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Evasão fiscal: o que é, quando ocorre e como mitigar riscos

Dentre os crimes contra a ordem tributária, a evasão fiscal – também chamada de sonegação – é um dos mais comuns no Brasil. Algumas estimativas chegam a afirmar que o valor evadido no país equivaleria a 10% do PIB nacional

Mesmo assim, não se pode subestimar as consequências legais da evasão sobre a conformidade jurídica das empresas. A evasão fiscal pode resultar em sanções e multas para as organizações. 

Neste artigo, além de conhecer as penalidades previstas para a sonegação ou evasão, veremos alguns dos principais marcos jurídicos desse tema – e as discussões que persistem em torno deles. 

Ao final, você encontrará também uma listagem de práticas que podem ajudar os gestores jurídicos a reduzirem os riscos relacionados à evasão. Fique conosco, e boa leitura!

O que é evasão fiscal?

A evasão fiscal consiste na fuga da obrigação de pagar tributos devidos, por meio de fraude, omissão, ou até mesmo emissão e fornecimento de documentos ou informações falsas. Também chamada de sonegação fiscal, a evasão foi primeiro regulada pela Lei 4729/65 e, depois, pela Lei 8.137/90

De acordo com a Lei 4729/65, são cinco os tipos de conduta que constituem crime de evasão fiscal. Vejamos:

      I – prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei;

    II – inserir elementos inexatos ou omitir, rendimentos ou operações de qualquer natureza em documentos ou livros exigidos pelas leis fiscais, com a intenção de exonerar-se do pagamento de tributos devidos à Fazenda Pública;

    III – alterar faturas e quaisquer documentos relativos a operações mercantis com o propósito de fraudar a Fazenda Pública;

    IV – fornecer ou emitir documentos graciosos ou alterar despesas, majorando-as, com o objetivo de obter dedução de tributos devidos à Fazenda Pública, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis.

  V – Exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário da paga, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida do imposto sobre a renda como incentivo fiscal.    

Os comportamentos acima caracterizam evasão fiscal à medida que levam ao resultado de supressão ou redução da arrecadação tributária. Em última análise, a consequência principal da evasão é, portanto, o prejuízo ao erário público. 

Outra característica que ajuda a definir a evasão está no fato de que o não pagamento dos tributos não costuma ser fruto de mero desconhecimento, e sim ação proposital. A natureza do dolo na evasão fiscal, no entanto, é matéria ainda em discussão, como veremos na seção que trata especificamente da Lei 8.137/90. 

Exemplos de evasão fiscal

A letra da Lei 4729/65, como vimos na seção anterior, deixa bastante claro quais atitudes podem caracterizar o crime de evasão ou sonegação fiscal. Na prática, da mesma forma, os exemplos que materializam essas condutas são muitos. 

Dentre as práticas mais conhecidas está a não emissão ou alteração de notas fiscais. Ao deixar de emitir nota sobre a comercialização de um determinado produto ou serviço, a empresa se exime de pagar os tributos devidos. 

Da mesma forma, ao registrar na nota fiscal um valor inferior ou subestimado, mais uma vez, a empresa pode estar incorrendo em evasão fiscal. 

Outro exemplo é a supressão ou omissão no fornecimento de documentos que comprovam a movimentação financeira da empresa, como extratos bancários. Ou ainda, a adulteração desses documentos, com vistas a demonstrar uma situação fiscal e financeira que não corresponde à realidade. 

– Diferença entre elisão fiscal e evasão?

Embora tenham fonética similar, evasão e elisão fiscal são conceitos jurídicos distintos. Você sabe qual a diferença entre eles?

Como vimos, a evasão fiscal consiste na fuga do pagamento de impostos, realizada por meio de práticas ilícitas, como a fraude de documentos, a omissão de informações, entre outros. 

Da mesma forma, a elisão consiste em fugir ao pagamento de tributos. Contudo, para chegar a esse resultado, neste caso, a pessoa (física ou jurídica) emprega práticas consideradas lícitas. 

Outra diferença entre as duas práticas diz respeito ao momento em que elas ocorrem. Na evasão, a fuga se dá quando o fator gerador do tributo já está constituído. Na elisão, meios são utilizados para evitar que o fator gerador ocorra, ou para reduzi-lo. 

