Quem acompanhou o caso da Influenciadora Digital Mariana Ferrer sabe o quanto a audiência, realizada no dia 27 de Julho de 2020, teve alta repercussão pelo caráter agressivo que o advogado de defesa dirigiu à Vítima. A audiência, que teve repercussão nacional após reportagem publicada pelo “The Intercept”, levou a elaboração do projeto de lei Mariana Ferrer, aprovado pelo Senado Federal na última quarta-feira, dia 27 de outubro de 2021.
O projeto de lei nº 5.096/20 visava punir quem constranger vítimas ou testemunhas de crimes durante audiências e julgamentos. O projeto, que já tinha sido, aprovado pela câmara dos deputados e pelo senado federal, aguardava, assim, somente a sanção do presidente Jair Bolsonaro. Em 22 novembro, o projeto foi, então, aprovado pelo presidente, publicando-se a Lei 14.245/2021, a Lei Mariana Ferrer.
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O crime de coação no curso do processo é o ato de utilizar-se de violência física e/ou moral para coagir autoridade, parte ou qualquer pessoa partícipe de processo judicial, policial, administrativo ou do juízo arbitral, em prol de interesse próprio ou da parte defendida.
É considerado um crime contra a administração da justiça. Portanto, o sujeito passivo do crime é o estado, e em secundário, a parte que sofre a conduta criminosa. Segundo o artº 344 do Código Penal:
Art. 344. Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral.
No ano de 2018, a Influenciadora Mariana Ferrer fez uma denúncia de que alguém a havia dopado e estuprado em um Beach Club na cidade de Florianópolis, em Santa Catarina. Durante as investigações, descobriu-se que o autor do crime era o empresário André de Camargo Aranha.
O caso durou quase dois anos e terminou com a absolvição do empresário. A Lei Mariana Ferrer se deu, no entanto, pela atuação do advogado de André Carmargo Aranha, que durante a audiência online do caso, cometeu diversos ator desrespeitosos para com a vítima.
O advogado utilizou-se de fotos íntimas da vítima para sua argumentação e ainda acrescentou a seguinte frase “Peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher que nem você. E não dá para dar o teu showzinho, teu showzinho você vai lá dar no Instagram depois para ganhar mais seguidores.”
Durante a audiência, Mariana ainda solicita ao juiz que impeça que o advogado da outra parte faça esses comentários, “Excelentíssimo, eu estou implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada. Pelo amor de Deus, gente, o que é isso?”, disse Mariana.
O Juiz, em questão, Rudson Marcos, pede que o advogado mantenha o bom nível. Mas o advogado continua a atacar a influenciadora.
A audiência, que teve ampla divulgação pelo site The Intercept Brasil viralizou e chocou muitas pessoas da comunidade jurídica. Isso porque, é notável a falta de respeito do advogado durante a audiência e a falta de intervenção do juiz.
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O projeto de Lei Mariana Ferrer, ou PL 5.096/2020, altera o Código de Processo Penal (CPP) e inclui dispositivos que exigem o zelo das partes envolvidas em um processo penal.
Uma das principais mudanças que o projeto de Lei Mariana Ferrer traz é em relação às penalidades do crime de coação no curso do processo. Isso porque, além de ser um crime que ocorre no decorrer do processo penal, ele está se tornando cada vez mais comum em audiências.
A proposta inclui mudanças em relação às penalidades. Se aprovado, então, a penalidade para pessoas que constrangerem ou ameaçarem vítimas em julgamentos e audiências será ampliada.
A punição para o crime de coação hoje é de multa e 1 a 4 anos de reclusão, mas, com a alteração, a penalidade passa a ser maior. Ademais, se a coação ocorrer em casos de crime sexuais, a punição será de 1/3 até 1/2 maior.
Além disso, a proposta também define que, em julgamentos e audiências, em especial em casos de crimes sexuais, promotores, advogados, juízes, entre outros, deverão zelar pela dignidade da vítima. Caso isso não ocorra durante a audiência, os envolvidos podem responder civil, penal e administrativamente.
