Direito Trabalhista

Reforma Trabalhista: trabalho insalubre por gestantes e lactantes

Em maio de 2019 julgou a inconstitucionalidade de norma que permite o trabalha de gestantes e lactante em condições insalubres. Contudo, inicialmente, são necessárias algumas considerações a respeito do que é o trabalho insalubre. Assim, pode-se adentrar, posterior e especificamente, no tema deste artigo. E discutir, enfim, os direitos da gestante e lactante e a possibilidade de labor nessas condições, discussão levantada com a Reforma Trabalhista.

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O que é o trabalho insalubre?

Para saber, as regras atinentes ao trabalho em condições insalubres possuem tamanha relevância que estão previstas em seção própria. Estão dispostas, dessa maneira, na seção XIII da Consolidação das Leis do Trabalho.

E são disciplinadas pelo art. 189 e seguintes do referido diploma legal. Desse modo, dispõe o artigo:

Art. 189 – Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.

Atividades insalubres

As atividades consideradas insalubres estão elencadas na Norma Regulamentadora 15, comumente conhecida como NR-15, e tratam das atividades que expõem o empregado a agentes nocivos à saúde acima dos parâmetros legais permitidos, seja por sua natureza, intensidade ou pelo tempo de exposição.

Exemplificando, é o caso de ambientes de trabalho com exposição a ruídos intensos, calor, frio, elevado nível de umidade, radiação, agentes químicos e biológicos acima do limite de tolerância e poeiras minerais.

Grau de insalubridade

As atividades consideradas insalubres são divididas em graus:

  • máximo;
  • médio; e
  • mínimo.

E geram, dessa forma, ao empregado o direito de percepção de adicional em sua remuneração, no percentual, respectivamente, de:

  • 40% (quarenta por cento);
  • 20% (vinte por cento); ou
  • 10% (dez por cento).

Trabalho em condições insalubres, direitos da gestante e lactante e Reforma Trabalhista

Anteriormente ao advento da Lei 13.467/2017, mais conhecida como Reforma Trabalhista, o trabalho em condições insalubres era vedado para mulheres grávidas ou em período de amamentação. E ia ao encontro com dispositivo da Constituição Federal, portanto. A Constituição de 1988 prevê, assim, em seu artigo 6º, a proteção à maternidade e às crianças, incluindo-se os nascituros. É, desse modo, a sua redação:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (G.N.).

Há na CLT seção específica (V) para a regulamentação dos direitos e proteção à maternidade. E neste sentido, até a vigência da reforma trabalhista, era previsto no artigo 394-A a proibição de trabalho em condições insalubres por mulheres gestantes ou em período de amamentação:

Art. 394-A. A empregada gestante ou lactante será afastada, enquanto durar a gestação e a lactação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres, devendo exercer suas atividades em local salubre.

Ou seja, verifica-se que na redação antiga da CLT havia previsão expressa de que a empregada que estivesse grávida ou em período de amamentação, deveria, obrigatoriamente, ser realocada para exercer suas atividades em local salubre.

Possibilidade de labor da gestante em condições insalubres conforme a Reforma Trabalhista

O fato é que a Lei 13.467/2017 contrariou o artigo supracitado. E trouxe, assim, a possibilidade de labor em condições insalubres por grávidas e lactantes nas atividades tipificadas em graus mínimo e médio. Excluiu-se, portanto, apenas as atividades insalubres em grau máximo. A referida norma considerou, igualmente, a possibilidade de afastamento da empregada nos casos em que houver atestado de saúde emitido por médico de confiança da mulher, que recomende seu afastamento. Vejamos, então:

Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:

  1. atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação;
  2. atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;
  3. atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação.

Inconstitucionalidade do art. 394-A da CLT?

Nota-se, logo, que a novidade trazida pela Reforma Trabalhista fere diretamente dispositivo Constitucional. E suprime, desse modo, direitos sociais indisponíveis como o do caso em voga. Um dos pontos mais polêmicos da Reforma fora justamente esse, já que anteriormente à sua promulgação, a CLT dispunha de forma totalmente contrária. Garantia, dessa forma, a proteção à maternidade. E e vedava, por fim, o trabalho em condições insalubres pela gestante, justamente no intuito de resguardar a empregada grávida e a formação do feto.

