Direito Civil

Embargos de Declaração: o efeito interruptivo do recurso

No dia a dia forense é cada vez mais corriqueira a oposição de embargos declaratórios com objetivo de revisão do entendimento do magistrado ou meramente protelatórios, sem observância das hipóteses legais. A prática é explicada pela facilidade e, supostamente, baixo risco envolvido. Afinal, os embargos de declaração independem de preparo, conforme art. 1.023 do Novo CPC, e não resultam em honorários sucumbenciais, além de interromperem o prazo recursal.

Contudo, precisamos analisar melhor o recurso e a incidência de seu efeito interruptivo.

Navegue por este conteúdo:

1. Hipóteses dos embargos de declaração

O art. 1.022 do Código de Processo Civil estabelece quais as hipóteses de cabimento de embargos de declaração. São elas, dessa maneira:

Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: 

I. esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; 
II. suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; 
III. corrigir erro material. 

Veja-se que são situações excepcionais, em que a decisão possui defeitos que não se confundem com o seu mérito, embora em alguns casos possam ter influência direta sobre ele. Isso porque, há casos em que a correção da decisão, reflexamente, altere o mérito da decisão, quando ocorre o chamado “efeito infringente”.

Para se aprofundar no conceito de embargos de declaração, confira a explicação da Professora Katja Fuxreiter:

2. Efeito interruptivo dos embargos de declaração

Pois bem, o objetivo deste texto não é discorrer sobre as hipóteses de cabimento dos embargos de declaração, até porque, já abordamos o tema neste artigo.

A análise aqui é especificamente sobre aplicação da interrupção da contagem do prazo recursal resultante da oposição dos embargos de declaração prevista no artigo 1.026 do CPC:

Art. 1.026. Os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso. 

Assim, caso a parte oponha embargos de declaração, o prazo para eventual recurso é interrompido, de modo que sua contagem é reiniciada após o julgamento dos embargos.

3. A essência dos embargos declaratórios como condicionante do efeito suspensivo

Como vimos acima a interrupção do prazo como efeito da oposição dos embargos de declaração é a regra geral. Entretanto, o problema surge quando os embargos declaratórios não são conhecidos, reflexamente afastando a interrupção do prazo.

A situação acontece em duas hipóteses, quando os embargos de declaração são:

  1. intempestivos;
  2. manifestamente incabíveis.

O primeiro caso é de fácil constatação e não gera muitas dúvidas, todavia, o segundo é mais complexo.

3. 1. Embargos manifestamente incabíveis

Conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, hipoteticamente, os embargos de declaração podem ser manejados contra qualquer decisão judicial. Por outro lado, seu escopo é sanar algum dos vícios elencados nos incisos do referido artigo, o que faz com que a leitura integral do dispositivo torne possível a oposição dos embargos contra qualquer decisão, desde que para sanar uma irregularidade prevista nos incisos I, II ou III do artigo 1.022.

Evidente que o simples julgamento desfavorável dos embargos de declaração não significa que ele é manifestamente incabível e deve ser desconhecido. Há um liame que divide a rejeição do desconhecimento, qual seja, que os fundamentos dos embargos declaratórios possam, ao menos em tese, resultar no seu acolhimento. Já no caso do recurso ser manifestamente incabível, as alegações nele contidas versam sobre questões que fogem das hipóteses legais de cabimento.

Portanto, percebe-se que o que importa para o conhecimento é a essência dos embargos de declaração, se ele reúne das características para tanto ou se é uma peça que utiliza simplesmente a nomenclatura (nomen juris) sem de fato ser.

3. 2. Interrupção depende do cabimento do recurso

Com isso, a oposição de embargos de declaração só resultará na interrupção do prazo para interposição do recurso inominado, caso o recurso seja cabível, enquadrando-se em tese nos casos previstos na legislação.

Entendimento diverso viabilizaria a oposição de peça com razões aleatórias sob a denominação de embargos de declaração apenas para interrupção de prazo recursal, prestigiando o litigante sucumbente sem nenhum respaldo legal. 

3. 3. Entendimento do STJ

Salienta-se que o entendimento exposto possui forte amparo jurisprudencial. A título exemplificativo, transcreve-se ementa de acórdão do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA INTEMPESTIVOS. ANTERIORES EMBARGOS DE DECLARAÇÃO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEIS E NÃO CONHECIDOS. INOCORRÊNCIA DE INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE OUTRO RECURSO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

I – “[…] O recurso manifestamente incabível ou intempestivo não suspende ou interrompe o prazo para interposição de outro recurso” (STF – ARE 1047515 ED-AgR, Relator Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 31/08/2018).

II – Não conhecidos os terceiros embargos de declaração apresentados, em razão de sua manifesta inadmissibilidade, inclusive com o reconhecimento de seu caráter protelatório, inocorre a interrupção do prazo para propositura do recurso seguinte, no caso, os embargos de divergência.

III – Agravo interno desprovido.

(STJ, Corte Especial, AgInt nos EAREsp 1161880/SP, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, julgado em 22/10/2019, publicado em 29/10/2019)

3. 4. Aplicação nos Juizados Especiais Cíveis

O mesmo posicionamento é aplicado também no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis com relação aos embargos de declaração da Lei 9.099/1995, previstos no seu art. 50, como se depreende do seguinte acórdão da Turma de Recursos da Capital do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

RECURSO INOMINADO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO CONHECIDOS – INAPLICABILIDADE DA SUSPENSÃO OU INTERRUPÇÃO DO PRAZO – INTERPOSIÇÃO DO RECURSO APÓS O PRAZO LEGAL – INTEMPESTIVIDADE RECURSAL EVIDENCIADA – RECURSO NÃO CONHECIDO.

Extrai-se dos autos a prolação de sentença condenatória em razão do reconhecimento da ilegalidade do cadastro denominado concentre scoring. Intimada, a recorrente interpôs embargos de declaração visando a suspensão do processo em razão da decisão prolatada no REsp. 1.419.697.

Assim, porque não visualizada qualquer das hipóteses cabíveis, não foram conhecidos os embargos de declaração e, por consequência, não se aplica o efeito suspensivo, porquanto inexistente o recurso (já que não conhecido). […]

Portanto, o recurso interposto pelo recorrente é extemporâneo, motivo pelo qual voto por não o conhecer.

(TJSC, Autos n. 0813698-74.2013.8.24.0023, Primeira Turma de Recursos da Capital, Relator Juiz Antonio Augusto Baggio e Ubaldo, j. em 25/05/2017, grifamos)

4. Abuso do direito e perda de prazo

Com isso, percebe-se que a não concessão de efeito interruptivo do prazo recursal aos embargos de declaração manifestamente incabíveis, além de ser uma decorrência lógica, é uma resposta jurisprudencial aos muitos casos de abuso do direito por litigantes que buscam tornar o processo mais moroso em seu benefício.

De outro turno, é importante que os advogados estejam atentos ao tema e oponham embargos de declaração, assim, apenas quando tiverem segurança do seu cabimento, sob pena de correrem o risco de perda do prazo recursal.

Consequentemente, se o recurso não foi conhecido e o prazo não foi interrompido, há de se reconhecer o trânsito em julgado da sentença, uma vez que o prazo recursal se escoou 10 dias após a publicação da sentença, isto é, em 3 de março de 2016.

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