A purgação da mora é a quitação de uma dívida ou obrigação firmada entre as partes, após um período de atraso ou não execução. Veja prazos e impactos de purgar a mora.
A palavra “purgar”, na cultura popular, tem o sentido de “livrar-se” de algo ou alguém. Mas, no meio jurídico, o termo pode adquirir um sentido particular.
No dia a dia dos profissionais do direito, a purgação da mora é a regularização de um negócio jurídico que estava em desacordo com as condições contratuais.
Neste artigo, veja o que a legislação pátria traz quando o assunto é a mora e sua purgação. Confira também prazos e implicações legais de purgar a mora. Boa leitura!
Antes de conhecer em detalhes o significado da expressão “purgação da mora” é essencial entender qual o conceito jurídico de “mora”. E, para isso, é preciso primeiro entender a ideia por trás das obrigações, contraídas em um negócio jurídico.
Assim, a obrigação consiste na prestação e contraprestação formalizada em um negócio jurídico – por meio de instrumentos como o contrato – entre duas ou mais partes.
Nesse cenário, a mora é a não execução dessa obrigação, de maneira parcial ou total. Pode ser, ainda, a demora ou lentidão na concretização da prestação ou contraprestação.
A título de exemplo, imagine um contrato de prestação de serviço. Se a prestadora deixa de fazer o serviço, na quantidade, qualidade e prazo estabelecidos, estará em mora. Da mesma forma, se a contratante deixa de pagar pelo serviço na forma acordada, também poderá entrar em mora.
Para que se configure a mora, além disso, é preciso que pelo menos outras duas características estejam presentes. Na mora, pressupõe-se que o que é devido é algo útil e possível de ser executado, ainda que em atraso.
O verbo purgar significa limpar, purificar ou expiar algo. Assim, a purgação da mora nada mais é que a quitação de uma obrigação devida.
O exemplo mais comum de purgação da mora é aquele dos contratos onerosos em que a contraprestação se dá em valores monetários.
Isso ocorre quando alguém se compromete a pagar determinada quantia a outrem, em troca de um serviço, produto ou bem, por exemplo. E, em algum ponto dessa relação jurídica, deixa de fazer esse pagamento, estando então em situação mora. Quando a parte regulariza essa condição, considera-se que purgou a mora.
É o caso, por exemplo, dos contratos de locação. Enquanto uma parte cede o seu imóvel para uso comercial ou residencial, outra se compromete a pagar um valor periódico por esse uso.
Se o locatário deixar de pagar o aluguel conforme acordado no contrato de locação, ele estará em mora. A purgação da mora ocorrerá, assim, quando ele regularizar sua inadimplência.
Contudo, cabe ressaltar, a mora não é apenas uma condição do devedor, podendo também se aplicar ao credor, em um negócio jurídico. É o que veremos a seguir.
Na teoria do Direito, existem várias maneiras de classificar a mora. O jurista Rafael Medeiros Antunes Ferreira, por exemplo, classifica a mora pelo seu aspecto quantitativo, em total e parcial. E pelo olhar qualitativo, em termos absolutos ou relativos.
Embora esse tipo de classificação seja importante, quando o assunto é purgação de mora, um terceiro tipo de categorização merece especial atenção.
Ao estabelecer de quem é a responsabilidade pela purgação da mora, podemos classificá-la em:
Vejamos, então, o que isso significa?
A mora do devedor é o modelo mais comum. Aquele que primeiro vem à mente quando se pensa em mora.
Em termos práticos, a mora do devedor ocorre quando alguém, que se comprometeu a prestar algo a outrem, deixa de fazê-lo, voluntariamente.
Ou seja, deixa de pagar por um bem ou serviço, ou mesmo de prestar esse bem ou serviço, nos termos acordados em contrato.
A mora do credor é o oposto da modalidade apresentada acima. Neste caso, quem está em desacordo com a obrigação é justamente a parte que deveria receber a prestação.
