A partir de maio de 2025, todas as empresas no Brasil terão um novo compromisso: avaliar e reduzir os riscos psicossociais no trabalho. A mudança faz parte da atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em agosto de 2024, e reforça a importância da saúde mental no ambiente corporativo.
Isso significa que fatores como pressão por metas, carga excessiva de trabalho e assédio não podem mais ser ignorados e que as empresas terão a responsabilidade de acompanhar esses riscos e adotar medidas para preveni-los. Mas, na prática, o que muda?
Neste artigo, explicamos as principais atualizações e como garantir um ambiente de trabalho mais saudável para todos.
O que são riscos psicossociais no trabalho?
Os riscos psicossociais no trabalho estão ligados à forma como as tarefas são organizadas, ao relacionamento entre colegas, à liderança e à cultura da empresa. Diferente dos riscos físicos, como acidentes ou problemas ergonômicos, esses fatores podem afetar diretamente a saúde mental e emocional dos trabalhadores, influenciando seu bem-estar, motivação e produtividade.
Principais fatores de risco psicossocial no trabalho
- Carga excessiva de trabalho: exigir que trabalhadores cumpram prazos irreais ou lidem com um volume excessivo de tarefas aumenta os níveis de estresse e favorece a exaustão mental, podendo levar a quadros de burnout.
- Metas inalcançáveis: a cobrança por objetivos desproporcionais à capacidade de execução pode gerar ansiedade, insegurança e frustração, afetando tanto a produtividade quanto a autoestima dos profissionais.
- Assédio moral e sexual: comentários depreciativos, humilhações, ameaças veladas ou explícitas e qualquer tipo de conduta abusiva dentro do ambiente de trabalho podem causar sofrimento psicológico e configurar violação de direitos, sujeitando a empresa a sanções trabalhistas e indenizações.
- Clima organizacional tóxico: problemas recorrentes na comunicação, ausência de suporte da liderança, competição excessiva e conflitos constantes criam um ambiente hostil, prejudicando o engajamento e a cooperação entre as equipes.
- Falta de autonomia: quando os trabalhadores não têm margem para tomar decisões ou controlar sua própria rotina de trabalho, podem se sentir desmotivados e frustrados, o que afeta sua produtividade e bem-estar.
- Falta de reconhecimento: o não reconhecimento do esforço e das conquistas profissionais pode gerar insatisfação, desmotivação e desengajamento, aumentando a rotatividade dentro da empresa.
Do ponto de vista jurídico, ignorar esses riscos pode trazer consequências sérias para a empresa. Além do aumento do número de faltas e da rotatividade de funcionários, há riscos ainda maiores. Neste sentido, se for comprovado que um ambiente de trabalho nocivo contribuiu para o desenvolvimento de doenças ocupacionais ou sofrimento psicológico, a empresa pode ser responsabilizada judicialmente, podendo arcar com indenizações por danos morais.
Com a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), a avaliação desses riscos se tornou obrigatória. Isso reforça a necessidade de ações preventivas e corretivas para garantir um ambiente de trabalho mais seguro e saudável, reduzindo potenciais impactos legais e melhorando o bem-estar dos trabalhadores.
O que são as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho?
As Normas Regulamentadoras (NRs) são regras criadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para garantir ambientes de trabalho mais seguros e saudáveis. Elas existem desde 1978, quando foram publicadas pela Portaria nº 3.214, e servem para orientar tanto empregadores quanto trabalhadores sobre seus direitos e deveres na prevenção de acidentes e doenças ocupacionais.
Com o tempo, as NRs foram sendo atualizadas para acompanhar as mudanças no mundo do trabalho. Nesse sentido, considerando o crescimento de doenças ocupacionais relacionadas com problemas de saúde mental, pela primeira vez a avaliação dos riscos psicossociais entra na lista de exigências.
Como prevenir os riscos psicossociais no trabalho
O Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), previsto na NR-1 (item 1.5.3.1.1), é uma ferramenta muito importante para garantir um ambiente de trabalho mais seguro e bem estruturado. Ele define diretrizes para identificar, controlar e reduzir riscos, protegendo trabalhadores, a organização e até o meio ambiente. Mais do que uma exigência legal, o PGR fortalece a cultura de prevenção e reduz impactos antes que se tornem problemas maiores.
A atualização da NR-1 exige que todas as empresas avaliem os riscos psicossociais e incluam no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), de acordo com o que determina a Portaria nº 1.449, publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego em agosto de 2024.
Isso significa que os empregadores precisam estruturar um plano de controle e monitoramento desses riscos, garantindo um ambiente de trabalho mais equilibrado e seguro. O Programa de Gerenciamento de Riscos deve conter:
- Inventário de Riscos: levantamento detalhado dos riscos psicossociais, considerando fatores como carga de trabalho, relações interpessoais e suporte organizacional.
- Plano de Ação: estratégias para reduzir ou eliminar os riscos identificados, com medidas como adequação da jornada, implementação de canais de denúncia e treinamento de gestores.
- Monitoramento contínuo: acompanhamento periódico das ações adotadas para garantir a efetividade das medidas preventivas e corretivas.
