O bloqueio do Telegram é legal? Veja o que diz a lei
Internet é terra sem lei? Desde a aprovação do Marco Civil da Internet, seguramente a resposta para essa pergunta é “não”. O uso da internet no Brasil, seus direitos, deveres e garantias, estão estabelecidos no texto legal do Marco, transformado na Lei 12.965/14.
E, além de ser um dos dispositivos mais importantes em matéria de responsabilização civil no âmbito da internet, a construção do Marco Civil da Internet é também um grande exemplo de participação da sociedade civil na atualização do arcabouço jurídico do país.
Por isso, neste artigo, além de entender quais são os princípios dessa lei, os direitos dos usuários, e os deveres e cuidados que as empresas precisam ter, você ainda conhecerá o processo histórico e jurídico que culminou na aprovação do texto da Lei 12.965 de 2014. Vamos lá?
A Lei federal 12.965/14, conhecida também como Marco Civil da Internet, é o principal diploma jurídico para regulação do uso da internet no Brasil. Em seu texto, o Marco Legal traz garantias, direitos e deveres, tanto para usuários quanto para empresas.
Outro grande mérito do Marco Civil da Internet está na regulamentação de princípios de segurança e privacidade de dados, numa época ainda anterior à sanção da Lei Geral de Proteção de Dados.
Na prática, a Lei 12.965/14 conta com 32 artigos, divididos nos seguintes capítulos:
O processo histórico que culminou na aprovação da Lei 12.965/14 tem início quase 10 anos antes e é marcado por um movimento de participação da sociedade civil na construção do texto da lei.
Para o Observatório do Marco Civil da Internet – publicação independente e acadêmica, que monitora e analisa a construção e os efeitos do Marco Civil – a discussão se inicia por volta de 2006, quando é apresentado no Senado o projeto de lei (PLC) 89/03.
Esse projeto, posteriormente transformado na Lei 12.735/12(Lei Azeredo), estabeleceu a criação de delegacias especializadas em crimes informáticos, entre outras disposições.
Para os especialistas do Observatório, a discussão da Lei Azeredo serviu para jogar luz sobre a necessidade de uma regulamentação civil – e não apenas penal – para o uso da internet no Brasil.
Assim, em outubro de 2009, a Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, com o apoio de outros órgãos da Administração Pública, e de instituições de ensino, deu início ao processo de consulta pública para construção do Marco Civil da Internet.
A primeira fase de discussão contou com mais de 800 sugestões da sociedade civil. Ao final da segunda fase, encerrada por volta de maio de 2010, é apresentada a primeira minuta do anteprojeto.
Mas, é apenas em 2011 que o projeto (PL 2.126/2011) começa a tramitar efetivamente na Câmara dos Deputados. Uma comissão especial para análise da proposta é instituída e novos debates, com contribuição popular, são abertos.
No ano de 2013, após repercussão midiática acerca de supostos casos de espionagem digital sobre figuras públicas e políticas do Brasil, o projeto volta a receber atenção, e passa a tramitar em regime de urgência.
Finalmente, em 2014, após extensas discussões na Câmara, o projeto foi aprovado e encaminhado ao Senado. Em abril do mesmo ano, os senadores aprovaram o projeto e, no dia 23, ele foi sancionado pela então presidenta, Dilma Rousseff.
O artigo 3º da Lei 12.965/14 traz os princípios que devem reger o uso da internet no Brasil. Há três desses princípios que se destacam e perpassam todo o texto da lei. São eles:
Contudo, ao analisar o texto legal, fica evidente que os princípios trazidos pelo Marco Civil da Internet, na verdade, são oito. Vejamos:
Art. 3º A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:
I – garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;
II – proteção da privacidade;
III – proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
IV – preservação e garantia da neutralidade de rede;
V – preservação da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede, por meio de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais e pelo estímulo ao uso de boas práticas;
VI – responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;
VII – preservação da natureza participativa da rede;
VIII – liberdade dos modelos de negócios promovidos na internet, desde que não conflitem com os demais princípios estabelecidos nesta Lei.
A seguir, você verá as implicações de cada um desses princípios. Vamos lá?