Entre os exemplos de elisão fiscal mais comuns, está a escolha de um regime tributário em que a taxação seja menor. Ou ainda, a mudança de endereço da empresa, de um estado ou município para outro, com vistas à redução da carga tributária. 

Como se vê, nenhuma dessas medidas é ilícita mas, ao fim e ao cabo, elas acabam produzindo um efeito similar ao do crime de evasão: a redução do montante pago pela empresa em forma de tributos.

Marcos jurídicos para a evasão fiscal

Como ficou evidente, a sonegação ou evasão fiscal está regulada pela Lei 4729/65. Entretanto, posteriormente, outras legislações foram aprovadas e acabaram por incidir também sobre a conceituação de evasão. É sobre elas que falaremos a seguir. 

– Lei de Crimes contra a Ordem Tributária (Lei 8.137/90)

A Lei de Crimes contra a Ordem Tributária (Lei 8.137/90) renovou a discussão jurídica sobre a evasão fiscal. Na prática, a Lei 4729/65 segue em vigor, mas alguns juristas consideram que ela foi parcialmente revogada, de forma implícita, pela Lei 8.137/90. 

Ocorre que, em seu Art. 1º, a  LeI de Crimes contra a Ordem Tributária traz a seguinte lista de condutas:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:       

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

A supressão ou redução de tributos de que fala a Lei de Crimes contra a Ordem Tributária já se fazia presente na Lei 4729/65, quando ela caracteriza as práticas ilícitas que caracterizam a evasão (Art. 1º) como aquelas realizadas com a intenção de “eximir-se”, “exonerar-se” ou “obter dedução” do pagamento de tributos. 

No entanto, para o jurista Fábio Bittencourt da Rosa, é justamente neste ponto que reside a distinção entre os dois textos legais. Em artigo sobre o tema, o Dr. Fábio destaca que a Lei 4.729/65, quando traz expressões como “com a intenção de”, ou “com o propósito de”, prevê um “elemento subjetivo de tipo” – chamado, por vezes, de “dolo específico”. Nas palavras dele: 

“Tais expressões indicam a existência de elemento subjetivo do tipo. Quer dizer, a declaração falsa, a inserção de elementos inexatos, a alteração de faturas ou a emissão de documentos graciosos não caracterizam crime se no dolo do tipo não estiver contida a específica intenção de eximir-se ou exonerar-se do pagamento do tributo, de fraudar a Fazenda Pública ou de obter dedução de tributos.”

Por sua vez, o texto da Lei de Crimes contra a Ordem Tributária permite uma interpretação diversa. Isso ocorre porque, segundo o jurista, sua redação não exige a existência de intenção:

“Logo, exemplificativamente, omitir informação à autoridade fazendária, com decorrente redução de tributo, subsume a figura típica, sem se indagar se houve intenção especial de reduzir tributo. O comportamento se insere no dolo do tipo. E, assim, se o sonegador age com dolo eventual, ou seja, omitindo a informação sem intenção de reduzir tributo, mas tal comportamento for capaz de colocar em risco o erário, tentativa de sonegação fiscal será punível. Acaso aconteça a redução do tributo, estará consumado o delito.”

– Lei Complementar 104/2001

A LC 104/2001 está mais diretamente ligada à elisão fiscal, e não à evasão, mas representou um avanço do legislador no sentido de evitar a fuga de arrecadação. 

Ocorre que a Lei Complementar 104/2001 adiciona ao Código Tributário Nacional (CTN), Art. 116, um parágrafo único para regular quando “considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos”. O acréscimo vigora com a seguinte redação:

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.

Trata-se, portanto, de uma norma de caráter antielisivo, uma vez que incide sobre as práticas de dissimulação para evitar o fator gerador – questão central para a definição de elisão. 

Na prática, no entanto, a Lei Complementar 104/2001 pouco alterou as práticas de evasão ou elisão das empresas, uma vez que ainda não há lei ordinária para regular-la. 

Quais são os tipos de evasão fiscal?

A evasão fiscal pode ser praticada de diferentes formas, como vimos nos exemplos trazidos ao longo deste artigo. Assim, convencionou categorizar a evasão fiscal de acordo com o tipo de infração que é cometido para materializar a fuga de pagamento. 

