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Dicas jurídicas para e-commerce: 5 pilares para manter em mente

Com a popularização das lojas virtuais, gestores jurídicos e advogados precisam estar atentos! Veridiana de Assis, gerente jurídica na Mondelez, compartilha algumas dicas jurídicas para e-commerces. Confira!

O cenário dos e-commerces no Brasil: digitalização acelerada

A pandemia da Covid-19, que exigiu o fechamento da maior parte dos comércios físicos em esfera nacional, fez com que muitas empresas precisassem repensar a forma como levam seus produtos ao cliente final (a estratégia de route to market). A solução lógica e imediata adotada pelas grandes empresas aqui no Brasil foi subir, o mais rápido possível, suas vendas para o mundo online, no formato conhecido como E-commerce. 

Isso fez com que da “noite para o dia” as áreas comerciais, que talvez estivessem lentamente buscando o comércio online, precisassem encontrar parceiros comerciais já bem estabelecidos ou impulsionar sua atividade em plataformas já operantes, mas com baixa captação, alcance e desenvolvimento da operação. 

Tudo foi “a toque de caixa” para garantir a disponibilidade de produtos no momento do fechamento do comércio, a seus consumidores. Mas e os contratos? E a governança? E as garantias e proteções jurídicas? Análises de parceiro? Precisa mesmo? 

Passado o susto inicial e com a operação começando a acontecer no mundo virtual, as áreas comerciais buscaram validar com seus departamentos jurídicos o novo formato híbrido da operação, já que uma pequena parte (ainda que representativa) da operação estava sendo realizada por meio de e-commerce.

As primeiras análises de riscos jurídicos começaram com questionamentos: quem são esses parceiros? O site é nosso? Quem opera a plataforma? Nós temos propriedade dos dados? Vendemos direto para o consumidor? Trata-se de parceria ou é uma simples venda para a empresa que opera online? De quem é o risco da operação?

Com todas as incertezas do (para alguns) novo mundo virtual, os advogados internos tiveram que se organizar para tratar com toda cautela necessária e, no entanto, garantir uma operação robusta sob a perspectiva jurídica. Tudo isso sem, contudo, trazer ruptura para as empresas que tanto dependiam dessa nova operação naquele momento. 

Na minha experiência de análise e regulação de ações adotadas pelas companhias, descobri que existem 5 pilares básicos e fundamentais para garantir a conformidade e manter a operação com segurança jurídica nesse formato, que compartilho para auxiliar outros profissionais que estejam passando por esse momento de adaptações com o ambiente digital.

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PILAR N. 1: Proteger os dados e garantir a segurança da informação

Existem dois tipos de dados hoje que a equipe jurídica precisa cuidar: os dados concorrencialmente sensíveis e os dados pessoais. Para o primeiro caso, é preciso analisar se o fornecedor ou parceiro é um concorrente e, caso positivo, identificar se a empresa contratada possui um mínimo de segregação de informações de concorrentes – a famosa Chinese Wall. 

Já no caso dos dados pessoais, o cuidado reside em avaliar se da relação jurídica decorrerá potencial coleta de dados de consumidor ou outra pessoa física. Se houver tratamento de dados pessoais, é preciso garantir em contrato que todos os procedimentos previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estão sendo seguidos pela contratada e assegurar que o fornecedor ou parceiro possui e segue as políticas e proteções previstas na LGPD.

É importante negociar, sempre que possível, que a empresa contratante tenha os direitos adequados para possuir – sempre que possível – e/ou acessar os dados das transações gerados ou coletados pelas plataformas, distribuidores ou outro terceiro contratado em toda a extensão permitida em lei.

PILAR N. 2: Contratos precisam estar alinhados com formato do e-commerce

Para garantir aderência às obrigações previstas em lei, mitigação de riscos e transparência na relação entre contratante e contratada, recomenda-se a elaboração de contrato com o objeto específico, de acordo com a relação adotada, seja ela por meio de um marketplace ou em plataforma própria.

O marketplace é um ambiente que reúne diversas marcas e lojas em um só site. Diversas empresas conhecidas participam desse mercado, tal como a Americanas, Shoptime, Mercado Livre e OLX.  Sob o ponto de vista comercial, existem dois cenários para o marketplace, sendo o primeiro aquele em que a venda é realizada diretamente pela empresa vendedora e o segundo aquele em que a venda é realizada por intermédio de terceiros.

  1. Venda direta: neste cenário é comum as plataformas utilizarem modelo de contrato próprio, com termos e condições. O modelo pode incluir objetos secundários como a contratação de mídia e análise de dados. Neste caso, destaco as questões de propriedade intelectual, mais detalhada no item 3. Recomendo avaliar se o fornecedor utilizará propriedade intelectual da companhia, como por exemplo marcas, conteúdo, imagens.
  2. Distribuidor: neste cenário, a distribuição dos produtos vendidos na plataforma é feita por terceiros. Para esta relação, em geral, o contrato assinado entre as partes é o contrato de distribuição padrão.

Os direitos sobre a propriedade da loja dentro do marketplace podem ser da empresa contratante, portanto vale avaliar se esse é um ponto negociável para incluir em contrato. Um ponto de especial atenção são as cláusulas que regulam a potencial manutenção do site em caso de rescisão da relação contratual.

Já o uso de plataforma própria acontece quando a empresa contrata um terceiro para criar e gerenciar um site. O escopo do acordo pode variar dependendo do modelo, mas, em geral, terá um componente de serviços para o site e/ou criação de conteúdo, manutenção (como a atualização do catálogo), marketing (como envio de e-mail marketing) e/ou disposições de dados. 

