O que é garantia fidejussória? Tipos, usos e jurisprudência

02/08/2023
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14/10/2024
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As garantias são um intrumento importante para que as partes credoras tenham mais segurança e tranquilidade quanto ao recebimento de uma obrigação devida. Contudo, nem sempre quem presta essa garantia é o devedor principal. Muitas vezes, é preciso acionar terceiros nessa relação, o que nos leva às garantias fidejussórias.

Embora o termo “fidejussória” seja pouco utilizado na língua portuguesa, ele remonta a tempos antigos. Alguns estudiosos afirmam que o povo visigodo, que habitou a Península Ibérica entre 418 a 711 d.C, evitava manter acusados em prisão provisória enquanto o delito era apurado, libertando-os “sub fidejussore“, isto é, sob a palavra dos fiéis carcereiros.

Fidejussória, segundo o corrente etimológica mais popular, deriva do termo latino fidejussorius, que significa algo como “relativo à fiança, caução”. Como você verá ao longo deste artigo, a fiança é um dos tipos de garantia fidejussória mais comum no direito pátrio.

Além disso, aqui, adentraremos mais profundamente no conceito de garantia fidejussória, em sua distinção para com as garantias reais, em seus subtipos e aplicações. Esperamos que este conteúdo seja útil. Boa leitura!

O que é garantia fidejussória?

Garantia fidejussória é um tipo de garantia especial, de caráter pessoal, que envolve assumpção, por um terceiro, da dívida originalmente assumida pelo devedor. Por exemplo, ao fazer a locação de um imóvel com fiador, o fiador é quem ocupa a posição de terceiro garantidor. Se o credor (locatário) não cumprir com suas obrigações, será acionado o fiador.

A fidejussória é também conhecida como “garantia pessoal”, uma vez que a responsabilização, em caso de acionamento, se dá individualmente, sobre o terceiro que responderá em conjunto com o devedor.

Para que serve uma garantia fidejussória?

A existência de uma garantia fidejussória serve como uma camada de segurança adicional para o credor Afinal, se o devedor não cumprir com as obrigações previstas, será possível acionar a garantia fidejussória associada a um terceiro.

Para o devedor, que contrai uma série de obrigações contratuais, a garantia fidejussória é uma possibilidade de aceder a recursos maiores do que aqueles que poderiam ser acessados se não houvesse um terceiro garantidor.

Por isso, embora possa representar um risco para esse terceiro que contribui de forma personalíssima, a garantia fidejussória é certamente um ganho para devedores e credores.

Quais são os tipos de garantia fidejussória?

Existem diferentes maneiras de subcategorizar e denominar as modalidades de garantia fidejussória mais comuns e utilizadas no Direito Pátrio. Aqui, apresentaremos em mais detalhes 3 dessas garantias, quais sejam:

  • Fiança
  • Aval
  • Seguro garantia

É importante lembrar que, além destas, muitos juristas consideram como exemplo de garantia fidejussória também o caução, o instituto da solidariedade passiva

Fiança

Por meio da fiança, um fiador (terceiro na relação), assume o compromisso de satisfazer – a partir de um conjunto de bens de seu patrimônio – o direito de créditos do credor, caso o devedor principal não cumpra com suas obrigações.

De modo geral, a fiança pode estar atrelada à obrigações:

  • de dar;
  • de fazer
  • de não fazer.

Os compromissos específicos assumidos pelo fiador são construídos caso a caso, na elaboração do contrato.

Para firmar esse tipo de garantia fidejussória, faz-se necessário constituir um contrato de fiança, definido no Código Civil, nos artigos 818 a 826. Esse tipo de contrato pressupõe, entre outros pontos:

  • a presença de duas partes: credor e fiador, sem necessidade da presença, consentimento ou conhecimento do devedor;
  • registro por escrito, sem qualquer interpretação extensiva;
  • possibilidade de abarcar obrigações acessórios da dívida principal, como as despesas judiciais, por exemplo;
  • possibilidade de ter valor inferior ao da obrigação principal e ser contraída em condições menos onerosas;
  • margem para que o credor negue determinado fiador, se não considerá-lo idôneo, detentor de bens suficientes, ou domiciliado no município do credor;

Por fim, é importante lembrar que a fiança é um dos tipos de garantia pessoal mais comuns no Brasil.

