A rotulagem de alimentos, à primeira vista, pode parecer tarefa para as equipes de Design de Produto e Marketing. Mas, resoluções como a RDC nº259/2002, da Anvisa, mostram que esse item precisa ser preocupação também do departamento jurídico.
Na prática, irregularidades na rotulagem podem levar empresas de alimentos e bebidas a responder judicialmente, no âmbito dos Direitos do Consumidor e do Direito à Saúde.
Por isso, é tão importante que os advogados corporativos conheçam a RDC nº259, bem como, as demais leis e normas infralegais sobre o tema.
E é justamente sobre a legislação brasileira para a rotulagem de alimentos que falaremos neste artigo. Além de conhecer a letra da lei, você ainda verá como o jurídico pode ajudar a minimizar riscos e prevenir litígios. Fique conosco, e boa leitura!
RDC, sigla para Resolução da Diretoria Colegiada, é um tipo de regulamento técnico emitido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Por sua vez, a RDC nº259, publicada em setembro de 2002, é a resolução que regula a rotulagem de alimentos embalados no Brasil.
Na prática, a Anvisa é o órgão regulatório responsável pelo controle do registro, inspeção, fiscalização e monitoramento de riscos de quaisquer produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária. Isto inclui, por exemplo, medicamentos, agrotóxicos e, claro, alimentos e bebidas.
Por esse motivo, desde a sua fundação, em 1999, o órgão confeccionou uma série de RDCs. Nesse contexto, a RDC nº259 é uma das mais lembradas, uma vez que as determinações sobre o que é permitido ou não nos rótulos de alimentos embalados acaba por impactar grande parte da indústria alimentícia.
Leia tambem nosso guia completo sobre as RDC da Anvisa para o setor de alimentos e bebidas.
A priori, pode-se dizer que a RDC nº259 é aplicável a todos os alimentos embalados. Contudo, no texto do regulamento, encontra-se uma definição mais precisa sobre as características que determinam o que é um alimento embalado. Ali, lê-se:
O presente Regulamento Técnico se aplica à rotulagem de todo alimento que seja comercializado, qualquer que seja sua origem, embalado na ausência do cliente, e pronto para oferta ao consumidor.
Segundo a própria Anvisa, o consumidor pode ser tanto pessoa física quanto jurídica que faça a aquisição do produto alimentício. Além disso, a norma deixa claro que as condições técnicas especificadas no regulamento se aplicam exclusivamente aos produtos alimentícios embalados na ausência do cliente.
Essa diretriz permite interpretar que produtos embalados na presença do cliente – como grãos, farinhas e sementes vendidas a granel – não precisam cumprir as determinações da RDC nº259.
Contudo, há outras normas que regulamentam o Direito do Consumidor e impactam conjuntamente sobre a rotulagem dos alimentos. É sobre elas que falaremos a seguir.
A RDC é a norma técnica que melhor especifica quais informações podem constar – ou não – nos rótulos de produtos alimentícios. Contudo, há outras leis, normas infralegais e resoluções que também incidem sobre essa mesma matéria. Vejamos algumas delas.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) traz, na lista de direitos básicos do consumidor, a seguinte disposição:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[…]
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Como se sabe, a rotulagem de alimentos – da qual trata a RDC nº259/2002 da Anvisa – está diretamente relacionada ao fornecimento de informações sobre qualidade, quantidade, características e composição dos alimentos, indo ao encontro do que o CDC determina.
O Decreto-lei 986/69 institui normas básicas sobre alimentos e, apesar de ter sofrido alterações ao longo das últimas décadas, segue sendo um dos principais dispositivos legais, tanto para a indústria alimentícia quanto para a indústria de bebidas.
No que diz respeito à rotulagem de alimentos, o Decreto-lei 986/69 prevê uma série de informações que devem necessariamente constar nos rótulos – determinações essas que seguem vigentes.
À título de exemplo, é nesse dispositivo legal que se regulamenta o uso de expressões como “colorido artificialmente”, “contém aromatizante, “sabor artificial de…”, entre outros.
O texto legal traz ainda determinações para a rotulagem de alimentos enriquecidos, dietéticos, aditivados, entre outras categorias especiais.