A garantia de liberdade de expressão, prevista no Marco Civil da Internet, está diretamente relacionada ao Art. 5º da Constituição Federal de 1988, sobretudo nos incisos IV e IX, que tratam diretamente da liberdade de manifestação de pensamento e de expressão e comunicação.
Para reforçar esse princípio fundamental, no texto do Marco encontramos diretrizes para limitar a retirada de conteúdos publicados por terceiros – exceto quando houver ordem judicial – , bem como, sobre a não responsabilização dos provedores de conexão ou de aplicações frente a esses conteúdos (Art. 19 da Lei 12.965/14).
O princípio da privacidade no uso da internet no Brasil está diretamente relacionado à responsabilidade das empresas que fazem a guarda e o armazenamento dos registros de navegação dos usuários, na rede mundial de computadores.
O texto legal, no Art. 10 e em outras passagens, deixa claro que a preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes é um dever e um princípio fundamental.
A proteção de dados é um assunto recorrente atualmente, mas antes da LGPD, havia pouca regulamentação sobre o tema. Isso reforça o papel do Marco Civil da Internet, ao trazer a proteção de dados como um dos seus princípios fundamentais.
Importa destacar também que a proteção de dados não é apenas um princípio da lei, mas também um direito dos usuários, como fica evidente no Art. 7º do Marco.
A garantia de preservação da neutralidade de rede foi um dos pontos mais debatidos durante a tramitação do projeto de lei que culminou no Marco Civil da Internet.
Em termos práticos, o princípio da neutralidade garante a informação que circula pela internet deve ser tratada sem discriminações e que os usuários tem o direito de navegar com uma mesma velocidade, durante todo o tempo.
Assim, os provedores de conexão não podem cobrar valores diferenciados em virtude do tipo de conteúdo que os usuários acessam, por exemplo. Os pacotes são delimitados pela velocidade de conexão, portanto. E não pela discriminação do que é acessado.
Leia também: O que você precisa saber sobre a neutralidade de rede
Este princípio tem por finalidade garantir a qualidade e integridade dos serviços de conexão com a internet.
Assim, as empresas que atuam no setor passam a ter responsabilidade por prover um serviço de conexão capaz de atender aos interesses dos usuários, mesmo em horários de pico, por exemplo.e
Os agentes envolvidos no ecossistema da internet são muitos: usuários, fornecedores de conexão e de aplicações, administradores de infraestrutura e sistemas, e assim por diante. Logo, com este princípio, a lei solidifica o entendimento de que cada agente deve ser responsabilizado pelo que convém ao seu âmbito de atuação.
Ademais, cabe destacar que a responsabilização mencionada neste princípio diz respeito à esfera civil – e não à esfera penal, que é regulada por outras legislações.
O sétimo princípio do Marco Civil da Internet é aquele que determina a garantia da natureza participativa da rede. Isto é, da manutenção das características de colaboração e construção coletiva da internet.
O último princípio do Marco vai de encontro ao ideal da livre iniciativa e da liberdade para o exercício de atividades econômicas.
Importa ressaltar, no entanto, que o texto desse princípio, no Art.3º, inciso VIII, deixa claro que essa liberdade não pode conflitar-se com os demais princípios estabelecidos na lei.
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Agora que você já conhece os princípios norteadores do Marco Civil da Internet, é hora de entender quais os direitos garantidos aos usuários da internet, no texto da lei.
Esses direitos e garantias estão dispostos, sobretudo, nos artigos 7º e 8º da Lei 12.965/14. E, logo fica claro, eles estão intimamente ligados a alguns dos princípios que vimos na seção anterior, como a privacidade e proteção de dados, e o princípio da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede.
Assim, sem o intuito de esgotar o tema, podemos dizer que alguns dos principais direitos do usuário de internet são:
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Antes de mais nada, é importante entender a diferença entre empresas provedoras de conexão com a internet e empresas fornecedoras de aplicações de internet.
Embora o Marco Civil da Internet não traga, de forma clara, qual a definição para esses dois tipos de empresa, ao longo do texto da lei fica claro que não se trata de um conceito único. Vejamos, então, o que é cada uma dessas empresas:
A priori, tanto empresas provedoras de conexão quanto aquelas provedoras de aplicações de internet, precisam respeitar princípios como o da privacidade, sigilo e proteção de dados pessoais e de comunicação dos usuários na internet.