Assim, a mora do credor ocorre quando ele (o credor) se coloca numa posição que impede ou dificulta o adimplemento do devedor, nos termos do contrato.
Logo, o que ocorre é que o credor deixa de cumprir com as condições que permitem ao devedor efetuar o pagamento ou cumprir com a obrigação acordada.
Por exemplo, se as condições de pagamento do contrato preveem que o depósito do valor devido será feito em uma conta bancária específica aberta pelo credor, e este deixa de abrir a conta ou de mantê-la aberta, tem-se a mora do credor.
Por fim, importa destacar que a ocorrência de mora do credor garante ao devedor o direito de não ser considerado em mora.
O principal dispositivo legal a conceituar a mora no Brasil é o Código Civil de 2002. É nele que encontra-se a seguinte definição:
Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.
Além de estabelecer o que é a mora, o CC ainda explícita o que não pode ser confundido com a mora, conforme segue:
Art. 396. Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em mora.
E, por fim, mas não menos importante, o Código Civil ainda tem o mérito de deixar claro como se dá a purga da mora. Isso fica explícito no Art. 401, onde se lê:
Art. 401. Purga-se a mora:
I – por parte do devedor, oferecendo este a prestação mais a importância dos prejuízos decorrentes do dia da oferta;
II – por parte do credor, oferecendo-se este a receber o pagamento e sujeitando-se aos efeitos da mora até a mesma data.
No que tange a purgação da mora por parte do devedor, o CC deixa claro que este deverá arcar com os prejuízos motivados pela mora, acrescidos de juros, com correção monetária, além, é claro, de o devedor arcar com os honorários advocatícios (Art. 395).
Por sua vez, também o credor em mora tem obrigações previstas pelo Código. Além de garantir isenção ao devedor cujo credor está em mora, o CC ainda obriga este último a ressarcir o primeiro em relação “as despesas empregadas em conservá-la, e sujeita-o a recebê-la pela estimação mais favorável ao devedor, se o seu valor oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação” (Art. 400).
Para além do delimitado no Código Civil, há um caso em específico que tem suscitado discussões no meio jurídico: a purgação da mora nas hipóteses em que ocorreu alienação fiduciária.
Primeiro, cabe relembrar o que é a alienação fiduciária. Na prática, trata-se de um tipo de garantia numa relação de negociação de compra de bens.
Assim, o devedor, para garantir o pagamento de algo, o transfere (aliena) para o credor enquanto paga por aquele bem. Neste caso, a garantia é o próprio bem que está sendo pago.
Agora, numa relação de alienação fiduciária, o que ocorre quando há mora? Isto é, quando o devedor deixar de pagar pelo bem em garantia? O pesquisador Leandro Moreira Valente Barbas assim resumiu o imbróglio legal que cerca essa questão:
A legislação referente à alienação fiduciária em garantia (Lei Federal 4.728/1965 – arts. 66 e seguintes – e Decreto-Lei 911/1969) apenas admitia a purgação da mora, em caso de atraso no pagamento das parcelas, se já tivesse sido pago no mínimo 40% do valor da dívida. A Lei Federal 10.931, em 2004, alterou tal legislação e excluiu o requisito do valor mínimo, permitindo que, após ser o bem alienado fiduciariamente retomado pelo credor por meio da ação de busca e apreensão, o devedor purgasse a mora pagando integralmente o valor da dívida ainda a quitar (art. 3º, §2º do Decreto-Lei 911/1969).
O debate jurídico, no entanto, não se encerrou com a Lei 10.931/04. Assim, sendo, em 2014, o STJ firmou a seguinte tese, em julgamento de recurso repetitivo (Tema 722/STJ):
Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária.
Não há um prazo único para purgação da mora. O período legal para fazê-lo vai variar de acordo com o negócio jurídico em que ocorreu a mora.
Para contratos de alienação fiduciária de bens móveis, após a execução da liminar de busca e apreensão, o devedor tem cinco dias para pagar a integralidade da dívida – conforme visto acima.