Vejamos, portanto, quais são os três tipos de evasão fiscal. 

– Evasão fiscal tributária

A evasão fiscal tributária é aquela em que se cometem infrações tributárias para eximir-se do pagamento de tributos, ou para provocar sua redução indevida. 

Um exemplo simples de evasão fiscal tributária é a aplicação intencional de uma alíquota de imposto menor que aquela determinada em lei. 

Ou ainda, a classificação indevida de um produto ou serviço em um regime tributário mais favorável, na tentativa de ludibriar os órgãos de fiscalização e recolher um volume menor de tributos.

– Evasão fiscal penal

Por sua vez, a evasão fiscal penal é aquela em que se recorrem a infrações penais para promover o crime de evasão. Há diversos tipos de infrações que podem ser acionadas, nestes casos. 

Um exemplo é a alteração ou fraude de documentos – extratos bancários ou demonstrativos contábeis e fiscais –  com vistas a reduzir ou eliminar o pagamento de tributos. 

– Evasão fiscal tributária e penal

Como o próprio nome já sugere, a evasão fiscal tributária e penal ocorre quando se combinam infrações penais e tributárias para a materialização do crime. 

A falsificação e fraude de notas fiscais é um exemplo claro desse tipo de evasão, já que, ao mesmo tempo, ela reúne prática ilícita no nível tributário e criminal. 

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Sanções e penalidades advindas da evasão fiscal

De acordo com a Lei 4729/65, a pena para o crime de evasão fiscal é a detenção, de seis meses a dois anos, além da aplicação de multa, que pode variar entre duas a cinco vezes o valor do tributo sonegado.

Além disso, a letra da lei traz também a especificação de algumas situações em que cabe redução – para réu primário – ou majoração da pena – para funcionário público -, conforme segue:

     § 1º Quando se tratar de criminoso primário, a pena será reduzida à multa de 10 (dez) vêzes o valor do tributo.

     § 2º Se o agente cometer o crime prevalecendo-se do cargo público que exerce, a pena será aumentada da sexta parte.

     § 3º O funcionário público com atribuições de verificação, lançamento ou fiscalização de tributos, que concorrer para a prática do crime de sonegação fiscal, será punido com a pena dêste artigo aumentada da têrça parte, com a abertura obrigatória do competente processo administrativo.

Além disso, é fundamental ter em mente que a evasão fiscal pode ser enquadrada de acordo com a Lei de Crimes contra a Ordem Tributária (Lei 8.137/90). Neste caso, a pena de reclusão pode chegar aos cinco anos, a depender de como a evasão foi praticada. 

Outrossim, importa destacar que a sonegação ou evasão fiscal está caracterizada pelo uso de meios ilícitos para fugir à obrigação de pagamento. Assim, na materialização da evasão, outros crimes podem ser cometidos, aumentando a pena. 

O poder público e o combate à evasão

A evasão fiscal é um problema que assola diversos países, em todo o mundo. Em 2017, a ONU estimou que, no Brasil, a evasão fiscal por parte das empresas era de 27%, totalizando um montante de R$ 350 milhões sonegados. 

De modo prático, a maioria dos economistas concorda que a melhor maneira de reduzir esse índice é a adoção de políticas públicas mais claras de fiscalização e combate à evasão fiscal, tanto no que diz respeito a pessoas físicas, quanto às pessoas jurídicas. 

No nível do Direito, a legislação parece caminhar no sentido de coibir práticas até então consideradas legais, como aquelas de elisão fiscal. Por outro lado, pouco avanço se tem visto em matéria de legislação para a evasão fiscal. 

Mitigação do risco de evasão nas empresas: 3 desafios para o departamento jurídico

Se você é advogado corporativo ou atua, de alguma forma, junto ao jurídico de empresas, saiba que a redução do risco de evasão fiscal é uma medida fundamental para evitar futuras demandas contenciosas.

Abaixo, selecionamos três ações que podem ajudar o departamento jurídico nessa tarefa.

