No ano-base de 2021, a produção, beneficiamento e comercialização de minérios no Brasil movimentou mais de 309 bilhões de reais. Uma atividade tão significativa economicamente certamente conta com uma série de regulações, a maioria delas contida no Código de Mineração ou Código de Minas (Decreto-lei 227/67).
Mas esse código não é o único dispositivo legal a tratar sobre o tema no país. Nas últimas décadas, entraram em vigor novas leis, que alteraram substancialmente o texto original. Destaque para o Decreto-lei 10.965, de fevereiro de 2022, que provocou algumas das principais alterações – e chegou a ficar conhecido como “novo código de mineração”.
Neste artigo, você conhecerá os principais pontos do Código de Mineração (Decreto-Lei 227/67). Mas, também ficará por dentro de outras legislações que impactam na área. E, sobretudo, terá a chance de entender as maiores novidades trazidas pelo recente Decreto-lei 10.965/22. Vamos lá?
O Decreto-lei 227/1997, também chamado de Código de Minas, ou Código de Mineração, é a principal legislação vigente no país acerca da extração de recursos minerais. O dispositivo, aprovado ainda durante o regime militar no Brasil veio para substituir um texto legal ainda mais antigo – o Decreto-lei 1985 de 1940.
Entretanto, efetivamente, o que está abarcado no Código de Mineração? Como determina o Art. 3º do Decreto-lei 227/67:
Art 3º Este Código regula:
I – os direitos sobre as massas indivídualizadas de substâncias minerais ou fósseis, encontradas na superfície ou no interior da terra formando os recursos minerais do País;
II – o regime de seu aproveitamento, e
III – a fiscalização pelo Governo Federal, da pesquisa, da lavra e de outros aspectos da industria mineral.
Assim, entre outros pontos, o Código de Minas determina:
Importa, ainda, destacar que inúmeras determinações previstas no texto original do Código e Mineração (Decreto-Lei 227/67) foram substancialmente alteradas ou suprimidas, com a aprovação de outras legislações sobre o tema. É o que veremos na próxima seção!
Vejamos, abaixo, algumas das muitas leis que acabaram por alterar – acrescentando ou suprimindo trechos – o Código de Mineração.
A Lei 6.567/1978 foi uma das primeiras legislações a realizar alterações no Código de Mineração (Decreto-lei 227/67). Assim, uma das principais adições promovidas foi a determinação de regras específicas para o licenciamento de área de exploração e aproveitamento mineral.
Algumas regras estabelecidas nesse dispositivo legal seguem vigentes, especialmente algumas relacionadas ao licenciamento de atividades de mineração.
O Decreto 97.632 conta com apenas cinco artigos, mas segue em vigência até os dias atuais. Em suma, ele dispõe sobre o plano de recuperação de área degradada por atividade de mineração. Basicamente, o texto legal estabelece que esse plano deverá ser apresentado conjuntamente com o Estudo de Impacto Ambiental (EIA e com o Relatório do Impacto Ambiental (RIMA)
Para além, no curto texto legal, encontram-se discriminados os conceitos de “degradação ambiental” e de “recuperação”. In verbis:
Art. 2° Para efeito deste Decreto são considerados como degradação os processos resultantes dos danos ao meio ambiente, pelos quais se perdem ou se reduzem algumas de suas propriedades, tais como, a qualidade ou capacidade produtiva dos recursos ambientais.
Art. 3° A recuperação deverá ter por objetivo o retorno do sítio degradado a uma forma de utilização, de acordo com um plano preestabelecido para o uso do solo, visando a obtenção de uma estabilidade do meio ambiente.
O principal mérito da Lei 9.314/96 certamente é a definição de competências do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) – órgão que foi, durante muitos anos, o principal regulador do setor. Como veremos nas próximas seções, em legislações aprovados posteriormente, o departamento foi substituído por uma autarquia.
Outra importante contribuição da Lei 9.314/96 está no fato de que ela também estabeleceu claramente os regimes de aproveitamento das substâncias minerais (regime de concessão, permissão de lavra garimpeira, licenciamento, entre outros). Esses regimes seriam aprimorados em textos legais posteriores.
A Lei 13.575 de 2017 cumpre um importante papel, ao extinguir o Departamento Nacional de Produção Mineral (DPNM). Em seu lugar, a mesma lei instituí a criação da Agência Nacional de Mineração (ANM). Trata-se de uma instituição em regime autárquico especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia (Art. 1º_.