Importa ressaltar ainda, que as normas contidas na CLT visam exatamente garantir a proteção do trabalhador, em especial a seção V que determina a proteção à maternidade. Isto nos remete, sem sombra de dúvidas, a um retrocesso e uma usurpação aos direitos humanos das trabalhadoras, dos nascituros e recém-nascidos.

MP 808/2017 e as alterações no art. 394-A, CLT

Logo após a promulgação da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), surgiu a medida provisória 808/2017. A MP previa, dentre outras alterações, a mudança do conteúdo do artigo 394-A.

Exercício de atividades insalubres em grau médio e mínimo pelas gestantes com atestado de saúde

Todavia, embora a MP possuísse aspectos positivos, não tinha o condão de “reparar” o disposto no referido artigo. Determinava o afastamento da trabalhadora grávida das atividades insalubres, excluindo nesses casos o adicional pertinente. Mas, por outro lado, possibilitou o exercício de atividades insalubres em grau médio ou mínimo pelas gestantes que apresentassem atestado de saúde emitido por médico de sua confiança. Segue abaixo, então, o texto com alteração para comparação e análise:

Art. 394-A. A empregada gestante será afastada, enquanto durar a gestação, de quaisquer atividades, operações ou locais insalubres e exercerá suas atividades em local salubre, excluído, nesse caso, o pagamento de adicional de insalubridade.

§ 2º O exercício de atividades e operações insalubres em grau médio ou mínimo, pela gestante, somente será permitido quando ela, voluntariamente, apresentar atestado de saúde, emitido por médico de sua confiança, do sistema privado ou público de saúde, que autorize a sua permanência no exercício de suas atividades.

§ 3 º A empregada lactante será afastada de atividades e operações consideradas insalubres em qualquer grau quando apresentar atestado de saúde emitido por médico de sua confiança, do sistema privado ou público de saúde, que recomende o afastamento durante a lactação.” (NR) O ônus de proteção aos direitos sociais aqui em questão, é finalidade do Estado, a fim de garantir-se o cumprimento da Carta Magna e a aplicação dos direitos humanos e sociais das mulheres e crianças, resguardando-se a saúde das trabalhadoras e recém-nascidos.

Perda da eficácia da MP 808/2017

A meu ver, o problema da MP foi justamente o fato de excluir o adicional remuneratório. Mas também de autorizar o labor nas atividades de grau médio e mínimo quando apresentado atestado pela obreira. Ora, é de conhecimento que a massiva população recebe salários baixíssimos. Nesse viés, portanto, seria razoável que a trabalhadora que recebia o adicional pela atividade exercida não quisesse perdê-lo. E acabasse, dessa maneira, até por negligenciar sua saúde e do próprio nascituro apresentando atestado apenas no intuito de não diminuir sua remuneração.

O que importa, contudo, é que a MP 808/2017 não foi convertida em lei e perdeu sua eficácia em 23/04/2018. Retornou, assim, a permissão do trabalho insalubre por gestantes nos graus médios e mínimos, independentemente da apresentação de atestado e, sem prejuízo do adicional respectivo.

Decisão do STF e declaração de inconstitucionalidade do art. 394-A, CLT

Em 30 de abril de 2019, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, em decisão extremamente assertiva, declarou, enfim, a inconstitucionalidade do artigo 394-A da CLT e suspendeu a possibilidade do trabalho em condições insalubres, em qualquer grau, por gestantes ou lactantes, independentemente de atestado médico, em razão da proteção à maternidade e à criança garantida pela Constituição Federal.

A decisão do Ministro trouxe eficácia à redação anterior à Reforma. E amparou, desse modo, a proibição do trabalho insalubre por grávidas e mães lactantes, já suspensa pela Lei 13.467/2017.

Decisão liminar do STF sobre o trabalho da gestante e da lactante em condições insalubres

Necessário salientar que a decisão supramencionada possui caráter liminar em Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos. Esta foi a primeira decisão da Corte, ainda que em caráter provisório, que contraria a Reforma Trabalhista.

Nos termos da redação do 394-A da CLT, conforme anteriormente mencionado, o afastamento das trabalhadoras gestantes ocorreria apenas quando apresentado atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação.