Para fiscalizar o cumprimento da norma, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) conduzirá a fiscalização, analisará documentos, entrevistará funcionários e inspecionará as instalações. No contexto dos riscos psicossociais, setores com alto índice de afastamentos por transtornos mentais, como teleatendimento, bancos e estabelecimentos de saúde, terão prioridade na fiscalização.
O impacto da cultura organizacional na gestão dos riscos psicossociais
A gestão dos riscos psicossociais no trabalho não pode ser apenas uma obrigação legal. Para que a adaptação às novas exigências da NR-1 funcione, a cultura organizacional precisa refletir um compromisso real com a saúde mental dos trabalhadores. Empresas que apenas cumprirem a norma sem realizar mudanças estruturais, correm o risco de não atingirem os resultados esperados pelo programa.
Por isso, criar um ambiente seguro exige ações concretas. O primeiro passo é identificar os riscos psicossociais por meio de pesquisas de clima, entrevistas estruturadas e análise de indicadores, como afastamentos por transtornos psicológicos. Esses dados ajudam a entender os principais gatilhos de estresse e sobrecarga na empresa.
A partir desse diagnóstico, a empresa deve implementar medidas preventivas. Criar canais de denúncia para combater assédio, estimular o equilíbrio entre vida pessoal e profissional e oferecer suporte psicológico são algumas das principais iniciativas. Além disso, treinamentos periódicos também garantem que a prevenção seja contínua.
O monitoramento dos impactos dessas ações também é essencial, pois a NR-1 exige que além de uma abordagem estruturada a empresa apresente resultados baseados em dados concretos. Nesse sentido, psicólogos do trabalho, médicos ocupacionais e especialistas em segurança do trabalho se tornam fundamentais para planejar e executar as ações. Além disso, a assessoria jurídica também é essencial para garantir conformidade legal.
E quais são as penalidades em caso de descumprimento da NR-1?
O não cumprimento das exigências da NR-1 pode gerar sanções administrativas, financeiras e jurídicas, impactando diretamente as operações da empresa. As consequências variam conforme a gravidade da infração e podem incluir multas, interdições e até processos trabalhistas.
1. Multas e autuações
A ausência de um Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) adequado pode levar à aplicação de multas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os valores variam conforme o porte da empresa e a gravidade da infração, conforme a NR-28, que estabelece os critérios para penalidades relacionadas às normas regulamentadoras. Empresas reincidentes podem ser submetidas a fiscalizações mais rigorosas, elevando os riscos de novas autuações.
2. Embargo ou interdição de atividades
Caso a fiscalização constate risco grave e iminente à saúde dos trabalhadores, a empresa pode sofrer embargo ou interdição, conforme previsto na NR-3. Isso significa que as atividades podem ser suspensas parcial ou totalmente até que as irregularidades sejam corrigidas, gerando prejuízos operacionais significativos.
3. Processos trabalhistas e indenizações
Funcionários que se sentirem prejudicados por falhas no gerenciamento de riscos podem ingressar com ações trabalhistas, alegando danos morais e materiais. O não cumprimento das normas de segurança pode resultar em indenizações determinadas pela Justiça do Trabalho, além do risco de condenação por responsabilidade civil da empresa com base no artigo 7º, inciso XXII, da Constituição Federal, que assegura a redução dos riscos ocupacionais.
4. Reconhecimento de doença ocupacional
Transtornos psicológicos causados pelas condições de trabalho podem ser reconhecidos como doenças ocupacionais, conforme o artigo 20, inciso II, da Lei nº 8.213/1991. Isso pode acarretar:
- Afastamento pelo INSS, com concessão do auxílio-doença acidentário (B91).
- Estabilidade provisória de 12 meses após o retorno ao trabalho.
- Em casos graves, direito à aposentadoria por invalidez ou até mesmo pensão vitalícia, caso fique comprovada a incapacidade permanente.
5. Inclusão em cadastros de empregadores infratores
O Ministério do Trabalho e Emprego pode incluir no Cadastro de Empregadores empresas que repetidamente descumprem normas de segurança e saúde no trabalho, conforme a Portaria MTP nº 4.334/2021. Além disso, essas empresas podem entrar em outros registros de infrações trabalhistas, afetando sua reputação e acesso a benefícios fiscais. Isso prejudica sua reputação, dificulta a obtenção de incentivos fiscais e pode impactar negativamente contratos com clientes e fornecedores.
Conclusão
A avaliação dos riscos psicossociais no trabalho, obrigatória a partir de maio de 2025, marca um avanço na proteção da saúde mental dos trabalhadores. Com a atualização da NR-1, as empresas devem adotar medidas concretas para prevenir assédio, sobrecarga e outros fatores que impactam o bem-estar e a produtividade.
Mais do que uma obrigação legal, essa mudança exige uma gestão estruturada e preventiva. Implementar um Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) eficaz, capacitar lideranças e oferecer suporte psicológico ajudam a reduzir afastamentos, melhorar o clima organizacional e fortalecer a retenção de talentos.
O descumprimento da norma pode gerar penalidades severas, como multas, interdições e processos trabalhistas. Para evitar riscos operacionais e jurídicos, as empresas devem contar com especialistas, como psicólogos ocupacionais, médicos do trabalho e assessoria jurídica.