O recebimento de pensão alimentícia trata-se de um tema sensível ao Direito. Especialmente por ser devido, em regra, a pessoa incapaz de promover o seu próprio sustento sem a ajuda de terceiros. Em que pese ser um assunto muito discutido no âmbito do Direito de Família, o recebimento de pensão alimentícia foi, recentemente, cobiçado pelo Direito Tributário. Na ocasião se discutiu a constitucionalidade da incidência do Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título de pensão alimentícia.
No dia 6 de junho de 2022, o Supremo Tribunal de Federal (STF) julgou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5422. Nesta, prolatou uma importante decisão a respeito do IR sobre pensão alimentícia. Tal decisão afeta não somente a temática envolvendo o Direito de Família, mas, também, o ramo do Direito Tributário.
Nesse sentido, dada a relevância e atualidade do tema, pretende-se, neste artigo, abordar o objeto da decisão proferida pelo STF, bem como os desdobramentos práticos desse acórdão, especialmente no que concerne à modulação de efeitos e seu impacto nas ações de restituição de indébito tributário.
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Quem recebe pensão alimentícia tem que pagar Imposto de Renda?
Em novembro de 2015, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) apresentou a ADI 5422 ao STF para requerer o reconhecimento da inconstitucionalidade da incidência do Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título de pensão alimentícia.
A problemática da questão surgiu em razão de as pessoas que recebem pensão alimentícia sofrerem redução significativa de sua verba alimentar, uma vez que parte dessa verba era corroída pela incidência do imposto.
O julgamento dessa ação teve início no ano de 2018 e, em 2022, teve decisão favorável aos contribuintes. Veja o extrato de julgamento:
O Tribunal, por maioria, conheceu, em parte, da ação direta e, quanto à parte conhecida, julgou procedente o pedido formulado, de modo a dar ao art. 3º, § 1º, da Lei nº 7.713/88, aos arts. 4º e 46º do Anexo do Decreto nº 9.580/18 e aos arts. 3º, caput e § 1º; e 4º do Decreto-lei nº 1.301/73 interpretação conforme à Constituição Federal para se afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias, nos termos do voto do Relator, vencidos parcialmente, os Ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Nunes Marques, que conheciam em parte da ação e, no mérito, julgavam-na parcialmente procedente, nos termos de seus votos. Plenário, Sessão Virtual de 27.5.2022 a 3.6.2022. (ADI nº 5422, Plenário, Rel. Min. Dias Toffli, Julgado em 27/05/2022 a 03/06/2022.)
Da leitura dos votos, percebe-se que duas principais teses deram fundamento ao entendimento do relator e Ministro Dias Toffoli:
- O recebimento da pensão alimentícia não configura aumento de patrimônio, por isso não deve haver a incidência do IR;
- Para o indivíduo que procede com o pagamento da pensão alimentícia, já há a incidência do IR sobre os recebimentos daquele ano. Assim, tributar o recebedor dessa pensão, configura uma bitributação, considerando que já fora anteriormente tributada.
Desse modo, a decisão vem no sentido de sanar a problemática envolvendo a diminuição dos valores de recebimento do alimentado. Isso porque, indubitavelmente, o recebedor possui dependência da pensão alimentícia para a sua sobrevivência.
Qual o limite da dedução da pensão alimentícia?
Quanto aos efeitos dessa decisão, vale ressaltar que a ação manejada foi uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Assim, o pedido feito pelo IBDFAM visou questionar se essa cobrança está de acordo com a Constituição Federal.
De forma técnica, a ADI possui natureza constitucional, efeitos erga omnes e, também, ex tunc. Isso quer dizer que a ADI possui efeitos que atingem todos os indivíduos do território nacional (erga omnes) e, também, efeitos que retroagem ao início da incidência dessa obrigação, isto é, da data de publicação da lei que institui tal imposto.
Por essa razão é que os contribuintes têm direito à restituição dos valores pagos a título de IR incidente sobre pensão alimentícia, conforme disposto nos arts. 165, III, e 168 do Código Tributário Nacional (CTN):
Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:
III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: (destacou-se)
Considerando os artigos supracitados e a presente decisão do STF, fica evidente, portanto, que os efeitos da decisão estão relacionados a uma restituição do IR pago sobre a pensão alimentícia dos últimos 5 (cinco) anos, pois possui efeitos retroativos.
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O que diz o artigo 21 da Lei 9.868/99?