Já no caso de bens imóveis (casas, apartamentos, etc), a Lei Federal 9.514/97 estabelece que a purgação de mora deve acontecer no prazo de 15 dias após recebimento de intimação.
Importa ressaltar que, caso a purgação da mora não seja feita:
Está claro que os prazos para purgar a mora são bastante curtos, sobretudo quando o contrato envolve bens móveis, como motocicletas, automóveis, caminhões, e assim por diante.
Para pessoas físicas em contratos de alienação fiduciária, a recomendação óbvia é evitar o atraso no pagamento das obrigações contratuais. Já que, uma vez decretada a busca e apreensão, há apenas cinco dias para a purgação da mora.
Mas, e para as pessoas jurídicas que precisam gerir esses prazos? Quanto mais contratos desse tipo há, mais difícil é manter controle sobre o status de cada um, e sobre os prazos para que se purgue a mora.
Ao mesmo tempo, acompanhar esses prazos tem um impacto direto nas finanças e na situação administrativa e financeira da empresa.
A boa notícia é que, com o passar dos anos, anotações em papel e, até mesmo as planilhas, podem ser deixadas de lado para esse controle. Isso porque já há no mercado ferramentas mais eficientes.
É o caso, por exemplo, dos softwares jurídicos e softwares para contratos.
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Embora o conceito de purgação da mora parece simples, trata-se, na prática jurídica, de um instrumento que gera uma série de dúvidas e discussões entre os juristas.
Assim, abaixo, separamos duas situações excepcionais que motivam debate entre os pesquisadores da área:
Vejamos as implicações de cada uma delas.
Em teoria, a mora simultânea – também chamada de mora bilateral – ocorre quando tanto o devedor quanto o credor entram em mora, concomitantemente. Isto é, ambos deixam de cumprir com suas obrigações, simultaneamente.
Para a corrente de pensamento dominante entre os doutrinadores, o efeito prático da mora simultânea é a compensação, ou anulação das consequências de ambas as moras.
Assim, nenhuma das partes pode obter compensação por perdas ou danos, exigir juros, ou similares.
Já a mora sucessiva também exige que ambas as partes entrem em mora. Porém, neste caso, há uma diferença temporal entre a mora de um e de outro. Há, portanto, sucessão de moras.
Assim, a maior parte dos juristas concorda que tanto o credor como o devedor devem assumir as responsabilidades e compensações devidas pelos períodos em que estiveram em mora.
Como vimos, a mora consiste no não pagamento de uma dívida ou obrigação dentro dos parâmetros e condições estabelecidas em contrato. Mas, e quando esse contrato estabelece cláusulas abusivas?
Embora ainda seja uma questão controversa, a maior parte dos juristas concorda que, se as cláusulas do contrato são consideradas abusivas, ocorre a descaracterização da mora.
Contudo, cabe a análise caso a caso, uma vez que não há jurisprudência consolidada sobre o tema.
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A purgação da mora significa, simplesmente, fazer a quitação de um pagamento ou obrigação firmada em um negócio jurídico. A mora ocorre quando uma das partes deixa de cumprir com a obrigação, nas condições em que ela foi acordada.
Pelo Código Civil, o devedor, ao purgar a mora, deve pagar o valor devido (em atraso), além de arcar com eventuais prejuízos motivados pela mora, acrescidos de juros, correção monetária e eventuais honorários advocatícios.
Diante do exposto, fica claro que a purgação da mora é um recurso importante para evitar a completa quebra das obrigações contratuais e, em alguns casos, até mesmo evitar a perda de um bem móvel ou imóvel.
Assim, conhecer a legislação sobre o tema e usar ferramentas para monitorar as cláusulas sensíveis dos contratos, e seus respectivos prazos, pode levar o jurídico a um novo nível de confiança e credibilidade. Conte com a tecnologia para fazer isso!
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Texto muito bem elaborado, com abordagem na essência, ou seja, conceito claro e de fácil compreensão.