Por fim, entre as principais adições ao Decreto-lei 986-69, no que diz respeito aos rótulos, tem-se:
A RDC nº429/20 merece menção, uma vez que é uma das mais recentes resoluções publicadas pela Anvisa acerca da rotulagem de alimentos.
A principal contribuição da RDC nº429 é o acréscimo da exigência de rotulagem frontal. Isto é, passa a vigorar a necessidade de incluir símbolos informativos, no painel principal do rótulo, com o intuito de orientar o consumidor quanto ao alto conteúdo de um determinado nutriente – como açúcares, gorduras e sódio.
A RDC 429 traz ainda novas regras para a disposição e o design da tabela nutricional obrigatória nos alimentos embalados.
Cabe destacar, no entanto, que a RDC nº429 e a RDC nº259 – objeto principal deste artigo – não são as únicas resoluções que tratam dos rótulos. Na prática, há exigências espalhadas por outras resoluções. Dentre as principais, mencionamos:
A RDC nº259 tem o mérito de ser a principal resolução técnica a centralizar as regras para rotulagem de alimentos embalados no Brasil. Abaixo, reunimos as principais determinações trazidas por essa norma.
A denominação de venda do alimento, segundo definição encontrada na própria RDC nº259/02, é um “nome específico e não genérico que indica a verdadeira natureza e as características do alimento”.
Para exemplificar, pense no leite condensado – um alimento embalado na ausência do consumidor e que, portanto, se enquadra na RDC nº259. Assim como outras categorias de produtos, a denominação do leite condensado está determinada em regulamentos específicos.
Neste caso, a regulamentação está contida na Instrução Normativa Nº 47, do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). Ali, tem-se que a denominação ou designação de venda do leite condensado pode variar entre:
Todas as quatro alternativas acima são possibilidades de denominação de venda do leite condensado.
O prazo de validade dos alimentos embalados deve conter o dia e mês para produtos que têm prazo igual ou inferior a três meses. Já para produtos com prazo superior a três meses, pode-se trazer apenas o mês e o ano de validade.
Além disso, a RDC nº259/02 também deixa claro quais tipos de produtos não precisam receber indicação de validade no rótulo. Dentre eles, encontram-se frutas e hortaliças frescas, vinhos e bebidas com percentual alcoólico superior a 10%, balas, caramelos e gomas de mascar, entre outros.
E, não menos importante, a resolução nº259 trata ainda de especificar regras para informar a validade daqueles alimentos que necessitam de condições especiais de armazenamento, como os congelados.
Pela RDC nº259, deve constar no rótulo do alimento, o número do lote e a origem do produto. No que se refere ao lote, a resolução deixa a cargo do fabricante a decisão sobre como numerar os lotes, desde que estes constem de modo legível na embalagem.
Já a origem é registrada na rotulagem por meio da razão social do fabricante, endereço completo, país de origem e município, bem como, número de registro ou código de identificação da empresa junto ao órgão competente. Neste último item se inclui, por exemplo, o número de Inscrição Estadual.
Ademais, nos produtos que são importados, é obrigatório que o rótulo inclua as informações da empresa importadora.
A lista de ingredientes não apenas é elemento obrigatório dos rótulos de alimentos embalados na ausência do consumidor, como também deve trazer a listagem em ordem crescente. Ou seja, do ingrediente presente em maior quantidade àquele presente em menor quantidade.
A RDC nº259, no entanto, deixa claro também que alguns alimentos em específico não precisam conter listagem de ingredientes. É o caso daqueles compostos por um único item, como farinha, açúcar, arroz, café, entre outros.
A RDC nº259 não estabelece, de forma clara e inequívoca, em quais produtos efetivamente se faz necessária a presença de instruções de preparo ou de uso. No entanto, especifica que as instruções servem para garantir a utilização correta do alimento.
Assim, dentre as instruções que podem estar contidas no rótulo, a resolução menciona orientações para reconstituição, descongelamento e tratamento do alimento pelo consumidor.
O conteúdo líquido se refere ao total, em litros ou quilogramas, do produto alimentício descontado o peso da embalagem.