Aval

O aval é um tipo de garantia fidejussória aplicada especificamente à títulos de crédito. Tal instituto está regulado pelo Código Civil, nos artigos 897 a 900. Nesse tipo de relação, um avalista garantiza de forma total ou parcial uma obrigação, vínculada a um título de crédito e assumida por um terceiro, dito avalizado.

Na prática, o avalista é espécie de co-devedor, e pode ser acionado simultaneamente ao devedor principal. Caso o avalista venha a quitar o título do devedor principal, o CC prevê expressamente

Art. 899 […]

§ 1° Pagando o título, tem o avalista ação de regresso contra o seu avalizado e demais coobrigados anteriores.

Seguro garantia

O seguro garantia é uma modalidade de garantia fidejussória em que o devedor contrata uma entidade seguradora, que assume a responsabilidade de indenizar o credor em eventual inadimplência ou mora do devedor frente a obrigações previamente acordadas. Nesse tipo de garantia, a posição de terceiro é ocupada pela seguradora.

Nesse tipo de relação, costumam existir três partes envolvidas: o tomador do seguro, o segurado (credor) e a seguradora. Em contrapartida à assumpção do compromisso por parte da seguradora, o devedor se compromete a fazer contraprestações a ela – em geral, com valores muito inferiores ao montante total segurado.

Cabe ressalvar que, entre juristas e doutrinadores, a natureza e caracterização do seguro garantia não é tema pacificado. Enquanto alguns sustentam que o seguro garantia seria um gênero de seguro de danos, outras advogam no sentido de que estaríamos diante de um contrato de fiança ou um contrato atípico.

Saiba mais sobre como funciona um seguro garantia, na modalidade judicial, no Juriscast:

Leia mais sobre o tema:

Garantia real e garantia fidejussória: quais as diferenças?

Uma confusão bastante comum no universo do Direito, quando falamos em garantias, diz respeito às diferenças entre garantia real e especial (ou fidejussória).

Como vimos, as garantias fidejussórias são aquelas em que se objetiva atribuir ao credor certos direitos sobre bens ou patrimônios de terceiros, que não diretamente do devedor.

Por sua feita, as garantias reais são aquelas em que o direito cedido ao credor, em forma de garantia, é sobre bens e patrimônios do própio devedor. Por exemplo, se uma pessoa natural contrai um empréstimo bancário e dá em garantia um imóvel de sua propriedade, tem-se uma operação com garantia real.

Como resumiu o juiz de direito Eugênio Rosa de Araújo, portanto, temos:

“As garantias pessoais [fidejussórias] sujeitam um terceiro à execução de seu patrimônio, em caso de não cumprimento pelo devedor, como, por exemplo, a fiança e o aval; as garantias reais, por outro lado, se visualizam pela possibilidade de o credor obter o pagamento preferencial do seu crédito pela venda de bens ou seus rendimentos.” DE ARAÚJO, Eugênio Rosa. Garantias das Obrigações: Configuração das Garantias Especiais Atípicas. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro nº, v. 70, p. 99, 2018.

Por fim, é preciso fazer a ressalva de que algumas modalidades existentes hoje podem não se encaixar perfeitamente nem como garantias reais, tampouco como garantias pessoais ou fidejussórias. À título de exemplo, a advogada e pesquisadora Luiza Perrelli Bartolo cita os institutos da alienação fiduciária e o penhor de créditos.

Leia também:

O que é carta de fiança fidejussória? Como é feita uma carta fidejussória?