Contudo, no que tange às empresas provedoras de conexão, o Marco Civil da Internet trata de trazer também alguns deveres específicos. Um dos principais, diz respeito a guarda e registro das conexões. In verbis:
Art. 13. Na provisão de conexão à internet, cabe ao administrador de sistema autônomo respectivo o dever de manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 1 (um) ano, nos termos do regulamento.
A lei também traz que os provedores de conexão não devem terceirizar esses serviços, bem como, podem ser obrigados pelas autoridades a mantê-los por período superior a um ano.
Além disso, para ficar claro, o que precisa ser armazenado são os registros de conexão, que compreendem “o conjunto de informações referentes à data e hora de início e término de uma conexão à internet, sua duração e o endereço IP utilizado pelo terminal para o envio e recebimento de pacotes de dados” (Art. 5º, VI).
Por outro lado, as empresas provedoras de conexão não podem guardar e acessar o conjunto de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP.
Assim, se um usuário acessar determinado site, em certo dia e horário, essa informação não pode ser guardada pelos provedores de conexão (Art. 14).
Assim, como ocorre com os provedores de conexão, também as empresas provedoras de aplicações de internet precisam armazenar e guardar sigilo sobre alguns dados de acesso dos usuários. Porém, o período de guarda, nestes casos, é distinto. Conforme segue:
Art. 15. O provedor de aplicações de internet constituído na forma de pessoa jurídica e que exerça essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos deverá manter os respectivos registros de acesso a aplicações de internet, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 6 (seis) meses, nos termos do regulamento.
Cabe esclarecer que os registros de acesso a aplicações de internet, segundo entendimento contido no texto legal, compreendem “o conjunto de informações referentes à data e hora de uso de uma determinada aplicação de internet a partir de um determinado endereço IP” (Art. 5º, VIII). Portanto, não são o mesmo que os dados de conexão do usuário.
As regras de não terceirização da guarda, e de fornecimento de informações aos órgãos competentes, quando solicitado, se aplicam também aos provedores de aplicações.
Mesmo que a sua empresa não atue no setor de telecomunicações – fornecendo serviços de conexão para usuários – é muito provável que ela esteja na internet. Seja através de um site informativo, seja pela venda de serviços ou produtos pela internet, em ecommerces, e assim por diante.
Logo, as diretrizes trazidas pelo Marco Civil da Internet são do interesse de todas as empresas e, sobretudo, dos responsáveis jurídicos por essas empresas.
Com isso em mente, separamos três dicas simples – mas essenciais – para não violar o disposto na Lei 12.965/14, e garantir a segurança jurídica e o compliance digital da sua organização. Vamos a elas?
O Art. 7º do Marco traz que é um direito do usuário, e um dever das empresas que fornecem conexão, prestar informações claras e completas. Como segue:
VI – informações claras e completas constantes dos contratos de prestação de serviços, com detalhamento sobre o regime de proteção aos registros de conexão e aos registros de acesso a aplicações de internet, bem como sobre práticas de gerenciamento da rede que possam afetar sua qualidade;
Mas, e para os demais tipos de empresas? Se você tem um site, blog, aplicativo de celular, ou qualquer outra aplicação na internet, não precisará firmar um contrato com o usuário que navega na aplicação. Mas, vai precisar de um documento contendo os termos de uso, para formalizar essa relação.
O Art. 7º, inciso VII, deixa claro que esses termos de uso precisam trazer informações claras e completas sobre coleta, uso, armazenamento, tratamento e proteção dos dados pessoais dos usuários. Bem como, precisam estabelecer com que finalidade esses dados serão usados.
Por outro lado, se você vende serviços ou produtos pela internet, precisa ter ainda mais cuidado na redação e formalização do contrato – mesmo os contratos de adesão. Isso porque, ao infringir alguns termos da lei, esses contratos podem ser parcialmente anulados:
Art. 8º A garantia do direito à privacidade e à liberdade de expressão nas comunicações é condição para o pleno exercício do direito de acesso à internet.
Parágrafo único. São nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que violem o disposto no caput, tais como aquelas que:
I – impliquem ofensa à inviolabilidade e ao sigilo das comunicações privadas, pela internet; ou
II – em contrato de adesão, não ofereçam como alternativa ao contratante a adoção do foro brasileiro para solução de controvérsias decorrentes de serviços prestados no Brasil.