A ANM assumiu as funções e responsabilidades que até então eram do DPNM, conforme fica explícito no art. 2º. As competências do órgão são muitas e vão desde expedir certidões, alvarás e títulos minerários, até regulamentar a aplicação de recursos de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação no setor.
Por fim, a Lei 13.575/17 também se dedica a estabelecer a estrutura diretiva, de cargos, as fontes de receita e a governança da Agência Nacional de Mineração.
A Lei 14.066/20 ficou conhecida por instituir a Política Nacional de Segurança das Barragens (PNSB) – e veio na esteira do “Desastre de Mariana”, como ficou conhecido o rompimento de uma barragem de rejeitos no munício de Mariana, Minas Gerais.
No que diz respeito ao Código de Mineração (Decreto-Lei 227/67), o novo dispositivo legal altera o Art. 39 do Código, passando a exigir que as operadoras incluam no plano de aproveitamento mineral de jazidas, um projeto ou anteprojeto referente à:
Art. 39, II:
h) à construção de barragem de rejeitos, quando houver, ou de aumento na sua altura, vedada a utilização da técnica de alteamento a montante.
Parágrafo único. Caso previstas a construção e a operação de barragens de rejeitos, o plano de aproveitamento econômico deverá incluir o Plano de Ação de Emergência, em caráter conceitual, elaborado pelo empreendedor.
Outro acréscimo da Lei 14.066/20 diz respeito às responsabilidades ambientais e trabalhistas das empresas que trabalham no setor de aproveitamento mineral. É o caso, por exemplo, do Art. 6º-A, que traz a seguinte descrição de responsabilidades a quem realiza atividade de mineração:
Parágrafo único. O exercício da atividade de mineração inclui:
I – a responsabilidade do minerador pela prevenção, mitigação e compensação dos impactos ambientais decorrentes dessa atividade, contemplando aqueles relativos ao bem-estar das comunidades envolvidas e ao desenvolvimento sustentável no entorno da mina;
II – a preservação da saúde e da segurança dos trabalhadores;
III – a prevenção de desastres ambientais, incluindo a elaboração e a implantação do plano de contingência ou de documento correlato; e
IV – a recuperação ambiental das áreas impactadas.
Como você viu, embora o Código de Mineração seja a legislação mais importante do setor, seu texto legal foi complementado e alterado dezenas de vezes, desde 1967. Uma das alterações mais recentes – e mais significativas – se deu em 2022.
Estamos falando do Decreto-lei 10.965, que flexibiliza uma série de pontos trazidos no Código de Minas, e ainda dá conta de abarcar novas frentes, como os empreendimentos de mineração de pequeno porte.
Antes de adentrar no detalhamento das principais mudanças trazidas pelo Decreto-lei 10.965/22 – que já é conhecido como Novo Código de Mineração – é importante saber que esse dispositivo legal dividiu opiniões. Deu um lado, parte dos especialistas entende que o decreto cobre pontos não legislados e acaba por atender às diretrizes de leis como a Lei de Liberdade Econômica.
Por outra feita, ambientalistas e parcelas da sociedade civil acreditam que a lei é um retrocesso na preservação do meio-ambiente e pode representar riscos para municípios e estados onde a atividade mineradora é presença constante.
Com essas ressalvas em mente, vejamos algumas das principais mudanças trazidas pelo “novo código de mineração” (Decreto-lei 10965/22)
A nova legislação dá à Agência Nacional de Mineração (ANM) uma nova atribuição: a de instituir regras simplificadas para empreendimentos de pequeno porte. O texto do Decreto-lei 10.965/22 não deixa claro o que está abarcado no adjetivo “simplificado”, cabendo a ANM essa decisão. In verbis:
“Art. 4º . […]
Parágrafo único. A ANM estabelecerá critérios simplificados para análise de atos processuais e procedimentos de outorga, principalmente no caso de empreendimentos de pequeno porte ou de aproveitamento das substâncias minerais de que trata o art. 1º da Lei nº 6.567, de 1978.”