Assim, o texto diz que nessas audiências fica proibido que ocorram manifestações sobre fatos da vida pessoal da vítima, não ligadas ao crime em julgamento. Também fica proibida a utilização de linguagem, informações ou material que ofendam a dignidade da vítima.
Não somente a lei Mariana Ferrer causou alterações no código penal. Assim, vamos falar sobre as principais alterações nesse regramento, como a Lei Maria da Penha, o Pacote Anticrime e a Gravação Judicial. Vejamos a seguir.
Assim como a Lei Mariana Ferrer foi criada com embasamento e visando proteger os Direitos das mulheres, a Lei Maria da Penha também surgiu com este intuito.
Em resumo, a Lei 11.340/2006, que já existe há mais de 10 anos, é a lei que visa punir crimes de violência contra as mulheres. A legislação recebe o nome de Maria da Penha, farmacêutica brasileira que lutou em busca de justiça contra seu ex-marido por violência doméstica.
Foi devido à batalha desta mulher e da pressão internacional que se criou a lei que hoje busca proteger mulheres brasileiras da violência doméstica. Diferente do que muita gente acredita, a lei não se trata apenas de punir os agressores, mas sim de tomar ações de prevenção a casos como este.
Isso se prova, pois, em primeiro lugar, a lei não trata apenas de violência física ou sexual. Ela abrange todos os tipos de violência contra as mulheres, como vê-se no art. 5º:
Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Além disso, a lei busca garantir às mulheres os direitos fundamentais à pessoa humana previstos na Constituição Federal de 1988.
Em 2019, a lei passou por algumas alterações, dentre as quais estão:
Vale lembrar que, a lei se refere a qualquer pessoa do convívio da vítima, que cometa algum tipo de agressão contra mulheres devido ao gênero da vítima.
Além da Lei Maria da Penha e da Lei Mariana Ferrer, outra mudança no código penal foi a criação da lei do pacote anticrime. A lei, que passou a valer em janeiro de 2020 dispõe sobre a corrupção, o crime organizado e atos de violência praticados contra a pessoa. Assim, mudam-se as seguintes regras:
Caixa 2 – Antes julgado pelo código eleitoral, com a lei anticrime a prática de caixa 2 passa a ser considerado um crime. Assim sendo, a pena também se torna mais rígida. Agora a penalidade é de reclusão de 2 a 5 anos, podendo aumentar se comprovada participação de agente público.
Prisão de condenados após 2ª instância – Anteriormente ninguém podia ser preso se não houvesse ocorrido trânsito em julgado ou flagrante. Agora o código penal permite o cumprimento de pena de condenados em 2ª instância.
Confisco de bens do crime – É a permissão de confiscar bens de uma pessoa presa por um crime no valor compatível ao valor do crime.
Organizações criminosas – A lei passa a incluir facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), bem como dispõe sobre as penalidades aos líderes destas.
Arma de fogo – Já existia penalidade sobre uso indevido de armas de fogo, aumentando, portanto, quando se trata de agentes públicos. Dessa maneira, a lei apenas aumentou a penalidade também em casos de o autor já possuir condenações anteriores.
Tribunal do Júri – Com a lei anticrime, pessoa condenada em tribunal do júri passa a cumprir pena imediatamente.
Legítima defesa – A alteração com maiores críticas no processo anticrime é a de legítima defesa, já que deixa brecha para atuação errônea de policiais. Isso porque, segundo a nova legislação, a pena para crimes realizados em legítima defesa pode ser reduzida até a metade ou deixar de ser aplicada.
Por fim, a alteração sobre a recomendação da gravação judicial em audiências online deferida pelo Conselho Nacional de Justiça, também ocorrer após o caso que inspirou a Lei Mariana Ferrer.
Segundo o CNJ, a gravação judicial foi o que nos permitiu ver o que ocorreu na audiência e, em consequência, identificar o crime de coação.
Assim, todas as audiências online devem agora ser gravadas.
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