O Ministro fundamentou sua decisão no sentido de que a proteção da mulher grávida ou da lactante no que diz respeito ao trabalho em condições insalubres caracteriza-se como direito social protetivo tanto da mulher quanto da criança:

A proteção à maternidade e a integral proteção à criança são direitos irrenunciáveis e não podem ser afastados pelo desconhecimento, pela impossibilidade ou pela própria negligência da gestante ou lactante em juntar um atestado médico, sob pena de prejudicá-la e prejudicar o recém-nascido.

Com a decisão, o Ministro Moraes proibiu o trabalho em condições insalubres por gestantes ou lactantes e tornou sem efeito o trecho da lei. Isto, torna, então, obrigatório o afastamento da gestante de atividades insalubres de qualquer grau. Para o ministro “a proteção da mulher grávida ou da lactante em relação ao trabalho insalubre, caracteriza-se como importante direito social instrumental protetivo tanto da mulher quanto da criança”.

Declaração de inconstitucionalidade da norma da Reforma Trabalhista

Agora, em 29 de maio de 2019 o Supremo declarou inconstitucional a norma da Reforma Trabalhista que permitia o trabalho em condições insalubres por gestantes, aprovada no governo de Michel Temer. O plenário acompanhou o voto do Ministro Alexandre de Moraes. E vetou , por 10 votos a 1, vencido apenas o Ministro Marco Aurélio, a permissão de trabalho insalubre por mulheres grávidas ou lactantes, independentemente do grau de insalubridade.

Um dos argumentos apresentados em plenário foi justamente a probabilidade das trabalhadoras de pouca renda não buscarem um médico e continuarem exercendo suas funções em condições insalubres, a fim de não perder o adicional de insalubridade acarretando em diminuição da sua remuneração, conforme mencionado anteriormente:

Sabidamente, são muitas, senão a maioria, as trabalhadoras de baixa renda e de pouca escolaridade que, ante a possibilidade de perda da remuneração a título de adicional de insalubridade, deixarão de procurar um médico para continuarem trabalhando em condições insalubres, comprometendo não só a sua saúde, mas, também, a saúde dos nascituros e dos recém-nascidos.

A referida decisão confirma a liminar anteriormente concedida por Moraes. E constitui a primeira decisão que derruba ponto da Reforma Trabalhista aprovada em 2017. Na prática, a decisão proíbe o trabalho em condições insalubres por gestantes ou mulheres em fase de amamentação. E isto em qualquer grau de insalubridade.

Assim, observa-se que a decisão da Suprema Corte corrobora com o disposto na Constituição Federal. Ademais, garante efetividade e proteção dos direitos humanos e sociais. E zela, especialmente neste caso, pela saúde da trabalhadora gestante e das futuras crianças.

Fontes

  • http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm
  • http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=5938&processo=5938
  • http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Mpv/mpv808.htm
  • http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI5938EmentaeVOTO.pdf

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  • Rafaela, excelente seu texto. Muito explicativo, mostrando a trajetória de todas as decisões. Estou passando por esta situação no momento atual e seu texto foi de grande valia. Só não ficou claro para mim, porém se com a inconstitucionalidade do texto as gestantes continuam recebendo o adicional de insalubridade ou se a empresa está isenta do pagamento a partir da notificação da gravidez e afastamento do ambiente insalubre. A saber, sou supervisora de laboratório e continuo executando todas as atividades atribuídas à minha função, porém só estou realizando a partir de uma sala onde não tenho contato com agentes tóxicos. Vou perder a insalubridade neste período?

  • Olá gostaria de saber ,pois trabalho em cinema estou de 4meses de gestação ,e no espaço em q trabalho uso produtos químicos pra lavar os banheiros e limpeza de chão,porém existe um odor muito forte dos encanamentos de esgoto do shopping inteiro q passam por ali então o cheiro fica ali o dia todo normalmente eu vô para no hospital por dor de cabeça e fico em observação .
    Como posso fazer pra esclarecer como agir dessa maneira .desde quando a empresa soube da gravidez eu continuo fazendo as mesma coisas q fazia antigamente?

  • Bom dia.Gostaria de saber até quando a profissional lactantes deve ser afastada do serviço insalubre.somente 6 meses devido amamentação exclusiva ou mais tempo????

    • Oi, Priscilla, tudo bem?

      Estou em busca de jurisprudência acerca do tema e confirmar a resposta, porque, na legislação, somente há menção ao período de seis meses para a lactação.

      Abraços