Na prática, as empresas do setor de alimentos e bebidas precisam seguir os padrões do INmetro para aferição do conteúdo líquido.
Assim como serve para estabelecer o que é obrigatório, a RDC nº259 também trata de deixar claro o que é proibido na rotulagem de alimentos. As proibições visam, sobretudo, proteger o Direito do Consumidor, na tentativa de evitar que ocorra indução ao erro na hora da compra.
Por conta disso, as proibições merecem quase tanta atenção quanto às informações obrigatórias. Isso ocorre porque, muito frequentemente, a presença de uma informação proibida no rótulo da embalagem pode levar a sanções.
A Resolução nº259 traz claramente que:
Os alimentos embalados não devem ser descritos ou apresentar rótulo que:
a) utilize vocábulos, sinais, denominações, símbolos, emblemas, ilustrações ou outras representações gráficas que possam tornar a informação falsa, incorreta, insuficiente, ou que possa induzir o consumidor a equívoco, erro, confusão ou engano, em relação à verdadeira natureza, composição, procedência, tipo, qualidade, quantidade, validade, rendimento ou forma de uso do alimento;
Assim, até mesmo imagens e ilustrações são passíveis de infringir a regra, quando podem ter o efeito de induzir o consumidor a erro ou equívoco.
Assim, tomando como exemplo novamente o caso do leite condensado, não há impedimento legal para que se comercialize produto alimentício cuja denominação de venda é “mistura láctea condensada de leite e amido”, por exemplo.
A infração ocorre apenas se o rótulo e embalagem do alimento comprovadamente induzirem o consumidor a pensar que está comprando outro produto – como um leite condensado tradicional, por exemplo.
Aqui, a RDC nº259/2002 traz, em seu item 3.1, que a rotulagem do alimento não pode permitir que se:
b) atribua efeitos ou propriedades que não possuam ou não possam ser demonstradas;
f) indique que o alimento possui propriedades medicinais ou terapêuticas;
g) aconselhe seu consumo como estimulante, para melhorar a saúde, para prevenir doenças ou com ação curativa.
Assim, a título de exemplo, um iogurte ou bebida láctea fermentada não poderá indicar, no rótulo, quaisquer propriedades terapêuticas ou preventivas contra a constipação intestinal – a não ser que comprovadamente o tenha.
Ainda no item 3.1 da Resolução nº259/2001, encontram-se duas hipóteses de proibição, para os casos em que se dá destaque a um componente ou elemento inerente ao produto. Fica proibido, in verbis:
c) destaque a presença ou ausência de componentes que sejam intrínsecos ou próprios de alimentos de igual natureza, exceto nos casos previstos em Regulamentos Técnicos específicos;
d) ressalte, em certos tipos de alimentos processados, a presença de componentes que sejam adicionados como ingredientes em todos os alimentos com tecnologia de fabricação semelhante;
Assim, fabricantes e produtores não podem destacar que determinado alimento é zero açúcar se ele é naturalmente encontrado dessa forma.
Tampouco, podem destacar que determinado produto alimentício possui ovos, por exemplo, se os métodos de fabricação mais populares no mercado trazem, necessariamente, a presença de ovos.
Mais uma vez, portanto, se nota uma tentativa de impedir que determinadas características da composição do alimento sejam utilizadas como uma vantagem comercial frente aos concorrentes, quando efetivamente não o são.
A Lei 6.437/77, , traz a seguinte pena para as ocorrência de erro ou irregularidade na rotulagem de alimentos:
XV – rotular alimentos e produtos alimentícios ou bebidas bem como medicamentos, drogas, insumos farmacêuticos, produtos dietéticos, de higiene, cosméticos, perfumes, correlatos, saneantes, de correção estética e quaisquer outros contrariando as normas legais e regulamentares:
pena – advertência, inutilização, interdição, e/ou multa;
A pena mais comumente aplicada é a multa, eventualmente acompanhada da exigência de recolhimento do produto das prateleiras. Sanções administrativas, por parte dos órgãos reguladores, também integram o pacote de possibilidades de penalização.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor tem sido utilizado para fundamentar ações em caso de rotulagem incorreta dos alimentos.