No que concerne a modulação de efeitos das decisões relacionadas ao STF, o artigo 27 da Lei 9.868/99 explicita o que se segue:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. (destacou-se)
Dessa forma, considerando o artigo supracitado e os efeitos da ADI, evidencia-se que, por natureza, a ADI terá efeitos retroativos à publicação de determinada lei.
Por outro lado, o artigo acima aduz que o STF poderá definir quanto a retroatividade dos efeitos causados pela decisão da ADI. Ou seja, caberá aos ministros do STF, por maioria de dois terços de seus membros, decidir a partir de que momento na linha do tempo a decisão por ele proferida surtirá seus
efeitos.
No mesmo aspecto, o STF de forma analógica aplica o texto presente no artigo acima para aduzir decisões de modulação de efeitos que irão protrair no tempo.
Jurisprudência sobre a temática tributária
Em outros processos de temática tributária em que os contribuintes saíram vencedores, o STF aplicou a modulação de efeitos para que a decisão favorável somente surta efeitos a partir do início do julgamento do mérito, ressalvadas as ações que já estavam em curso no momento do julgamento. Aconteceu dessa forma no julgamento dos temas 69 (exclusão do ICMS da base de cálculo da contribuição para o PIS e da COFINS) e 962 (inconstitucionalidade da incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic recebida pelo contribuinte na repetição de indébito tributário).
Caso o STF adote esse mesmo raciocínio à ADI 5422, o contribuinte que adimpliu com essa obrigação do IR sobre a pensão alimentícia e não ingressou com a ação judicial antes do julgamento não poderá protestar pela restituição de valores anteriormente pagos.
Por outro âmbito, é importante verificar que o STF ainda não se manifestou quanto à modulação dos efeitos no que se refere à ADI 5422. Desse modo, os contribuintes podem ingressar com a ação judicial para buscar restituição dos valores pagos. Essa ação, no entanto, tem o risco de o STF modular os efeitos e de consequente perda, restando ao contribuinte os ônus sucumbenciais em favor do fisco.
Dessa forma, não há uma definição concreta se haverá efeitos retroativos ou se os efeitos dessa decisão irão protrair no tempo, ou em outros termos, serão a partir do julgamento de modulação de efeitos.
Pode-se considerar, neste momento, que os efeitos do julgamento da ADI são Ex tunc. Então, tendo em vista a natureza dessa ação, portanto, retroagem ao início dessa cobrança. Nesse cenário, o contribuinte poderá requerer a restituição dos valores pagos referentes aos últimos 5 anos.
Considerações finais
Diante da decisão do STF sobre a ADI (5422), é notório que há um efeito positivo para o contribuinte do Imposto de Renda. Isso porque, ante ao entendimento anterior, este foi obrigado a adimplir com o imposto por receber pensão alimentícia.
À vista disso e, principalmente, considerando que os efeitos da ADI são retroativos e não houve a modulação de efeitos até o presente momento, entende-se que o contribuinte poderá requerer a restituição dos valores dos tributos pagos por meio âmbito administrativo ou na esfera judicial. Essa medida, no entanto, não é isenta de riscos. Afinal, como visto, o STF pode modular os efeitos para a data do julgamento, ressalvadas apenas as ações ajuizadas antes disso.
Dessa forma, para esclarecer melhor sobre os valores que o contribuinte possui direito à restituição e a via pela qual deve propor essa ação, é indispensável a consulta de um advogado especializado em Direito Tributário. A verificação do caso concreto por um profissional especializado é fundamental para a situação narrada neste artigo.
Principais dúvidas sobre o assunto
A pensão alimentícia não representa renda, portanto, por decisão do STF, não existe incidência de pensão alimentícia para quem a recebe.
Sim. É possível incluir a pensão alimentícia na declaração do Imposto de Renda, tanto do devedor quanto do recebedor. Neste último caso, é possível ainda, fazer a dedução de 100% do valor pago de IR.
Não. Segundo a decisão já explanada neste artigo, quem recebe pensão alimentícia não precisa pagar imposto de renda, uma vez que, subentende-se que a pensão não configura renda.
Escrito por: Igor Antonio Lima de Oliveira. Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). Associado ao Instituto de Estudos Avançados em Direito (IEAD). Estagiário no escritório Donilo Bahia Advogados. E-mail para contato: [email protected].
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Olá! Nesse casos a Repetição de indébito que o alimentando poderá ingressar é contra a união?
Abs!
Olá, Mariana!
Após o julgamento do tema pelo STF, não é mais necessário ingressar com ação de repetição de indébito. Basta fazer o pedido administrativo de restituição ou a declaração de compensação pelo sistema da Receita Federal.
Qualquer dúvida nesse sentido, estamos à disposição.