A criação de minutas contratuais exige muito cuidado ao redigir, pois alguns erros de digitação podem mudar a interpretação do documento. E o que era para garantir segurança jurídica torna-se um problema para as partes.
Erros materiais em contratos podem ser simples e não mudarem o entendimento do texto e até não requererem correção. Contudo, erros de objetos, dígitos, escopo de entrega e outros podem ocasionar disputas judiciais graves e/ou a necessidade de distrato.
Por exemplo, imagine trocar o valor de pagamento que seria 10.000,00 por 100.000,00. Um simples erro significa uma dívida extra de 90.000,00 caso as partes não cheguem a um acordo e nem haja interferência judicial.
Neste artigo veremos o que caracteriza erro material em contrato, como corrigir e dicas para evitar novos erros na escrita de minutas. Boa leitura!
O que são erros materiais em contratos?
As informações incorretas escritas em contratos são chamadas de vícios, entre eles há o erro. Erro material é aquele originado na escrita do documento.
Erro por si só representa que a vontade das partes está em desacordo com o manifestado no contrato. O dissenso pode ser causado, mas não só por um erro material.
Por exemplo: a vaga discriminada em um contrato trabalhista ser diferente da acordada entre empregado e empregador. Neste caso, configura-se um erro de digitação, material, ou então um vicio de consentimento em que as partes não chegaram a um acordo e por má fé apenas a vontade do empregador foi suprida.
Via de regra os erros materiais são aqueles apenas de digitação, que não houve intenção de errar ao elaborar o documento.
Na correção ou notificação de rescisão contratual, a boa-fé e o que foi negociado entre as partes irá prevalecer em qualquer tipo de contrato.
Qual a diferença entre erro absoluto e erro relativo em contratos?
Para tomar a melhor decisão sobre o que fazer em caso de erro material, primeiro é preciso entender se este erro foi relativo ou absoluto. Essa categorização será determinante na tratativa dada ao caso.
Erro relativo é aquele que não há necessidade de anular o contrato, pois a troca da informação não compromete o entendimento do documento. E um aditivo será suficiente para corrigi-lo ou, se for de comum acordo das partes, nem será necessário uma vez que manter o erro não interfere na relação contratual.
Enquanto os erros absolutos inutilizam o documento. São os casos levados ao judiciário pois não houve acordo.
Correção de erro material em contrato
Após identificado o erro e comunicado aos demais envolvidos é hora da ação.
Fizemos um passo-a passo do procedimento mais comum para corrigir erro material em contrato
- Entrar em consenso sobre qual a informação correta;
As partes devem negociar entre si, para chegar a um acordo ou consenso sobre o dado correto que deve constar em contrato.
- Decidir se o contrato será anulado, rescindido ou mantido
No último caso, em se mantendo o contrato ativo, será necessário fazer um aditivo.
- Elaborar o termo aditivo
Erros de digitação são facilmente corrigidos com uma claúsula que indique o erro encontrado e por qual informação será substituído;
- Revisão do aditivo
Revisar cuidadosamente o aditivo é importante para evitar um novo erro material;
- Assinatura do aditivo contratual
As partes assinam o aditivo, para concretizar a correção do erro material.
Em caso de desacordo, qualquer uma das partes tem o direito de rescisão seguindo a clausula rescisória estabelecida anteriormente no documento. Pode-se, ainda, judicializar a causa contudo, em casos de erros contratuais a rescisão costuma ser suficiente.
Lembrando que, em caso de assinatura contratual, eventuais danos pelo erro incidem em responsabilidade contratual, prevista pelo art. 393, do Código Civil.
Jurisprudência em casos de erro material em contratos
Contratos firmados por escrito estão suscetíveis aos erros materiais e a vícios. A interpretação feita sobre as informações incorretas de um documento vai além do conteúdo exposto e olha para o acordo feito previamente.
Ainda, envolve tipos diferentes de vícios como: o dolo, coação , simulação e erro de delimitação do objeto, por exemplo.
Resolver um erro material demanda entender se origina-se de algum vicio, interpretar o erro e seguir os princípios do direito civil que regem a área contratual . Importante lembra de que o principio da boa fé sempre prevalece sobre outros. Em segundo lugar de importância fica a negociação prévia entre as partes.