A Lei de Liberdade Econômica inovou ao indicar que, caso os órgãos reguladores excedam certo prazo para a liberação da atividade, esta será considerada autorizada, até determinação em contrário. O princípio foi manifestado no Decreto-lei 10.965/22. A priori, o prazo para licenciamento é de 60 dias. Superado esse período, o registro é dado como efetivado.
Essa determinação está explícita no art. 39 do Código de Mineração, que foi acrescido dos seguintes parágrafos, por meio do Decreto-lei 10.965 de 2022:
§ 1º A efetivação do registro de licenciamento pela ANM em área livre, desde que devidamente instruído em conformidade com os procedimentos e os requisitos estabelecidos em Resolução da ANM, será concluída no prazo de sessenta dias, contado da data de apresentação da licença ambiental competente.
§ 2º Encerrado o prazo de que trata o § 1º sem que a ANM tenha se manifestado, desde que cumpridos os requisitos de que trata o referido parágrafo, serão produzidos os efeitos da efetivação do registro.
§ 3º O disposto no § 2º não dispensará a efetivação do registro pela ANM e não impedirá que a ANM faça exigências para adequação ao plano de lavra em momento posterior.
O Decreto-lei 965/22 acaba por acrescentar algumas responsabilidades ao rol de obrigações do minerador. Entre elas, destaca-se aquelas relacionadas a preservação ambiental das áreas utilizadas para atividades de mineração. É o que se lê, por exemplo, no Art. 5º:
§ 2º O exercício da atividade de mineração implica a responsabilidade do minerador pela:
I – prevenção, mitigação e compensação dos impactos ambientais decorrentes dessa atividade, incluídos aqueles relativos ao bem-estar das comunidades envolvidas e ao desenvolvimento sustentável no entorno da mina;
II – preservação da saúde e da segurança dos trabalhadores;
III – prevenção de desastres ambientais, incluídas a elaboração e a implantação do plano de contingência ou de documento correlato, conforme resolução da ANM, que deverá ser integrado ao Plano de Contingência de Proteção e Defesa Civil do Município, quando houver; e
IV – recuperação ambiental das áreas impactadas.
§ 2º-A. A recuperação do ambiente degradado compreenderá, entre outras atividades, o fechamento da mina e o descomissionamento de todas as instalações, incluídas as barragens de rejeitos.
A Guia de Utilização (GU) é um documento fundamental para muitas empresas mineradoras, já que dá legalidade a extração mineral, ainda na fase de autorização de concessão da atividade. É, como o próprio nome sugere, uma autorização para utilização prévia e temporária de uma área.
O texto do Decreto-lei 10.965/22 tem o papel de reconhecer o uso das guias de utilização, ainda que em caráter excepcional, antes da outorga da concessão da lavra (art. 24).
O art. 52 do Decreto-lei 10.965 de 2022 promove alterações substanciais no que diz respeito à responsabilização por infrações minerárias. A lei elenca possibilidades de sanções, conforme segue:
Art. 52. Sem prejuízo do disposto na Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e na Lei nº 12.334, de 2010, o descumprimento das obrigações decorrentes das autorizações de pesquisa, das permissões de lavra garimpeira, das concessões de lavra e do licenciamento previsto em Lei implicará, a depender da infração, em:
[…]
II – multa;
III – caducidade do título;
IV – multa diária;
V – apreensão de minérios, bens e equipamentos; e
VI – suspensão temporária, total ou parcial, das atividades de mineração.
Para além, é importante destacar que as multas podem ser aplicadas de forma isolada ou comulativa, de acordo com os critérios estabelecidos pela ANM (Art. 52, § 5º). Da mesma forma, é o órgão quem vai determinar os requisitos e impactos da reincidência na infração (Art. 52, § 7º).
As multas são uma penalidade comum no setor minerário, e foram regulamentadas em detalhes pelo Decreto-Lei 10.965/22, conhecido como novo código minerário. Na prática, agora as multas podem variar entre R$ 2.000,00 e R$ 1.000.000.000,00, de acordo com a gravidade da infração.
Para além, tem-se a listagem de critérios para cálculo da multa total ou diária:
Art. 53 […]
§ 1º Serão considerados os seguintes critérios para estabelecer os valores da multa e da multa diária:
I – a natureza e a gravidade da infração;
II – os danos resultantes da infração;
III – a capacidade econômica do infrator;
IV – as circunstâncias agravantes e atenuantes;
V – os antecedentes do infrator; e
VI – a reincidência do infrator.
