assunto.
O Código de Processo Penal, por exemplo, possui algumas diretrizes para a utilização do instrumento, mas a sua implementação é complementada pelo que diz o Novo CPC.
Como podemos compreender com esse artigo, a carta precatória tem como objetivo fazer com que um juiz de uma jurisdição específica consiga pedir para que outro juiz, de outra jurisdição dentro do território nacional, cumpra alguns pedidos para que o processo judicial possa continuar.
A carta rogatória, por sua vez, tem o mesmo objetivo, porém apresenta um alcance diferente: enquanto a carta precatória faz a ponte entre dois juízes de locais distintos do Brasil, a rogatória faz a ponte entre juízes de países diferentes.
Usa-se a carta rogatória, portanto, para que um juiz peça para outro juiz de um país diferente que realize certa ação por causa de um processo específico.
A carta precatória é um instrumento jurídico que tem como objetivo criar uma ponte entre juízes de diferentes jurisdições, com a finalidade de que um deles solicite ao outro que tome uma ação necessária, que está fora da jurisdição do requerente, para o andamento de um processo.
– A indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato;
– O inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato conferido ao advogado;
– A menção do ato processual que lhe constitui o objeto;
– O encerramento com a assinatura do juiz.
A carta precatória serve para encaminhar uma comunicação de um juízo para outro, a fim de que se possam citar pessoas, apreender bens, tomar depoimentos de testemunhas, adquirir provas e realizar outras ações fora do alcance dos seus poderes, pedindo para que outro juiz as realize no lugar.
A citação por carta precatória será realizada quando o réu não se encontrar na mesma jurisdição que está correndo o processo judicial.
A carta precatória é um importante instrumento para a dinamização do Poder Judiciário, para a limitação de poder dos magistrados e para a cooperação entre magistrados e partes de um processo judicial.
Sem esse instrumento seria impossível que a marcha processual continuasse em disputas que envolvem bens, documentos e pessoas de diferentes localidades do país, fazendo com que as citações e intimações demorassem muito tempo.
O Novo CPC e os avanços tecnológicos permitiram que as cartas precatórias pudessem ser realizadas por meios eletrônicos de forma confiável e dinâmica, facilitando os processos e acelerando os trâmites relacionados.
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Bom dia Srs.
Tenho uma dúvida , por favor, se puder me esclarecer.
A Carta pode ser feita em outra codade do mesmo Estado ?
Uma Carta precatória - citação - pode ser feita para citar duas partes no mesmo endereço ou tenho que fazer duas Cartas Precatórias ?
Obrigado por sua atenção.
Bom Dia, moro no exterior e gostaria de saber se terceiros podem receber carta precatoria em meu lugar, sem eu autorizar? Obrigado por sua atenção!
Excelente matéria, só que não tratou das cartas precatórias interinastes