Além disso, as normas de defesa do consumidor seguem válidas no ambiente digital. Logo, relações e práticas abusivas, mesmo que mediadas pela internet, seguem submetidas às sanções previstas em regramentos como o Código de Defesa do Consumidor.
Uma dica simples para garantir a correta redação de todos os seus contratos é criar modelos-padrão e gerenciá-los por um software de contratos, como o Projuris Contratos. Assim, você garante que todas as cláusulas necessárias estarão presentes nesses documentos, e ainda tem mais controle na hora de armazenar e monitorar esses ativos.
Para conhecer como funciona a gestão de contratos no Projuris, agende uma demonstração:
Atualmente, os negócios precisam, cada vez mais, de internet de qualidade. Mas, não só isso. Além dos serviços de conexões, as empresas tem investido em serviços de hospedagem e armazenamento em nuvem, em softwares e sistemas de gestão, entre outras aplicações.
E, o Marco Civil da Internet – assim como a LGPD – são bastante rigorosos em relação à privacidade e segurança dos dados pessoais coletados. Por isso, cada vez mais, as empresas precisam se preocupar em contratar serviços de qualidade para armazenar e gerir os dados que coletam.
Mas, como fazer isso? Antes de contratar um novo sistema, aplicativo ou outro serviço ligado à internet e ao ambiente digital, lembre-se de se certificar sobre as opções de segurança que são oferecidas por esse fornecedor. Algumas perguntas que você pode fazer, são:
Como você já sabe, a privacidade e segurança de dados é um aspecto fundamental do Marco Civil da Internet, e deve ser observado por qualquer organização que esteja, de alguma forma, no ambiente virtual.
Por isso, para além de se preocupar com os fornecedores, o jurídico das empresas precisa também olhar para os processos internos de coleta e armazenamento dos dados captados em quaisquer aplicações de internet que a organização mantenha.
Quem cuida desses dados? Onde esses dados são armazenados? Os usuários têm acesso aos termos de uso do nosso site ou aplicativo? Há procedimentos padrão para garantir que apenas usuários que forneceram seu consentimento receberão comunicações da empresa?
Essas são perguntas simples que podem ajudar os gestores jurídicos no diagnóstico da conformidade da empresa frente ao Marco Legal da Internet.
Mas, mais do que isso, é importante usar esse diagnóstico para desenhar procedimentos padrão e estabelecer programas de compliance que contemplem as políticas da empresa na internet.
Só assim, é possível garantir que os direitos, deveres e garantias previstos na lei não serão infringidos.
A Lei 12.965/14, conhecida como Marco Civil da Internet, é a principal legislação federal em matéria de uso da internet no Brasil. Ela regula garantias, direitos e deveres para o uso da rede e estabelece diretrizes de responsabilização civil nesse ambiente.
O Marco Legal da Internet é regido por 8 princípios fundamentais, dispostos no Art. 3º da Lei. São eles:
– Princípio da garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento;
– Princípio da privacidade;
– Princípio da proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
– Princípio da neutralidade de rede;
– Princípio da estabilidade, segurança e funcionalidade da rede;
– Princípio da responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades;
– Princípio da preservação da natureza participativa da rede;
O Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14) estabelece, às empresas provedoras de conexão e de aplicações de internet, alguns deveres e obrigações. Dentre eles, está a proteção de dados pessoais, e a inviolabilidade da privacidade, intimidade e imagem dos usuários. Também estabelece requisitos para o registro e armazenamento de dados de conexão, por um ano (para provedores de conexão) e de dados de acesso a aplicações por seis meses (para provedores de aplicações).
Para além de oferecer direitos e garantias aos usuários, o Marco Civil da Internet também tem o mérito de apontar alguns princípios fundamentais, que devem nortear a presença e atuação de quaisquer agentes na internet.
Logo, fica claro que, mesmo as empresas que não atuam na área de telecomunicações, precisam conhecer e adequar sua presença digital às diretrizes dessa lei. Sua empresa está em conformidade com o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14)? Tenha essa questão em mente, e bom trabalho!
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