A fiança é um dos instrumentos mais conhecidos no Brasil, e para formalizá-lo, é comum que se redija o que chamamos de carta de fiança fidejussória – ou apenas carta fidejussória. Ela compreende algumas partes, como o devedor, o fiador e o credor.

Geralmente, a carta fiança fidejussória é utilizada para garantizar algum depósito judicial ou recursal, requerido ao longo de um processo judicial. Assim, ela é contratada junto a uma seguradora ou instituição bancária atualizada.

Verificar se a entidade emissora da garantia em carta de fiança fidejussória atende aos requisitos legais é essencial para ter essa garantia reconhecida frente aos tribunais.

Qual o valor da garantia fidejussória?

Para determinar o valor de uma garantia fidejussória, é preciso analisar o caso concreto e o subtipo de garantia em questão. Em algumas modalidades, como a de aval para títulos de crédito, é comum que o avalista precisa apresentar um bem de seu patrimônio com valor próximo ou equivalente à obrigação contratada.

Em outras modalidades, como no seguro-garantia judicial, os valores requeridos podem ser menores. E mesmo em situações que a seguradora exigir contrato de contragarantia, é possível que o patrimônio empregado ainda seja inferior ao valor envolvido na obrigação principal.

Para fianças, por sua vez, o Código Civil veda que o fiador seja onerado em valor superior àquele do devedor.

Logo, apenas a análise do caso concreto permite dizer com certeza qual será o valor de uma garantia fidejussória

Garantia fidejussória e tutela de urgência: o que você precisa saber

Para relembrar, a tutela de urgência é um instituto que permite ao juízo conceder um direito pedido em processo antes que este termine, de forma antecipada ou cautelar.

No Novo CPC encontramos que, em certos casos, garantias fidejussórias podem ser acionadas para assegurar a outra parte a cobertura de eventuais danos. In verbis:

Art. 300.  A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§1oPara a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

A determinação do acionamento, ou não, de garantia fidejussória é competência do juiz, cabendo exclusivamente a ele determinar esse movimento ou não.

Garantias fidejussórias em planos de recuperação judicial: entendimento do STJ

A recuperação judicial é um processo por meio do qual empresas devedoras comunicam seu estado financeiro aos credores e parceiros, e propõem um plano para se recuperar de tal situação.

Em 2021, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento, no julgamento do  REsp 1.333.349 de caráter repetitivo, no sentido de a anuência do titular da garantia real ou fidejussória é indispensável para que o plano de recuperação judicial possa estabelecer a sua supressão ou substituição.

Para efeitos do art. 543-C do CPC: “A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005. RECURSO ESPECIAL Nº 1.333.349 – SP

O titular da garantia fidejussória, importa esclarecer, é ninguém mais que o credor detentor de direitos. Significa dizer, portanto, que esse tipo de garantia (assim como as reais) não podem ser suprimidas a revelia do credor.

Perguntas frequentes

O que é garantia fidejussória?

Garantia fidejussória (ou pessoal) é um tipo de garantia personalissima, dependente de um terceiro que assume o compromisso, de com seu patrimônio ou bens, garantizar a dívida ou obrigação assumida pelo devedor principal. Fiança e aval são alguns exemplos de garantias fidejussórias.

Qual a a diferença entre garantia real e fidejussória?

Na garantia real, os direitos cedidos ao credor, em garantia ao cumprimento das obrigações, são sobre bens e patrimônios do devedor que contraiu a obrigação. Nas garantias fidejussórias, o patrimônio empenhado em garantia é vinculado a um terceiro, que não diretamente o devedor principal.


Conclusão

Como você viu, a garantia fidejussória é um modelo bastante utilizado, tanto por pessoas físicas quanto jurídicas – para estas últimas, sobretudo por meio do seguro garantia.

A elaboração de contratos, a redação de cartas-fiança e apólices com garantias fidejussórias exige especial atenção do jurídico, afinal, são esses documentos que formalizaram a relação de garantia entre as partes. Esperamos que esse artigo tenha sido útil no seu dia a dia. Até a próxima!

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