Exemplos de Jurisprudência sobre erro material em contrato
Caso 1- Contrato de compra e venda
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE LIMITES DO CONTRATO E DE IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – ABRANGÊNCIA DO INSTRUMENTO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RECONVENÇÃO – ADEQUAÇÃO DO CONTEÚDO DO CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DO IMÓVEL AO QUE FOI EFETIVAMENTE NEGOCIADO PELAS PARTES CONTRATANTES – PRINCÍPIO DA BOA FÉ CONTRATUAL – PROVA PRODUZIDA EM AUDIÊNCIA FAVORÁVEL AOS APELANTES – ERRO MATERIAL CONTIDO NO INSTRUMENTO PARTICULAR DO CONTRATO – NECESSÁRIA INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DO IMÓVEL ALÉM DO SEU ASPECTO LITERAL – PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
1- Os contratos não podem ser interpretados, apenas, na sua literalidade, sendo necessário perquirir a vontade das partes, segundo os preceitos da boa-fé objetiva. Desde que devidamente comprovado, o erro material não macula a vontade dos contratantes, posto que o objeto do contrato é esclarecido mais pela indagação da vontade das partes do que pela constatação do que nele constou de forma expressa.2- Recurso de apelação a que se dá provimento parcial, para declarar que o objeto do contrato de promessa compra e venda subscrito é mais abrangente do que o que está explícito em suas cláusulas. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.22.126967-3/001, Relator(a): Des.(a) Narciso Alvarenga Monteiro de Castro (JD Convocado) , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/08/2022, publicação da súmula em 10/08/2022)
Comentário: Este caso apresenta um vício de consentimento com erro na delimitação do objeto. Para correção foi necessário adequar o contrato de compra e venda com o que de fato foi negociado entre as partes. A decisão toma em conta a vontade das partes para esclarecer o objeto, acima do que foi subscrito.
Caso 2- Contrato de honorários advocatícios
RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE DOLO E MANIFESTAÇÃO DE VONTADE VICIADA. PEDIDO DE ANULAÇÃO DO CONTRATO. IMPOSSIBILIDADE. VÍCIO DE CONSENTIMENTO NÃO CONFIGURADO. INEQUÍVOCA E EFICIENTE PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PROVEITO ECONÔMICO.
1. Não há falar em ofensa ao art. 535 do CPC/1973, se a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente.
2. A relação jurídica existente entre o advogado e o cliente é contratual, um acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer regulamentação de interesses, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.
3. O contrato de honorários é ajuste de natureza civil, em razão da matéria de que se constitui ou das pessoas que dele participam e consensual, o que indica que são concluídos validamente a partir da manifestação da vontade das partes, ou seja, do livre consentimento.
4. O dolo, enquanto vício do consentimento, consiste em manobras ou maquinações feitas com o propósito de obter uma declaração de vontade que não seria emitida se o declarante não fosse enganado. É o erro intencionalmente provocado, instigado pela intenção de enganar; pois o autor mune-se da vontade de induzir o outro ao erro, usando de artifícios não grosseiros ou perceptíveis prima facie.
5. Tendo havido inequívoca e efetiva prestação do serviço pela advogada/contratada e a respectiva adequação dos serviços ao contrato firmado entre as partes, sendo certo que foram determinantes para o alcance da pretensão, impossível ao cliente/contratante furtar-se ao cumprimento da obrigação correspondente, qual seja o pagamento do valor estipulado em comum acordo.
6. Não é dado ao contratante se valer da própria manobra para, em atitude de patente abuso de direito, alegar nulidade na avença, buscando furtar-se ao pagamento dos honorários pactuados validamente, ao argumento de que sua manifestação de vontade fora externada de maneira viciada, a partir de omissão dolosa da recorrente.
7. Viola a boa-fé objetiva, cuja função primordial é estabelecer, nas relações obrigacionais, um padrão ético de conduta para as partes, aquele que alega desconhecimento de evento para o qual concorreu diretamente e que fora decisivo para a sorte do processo.
8. Em se tratando de honorários advocatícios contratuais deve valer entre as partes o tanto quanto pactuado, porquanto assumida a obrigação de pagar os valores estipulados a quem atuou nos moldes acordados e contribuiu, de maneira decisiva, para a solução e sucesso da causa.
9. São válidos os honorários contratuais arbitrados com base no proveito econômico experimentado pelo contratante.
10. Agravo interno provido, para dar provimento parcial ao recurso especial. (AgInt no REsp n. 1.636.070/CE, relator Ministro Raul Araújo, relator para acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 26/9/2017, DJe de 23/11/2017.)