§ 2º O valor da multa diária, aplicada de forma isolada ou acumulada com a pena de multa, não poderá ultrapassar o valor total de R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais).
[…]
Embora a Agência Nacional de Mineração tenha sido criada em 2017, pela Lei 13.575/17, e já houvesse previsão legal quanto ao exercício da fiscalização por parte do órgão, o novo código minerário veio reforçar essa determinação. É o que se lê no art. 74 do Decreto-lei 10.965/22:
Art. 74. O exercício da fiscalização da atividade minerária observará os critérios de definição de prioridades e abrangerá a fiscalização das áreas tituladas por amostragem, de acordo com regulamentação da ANM.
Cabe destacar que a novidade está, sobretudo, na menção à fiscalização por amostragem – que não era mencionada no decreto de criação da Agência.
À luz das novas legislações, está claro que há muito trabalho para os advogados corporativos que atuam no setor de Energia e Minérios. O Decreto-Lei 10.965/22, embora promova alguma flexibilização no que tange ao licenciamento originalmente previsto no Código de Minas, também atribui novas responsabilidades às empresas de aproveitamento mineral.
Com isso em mente, entende-se que há pelo menos três pontos centrais, que merecem especial atenção dos departamentos corporativos. Vamos a eles?
A atividade mineradora é cercada de exigências legais para autorização e adequação das operações. Com as recentes alterações legais, novos documentos, como as Guias de Utilização, foram reconhecidos. E, novos prazos para emissão de certidões e licenças também ficaram firmados.
Assim, torna-se ainda mais importante ter controle sobre todos os documentos relacionados à autorização, licenciamento e concessão das áreas de mineração. E, com a definição de multas e penalidades, passa a ser ainda mais importante o controle dos prazos de validade e renovação dessa documentação.
A boa notícia é que já há no mercado tecnologias jurídicas capazes de automatizar grande parte dessas tarefas. É o caso, por exemplo, do Projuris Empresas, Plataforma de Inteligência Legal da Projuris, que conta com um módulo dedicado à gestão e controle de certidões, alvarás e licenças.
As recentes alterações legislativas tornaram claras uma série de sanções as quais as mineradoras estão expostas. Essas sanções, aplicadas pela via adminstrativa, por meio da Agência Nacional de Mineração, merecem especial atenção do jurídico corporativo.
Assim como os advogados desse setor estão organizados para lidar com processos judiciais, é preciso também criar e manter mecanismos de controle e acompanhamento dos processos administrativos.
O Decreto-Lei 10.965/22, em conjunto com outros textos anteriormente sancionados, aumenta a responsabilidade das empresas mineradoras, no que tange a preservação ambiental, bem como, de cuidado e restauração para com as áreas e populações afetadas pela atividade.
Nesse cenário, fica ainda mais evidente a necessidade de investir em programas de Environmental, Social and Governance, ou ESG. Fortalecer programas ambientais, sociais e de governança, além de colaborar na adequação legal do negócio, ainda pode ser um diferencial em outras áreas, como para a obtenção de investimentos, por exemplo.
O Código de Minas ou Código de Mineração vigente no Brasil é o Decreto-lei 227/1967. Ele substituiu o Decreto-lei 1.985 de 1940. Contudo, cabe lembrar, o atual Código de Mineração sofreu dezenas de acréscimos e revogações, tendo sido substancialmente alterado por meio da aprovação de novas leis.
De acordo com o art. 4º do Código de Mineração (Decreto-lei 227/67), uma mina é uma jazida em lavra, ainda que suspensa. Importa destacar que a jazida é entendida, pelo mesmo Código, como “massa individualizada de substância mineral ou fóssil, aflorando à superficie ou existente no interior da terra, e que tenha valor econômico”.
Como você viu, o Código de Minas (Decreto-lei 227/67) é um texto fundamental para qualquer advogado que atue no setor de Energia e Mineração. Contudo, é importante ter em mente que esse dispositivo foi largamente alterado nas últimas décadas – e segue sofrendo atualizações.
Por isso, o primeiro desafio do departamento jurídico é manter-se atualizado frente a todas as novas diretrizes legais. O segundo certamente é a implementação ou adaptação de práticas e processos internos que garantam a adequação legal. Felizmente, para o segundo caso, é possível contar com a ajuda da tecnologia.
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