– Implementação do planejamento tributário

Como demonstrado nas seções anteriores, a evasão fiscal é crime, mas a elisão fiscal ainda não foi classificada como tal – o mais próximo, nestes casos, é a norma antielisiva da Lei Complementar 104/2001, que ainda carece de regulamentação. E, mesmo assim, há muitos precedentes jurisprudenciais a favor das práticas elisivas. 

Assim, é possível que as empresas realizem um planejamento tributário, de modo a reduzir a obrigação de tributos antes mesmo que eles incidam sobre as atividades da empresa. 

Na prática, o planejamento tributário nada mais é que uma análise jurídico-contábil, por meio da qual se determinam medidas econômicas e jurídicas – sempre dentro da mais estrita conformidade legal – para reduzir a carga tributária devida. 

Importa destacar que o planejamento tributário é um trabalho conjunto, e não pode ser realizado exclusivamente pelo departamento jurídico. 

Além de agregar as equipes financeiras e contábeis, é preciso também que esse planejamento seja condizente com os objetivos do negócio e as perspectivas de crescimento da organização. Por esse motivo, muitas vezes, lideranças da alta gestão precisam ser consultadas. 

– Controle de documentos relacionados

Para mitigar os riscos de evasão fiscal – e todas as sanções a ela associadas – é fundamental que o jurídico e a contabilidade, conjuntamente, mantenham rígido controle sobre os processos internos e sobre a documentação contábil da empresa. 

Planos tributários, demonstrações contábeis, certidões e licenças relacionadas, entre outros documentos, precisam ser armazenados em local único, seguro e acessível. Soluções de armazenamento em nuvem e softwares podem ser usadas com essa finalidade.

Adicionalmente, o jurídico pode incluir nas políticas de compliance da empresa, diretrizes que regulem a emissão e armazenamento de documentos financeiros, fiscais e contábeis, que podem ser úteis para auditorias internas e externas. 

– Conscientização de líderes e colaboradores

A evasão fiscal é um problema por vezes subestimado, e grande parte das pessoas – sobretudo aquelas alheias às questões jurídicas – desconhecem as penas e sanções previstas. 

Por esse motivo, se o objetivo do departamento jurídico é reduzir os riscos de evasão ou sonegação, é fundamental investir em conscientização sobre esse tema. Faz-se necessário orientar, desde as lideranças de equipes até os colaboradores do balcão. 

Além de tornar conhecidas as penalidades que podem incidir sobre a empresa, caso se identifique sonegação, é fundamental também que o jurídico deixe claro quais comportamentos caracterizam evasão, e construa junto aos colaboradores políticas claras para evitá-los. 

Com esse tipo de medida, na prática, os departamentos jurídicos solidificam uma atuação preventiva. A longo prazo, os resultados dessa atuação se materializam na redução do volume de demandas contenciosas. 

Perguntas frequentes

O que é crime de evasão fiscal?

O crime de evasão fiscal consiste na fuga ou redução da obrigação de pagamento de tributos, por meio do uso de práticas ilícitas, como a não-emissão ou adulteração de notas, a fraude de declarações e documentos, entre outros.

Quando ocorre a evasão fiscal?

A evasão fiscal se materializa pelo uso de práticas ilícitas para evitar ou reduzir o volume de tributos a serem pagos por uma pessoa física ou jurídica. Ela ocorre sempre que se obtém, como resultado da prática ilícita, a redução ou supressão do pagamento de um ou mais tributos que, de outra forma, seriam obrigatórios

Quais são as formas de evasão fiscal?

A evasão fiscal se apresenta em pelo menos três formas. A evasão fiscal tributária (quando se usam práticas tributárias ilícitas), a evasão fiscal penal (quando a pessoa se vale de práticas ilícitas no nível penal), e a evasão fiscal tributária e penal, que nada mais é do que uma combinação das duas formas anteriores.

Conclusão

Fica claro, diante de todo o exposto aqui, que a conceituação de evasão fiscal e a tolerância ou não a práticas elisivas ainda não são matéria completamente pacificada no Direito. 

Mesmo assim, é importante que os gestores jurídicos trabalhem de modo a equilibrar os interesses da empresa com as diretrizes legais vigentes, proporcionando, sempre que possível, maior segurança jurídica aos negócios. 

Esperamos que o conhecimento e as dicas compartilhadas neste artigo ajudem você nesse desafio. Bom trabalho!

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