Comentário: O cliente alega a ineficiência da defesa prestada e que foi induzido ao erro, um vicio de dolo, e pede o cancelamento do contrato. Contudo, o caso não foi julgado dolo pois os serviços foram prestados e os honorários correspondentes deverão ser pagos. O tribunal entendeu, assim, que alegar erro era apenas uma manobra do cliente para evitar o pagamento dos serviços usufruídos.
É alegado erro material pelo cliente e, então, indeferido pelo judiciário, pois o serviço foi configurado.
Como evitar erros ao elaborar contratos
Ter a possibilidade de corrigir erros materiais nos contratos já assinados e ativos auxilia os departamentos jurídicos a manterem negócios feitos sem que haja prejuízos à empresa.
Entretanto, nem todo caso é passível de correção e mesmo quando o é, demanda tempo e energia que poderiam ser usados em atividades mais estratégicas.
Separamos algumas dicas que evitam erros contratuais:
1. Crie uma minuta padrão
O uso de modelos já prontos com clausulas padrões pré-elaboradas e revisadas pelo jurídico da empresa, evita a escrita incorreta da maior parte do texto. Uma vez que está pronto e não precisará ser editado.
2. Elabore uma clausula de rescisão em todos os contratos
A clausula rescisória é uma proteção para a empresa, inclusive nos casos de erro material, uma vez que rescindir o contrato pode ser a melhor opção.
3. Revise o acordo entre as partes:
Ao elaborar uma minuta seja do zero ou em cima do modelo padrão revise e detalhe a cláusula que contém a descrição do objeto e, se possível, acrescente um parágrafo detalhado de contra escopo (o que não faz parte do objeto, mas que pode causar dúvidas pela natureza dos serviços). Sempre priorizando o acordo feito para garantir que negociado e o contrato escrito sejam iguais.
4. Evite preenchimento manual de documentos
Com o uso de um Software próprio para gestão de contratos, é possível preencher os dados automaticamente nas minutas padrões. Ele impede erros humanos na digitação de nomes, números de documento, endereço e outros.
5. Use modelos em legal design para melhor visualização de dados
Como os contratos são documentos repletos de informações escritas e a revisão precisa de agilidade, é comum algumas informações erradas passam despercebidas. Com o legal design, a estrutura do contrato torna a leitura mais fácil e a detecção de erros mais precisa.
6. Tenha um processo rigoroso de revisão
Assinar contratos sem uma revisão feita por especialistas jurídicos pode significar retrabalho e até problemas futuros a depender da natureza do erro cometido. Sendo assim, preveja tempo para a revisão no fluxo de trabalho de contratos.
7. Crie um roteiro com checklist para a criação de contratos
Esta ação evita o esquecimento de algum passo importante na elaboração das minutas. Assim, desde a elaboração até a análise do contrato, você minimiza a possibilidade de erros e incorreções passarem despercebidas.
Dica extra!
Registre TODOS os erros cometidos! Pois é, apesar de estarmos falando sobre evitar erros, registrar os cometidos cria um ótimo banco de informações que a equipe pode acessar a fim de não repeti-los.
Servem, inclusive, para aperfeiçoar as minutas padrões e o processo de revisão, uma vez que além do erro em si pode-se observar em que etapa a revisão foi falha e se houve revisão.
Conclusão
Elaborar minutas padrões e garantir minucia na revisão dos contratos é muito mais simples do que lidar com a resolutiva de um erro material. Porém, erros de digitação em contratos não o invalidam por consequência, aditivos podem ser suficientes na maioria dos casos e quando não, o distrato tende a ser o caminho mais simples.
Para entender mais sobre elaboração e gestão de contratos, leia:
Perguntas Frequentes
Depende. Se o contrato for judicializado e o entendimento do tribunal for de que a informação incorreta impede o uso do documento ele pode ser anulado. Na maioria dos casos o que acontece é o pedido de rescisão pela parte que se sente prejudicada pelo erro material.
Para a correção de erros após o contrato ser assinado, o setor jurídico ou advogado responsável deve elaborar um aditivo que aponta o erro e qual a sua correção. O aditivo também deverá ser assinado e, então, passa a fazer parte do contrato.
Receba meus artigos jurídicos por email
Preencha seus dados abaixo e receba um resumo de meus artigos jurídicos 1 vez por mês em seu email