Nesse sentido, tem-se precedentes para ações de dano moral, dano moral coletivo, propaganda de alimentos em desacordo com a lei, delito contra as relações de consumo, entre outras tipificações.
Em resumo, portanto, questões de Direito do Consumidor e Direito à Saúde Pública entram no pleito quando se trata de rotulagem de alimentos.
O grande volume de processos judiciais é uma preocupação na maioria das empresas de alimentos e bebidas, sobretudo no que diz respeito a ações de Direito do Consumidor.
Além de exigir investimentos de tempo e equipe jurídica, esse passivo contencioso ainda causa prejuízo financeiro direto à empresa, seja pela aplicação de multas, seja pela necessidade de recolhimento ou substituição dos produtos, seja pelo dano à imagem pública da companhia.
Nesse contexto, há duas ações principais para evitar o aumento do passivo contencioso:
A boa notícia é que, para ambas as ações, já há soluções tecnológicas capazes de ajudar o jurídico.
No primeiro caso, é possível centralizar todo o recebimento de demandas de análise jurídica em um único local, e toda a comunicação em um único canal. Assim, o relacionamento com os outros times responsáveis pelos rótulos fica facilitado.
Um exemplo de ferramenta desse tipo é o módulo de Requisições, do Projuris Empresas. Com ele, o departamento jurídico padroniza o recebimento de demandas, mantém SLAs (tempos de resposta) pré-definidos, além de ter histórico e controle sobre as decisões tomadas internamente.
No que se refere a redução da judicialização, é possível se adiantar aos processos judiciais com ferramentas de monitoramento de tribunais. Com o módulo de Distribuição do Projuris Empresas, por exemplo, sua empresa pode ser notificada sobre litígios ainda sem número, em distribuição nos tribunais.
Com isso, você ganha tempo para preparar sua defesa, ou tentar um acordo. Para ver como essas soluções funcionam na prática, agende uma demonstração.
Tecnologia para a gestão do compliance jurídico de demandas como contratos, atos societários, contencioso e diversos outros temas corporativos.
O Compliance é a área da empresa que se preocupa com a manutenção da conformidade legal e incentiva a governança corporativa da empresa. De modo geral, isso é feito por meio do estabelecimento de planos e políticas internas de compliance.
Contudo, a manutenção da conformidade legal das empresas de alimentação e bebidas fica prejudicada quando os produtos alimentícios – resultado da atividade-fim da organização – chegam até o consumidor final com erros e irregularidades.
Assim, ao desenvolver políticas de compliance, é importante que o jurídico considere não apenas questões de compliance trabalhista, ambiental ou de compliance de contratos.
É necessário olhar também para o compliance relacionado à produção e divulgação dos produtos. Treinar as equipes envolvidas e estabelecer diretrizes jurídicas claras para o desenvolvimento de embalagens e rótulos são apenas algumas das ações que o jurídico pode tomar, nessa frente de atuação.
A RDC 259 é uma Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa, publicada em 2002, com o intuito de regular a rotulagem de alimentos embalados na ausência do consumidor. Entre outras coisas, a RDC determina quais informações são obrigatórias nos rótulos de alimentos, e quais são proibidas.
O item 5 da Resolução 259/2002 traz a seguinte lista de informações obrigatórias, para a rotulagem de alimentos embalados:
– Denominação de venda do alimento
– Lista de ingredientes
– Conteúdos líquidos
– Identificação da origem
– Nome ou razão social e endereço do importador, no caso de alimentos importados
– Identificação do lote
– Prazo de validade
– Instruções sobre o preparo e uso do alimento, quando necessário
A RDC nº259/2002, como você viu, é uma das principais resoluções técnicas para a rotulagem de alimentos no Brasil. Contudo, fica evidente que as normas para a indústria de alimentos e bebidas estão espalhadas por uma série de outros dispositivos legais.
Além disso, órgãos regulatórios, como a Anvisa, têm atribuição para emitir novas resoluções técnicas a qualquer momento. Com isso, fica ainda mais evidente a necessidade de que os departamentos jurídicos desse setor mantenham-se em constante atualização.
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