Neste caso, é importante garantir que:

  • (i) a empresa segue o processo de registro de domínio ao criar o site, seguindo orientações fiscais e de propriedade intelectual;
  • (ii) o site está em conformidade ou, se gerenciado por um terceiro, tal parte garante que cumpre os requisitos da lei, incluindo os termos da LGPD, entre outras;
  • (iii) o acordo tenha cláusula de propriedade intelectual para tratar do uso, pelo site, das marcas, ativos digitais e/ou propriedade de dados.

Por último, é importante certificar-se de que o terceiro está em conformidade com todas as leis aplicáveis, tem todas as licenças e autorizações aplicáveis, e o contrato tem provisões de indenização e seguro com cobertura adequada. 

Finalmente, recomendo uma avaliação a respeito dos potenciais conflitos entre as estratégias de negócios EB2B (comércio online entre pessoas jurídicas) e os distribuidores já estabelecidos. É importante avaliar os prós e contras dos modelos de negócios para mapear possíveis conflitos com os parceiros. Por exemplo, podem existir conflitos por obrigações contratuais já assumidas com outros clientes, questões de leis da concorrência ou potenciais ​​impactos financeiros para certos clientes.

PILAR N. 3: Proteger a propriedade intelectual

Para empresas cujas marcas são ativos relevantes, é necessário ter uma atenção especial às questões de propriedade intelectual. Recomenda-se mapear o uso e criação de Propriedade intelectual (PI) e estabelecer condições contratuais para:

  • (i) Proteger os direitos de PI utilizados ​​no cumprimento do contrato pela contratada (incluindo a concessão de licenças a terceiros provedores);
  • (ii) O uso, pela contratante, de direitos de PI de terceiros ou desenvolvidos no âmbito do contrato. O contrato deverá regular o uso correto de marcas registradas e disposições de uso de PI associadas.
  • (iii) Para sites de propriedade da contratante, garantir que a empresa contratada segue o processo adequado de registro de domínio ao criar o site.

Os contratos também devem conter disposições claras de que a aplicação dos ativos de PI é de responsabilidade da contratada, bem como a obrigação de notificação informando a contratante em caso de potenciais infrações. Adicionalmente, avaliar se a contratada utilizará PI tais como marcas, logos, imagens da contratante para incluir em contrato.

PILAR N. 4: Atenção ao Direito do Consumidor

Contratos com terceiros provedores e gerenciadores de plataformas e com clientes que usam uma plataforma de propriedade da contratante devem regular sobre questionamentos e reclamações do consumidor final e a resolução dessas reclamações. Tais terceiros e clientes devem ser capazes de lidar com as reclamações dos consumidores, em linha com os padrões da contratante. Todas as questões de cunho jurídico, reclamações de qualidade do produto e reclamações indicando que um cliente ou consumidor foi prejudicado devem ser tratadas e imediatamente informadas à contratante.

Da mesma forma, a contratante deve assegurar que o terceiro seja obrigado a fornecer assistência completa à contratante no caso de ser procurado por um consumidor ou cliente atendido por terceiros ou por um cliente. Para tanto, é importante garantir que o contrato traga obrigações para o terceiro ou o cliente resolver o problema, bem como assumir eventuais custos no caso de a reclamação resultar de uma quebra de contrato, como por exemplo em caso de não conformidade com o armazenamento do produto ou regras de qualidade.

PILAR N. 5: Cuide de garantir o Direito da Concorrência

Em geral, alguns terceiros que vendem no marketplace da contratante são seus clientes, e em alguns casos podem ser concorrentes em algum segmento de atuação de ambos. Portanto, todas as regras do direito da concorrência que se aplicam aos clientes ou concorrentes se aplicam igualmente a esse terceiro. 

Desta forma, o primeiro ponto relevante é lembrar aos times comerciais que a definição de preço de revenda é vedada em nosso ordenamento jurídico. Uma opção a essas áreas é ter o preço de revenda recomendado, sem qualquer imposição ou retaliação. 

Quando o cliente adere à plataforma de e-commerce, precisará fornecer alguns dados para a viabilização das vendas online, que podem ser confidenciais. Portanto é importante que o processo de recebimento de dados respeite todos os limites do direito da concorrência. Além disso, dados ou algoritmos não podem ser usados ​​para fins de fixação de preço ou definição de preço de revenda mínima preço, já que isso é ilegal.

Se a empresa contratante implementar quaisquer atividades promocionais no site ou se receber dados do fornecedor do marketplace, é importante considerar as leis de concorrência e de proteção de dados pessoais, antes de utilizar ou tratar esses dados.

Conclusões

Estes 5 pilares de atuação para mitigação de riscos e segurança jurídica na contratação de e-commerce são sugestões de ações iniciais para o advogado inhouse, considerando um cenário de vendas online bastante incipiente. 

Claro que, mesmo neste cenário, não esgotam e não aprofundam a matéria e sua aplicação dependerá do formato de vendas online adotado por cada companhia. De qualquer forma, fica a sugestão e a oferta para debates a respeito das melhores práticas na governança, sob a ótica jurídica, do e-commerce no mundo dos bens de consumo.

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*Conteúdo publicado originalmente no Blog da Justto por Veridiana de Assis e redirecionado para o Blog da Projuris após a aquisição da empresa.