O Supremo Tribunal Federal, no ano de 2019, em julgamento do leading case ARE 1216078 RG, de relatoria do Ministro Dias Toffoli. E fixou, assim, o Tema 1062, com repercussão geral, nos seguintes termos:
Os estados-membros e o Distrito Federal podem legislar sobre índices de correção monetária e taxas de juros de mora incidentes sobre seus créditos fiscais, limitando-se, porém, aos percentuais estabelecidos pela União para os mesmos fins.
Conforme acórdão já transitado em julgado, a questão debatida nos autos envolvia a apreciação da definição constitucional acerca da competência legislativa concorrente prevista no art. 24, inciso I, da Constituição Federal.
Nesse sentido, decidiu-se que, nos casos de existência de normas gerais legisladas pela União, as mesmas possuiriam caráter superveniente, suspendendo a eficácia das leis locais sobre os mesmos assuntos que contenham regramento divergente, nos termos do § 4º do artigo 24 da carta magna.
Diante isso, aplicando-se tal entendimento ao caso da demanda e de acordo com trecho do voto do ministro relator, entendeu-se que:
Especificamente quanto à matéria relacionada a índices de correção monetária e taxas de juros de mora aplicáveis a créditos fiscais, por se tratar de matéria financeira devidamente regulada pela União, os demais entes somente podem exercer validamente sua competência suplementar nos limites estabelecidos pela legislação federal. (p.5)
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Nesse cenário, após a fixação do Tema 1062, diversos estados brasileiros se encontram, então, em desconformidade com o entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal. Isto porque a previsão em seus regramentos tributários estaduais institui índices de correção monetária e taxas de juros, aplicados aos créditos tributários pagos após o vencimento, superiores aos limites estabelecidos pela legislação federal.
Insta ressaltar que, quando se mencionam os limites estabelecidos pela legislação federal em relação aos índices monetários, tem-se que a norma superveniente com a disposição de tal limite será o art. 30 da Lei Federal 10.522/2002.
Dessa forma, com a decisão do STF, não apenas os débitos de qualquer natureza para com a Fazenda Nacional, bem como os inscritos em Dívida Ativa da União, passam a ter como referencial de atualização a taxa Selic, mas também os débitos fiscais para com as Fazenda Estaduais terão como limite o referencial de correção a taxa Selic.
Estabelecido tal raciocínio, enfim, a questão principal é: quais são os impactos da taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia) sobre os créditos tributários no estado de Goiás?
Conforme mencionado alhures, diversos estados do país possuem Códigos Tributários com a estipulação de índices monetários específicos que ultrapassam os limites estabelecidos pelo Supremo para a atualização de créditos fiscais vencidos. Entre eles, então, está o estado de Goiás. Entre os estados que efetivaram a harmonização dos índices entre sua legislação estadual e a decisão do STF estão: São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina.
No Código Tributário do Estado de Goiás, Lei nº 11.651/91, há a previsão de que seus créditos tributários e multas previstas na legislação tributária sejam corrigidos através do índice IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna), acrescentando-se o percentual de 0,5 ao mês a título de juros de mora sobre o valor atualizado do tributo devido, nos termos dos artigos 167, 168 e 170 do referido regramento.
Nesse sentido, a Fundação Getúlio Vargas (FGV), instituição responsável pela pesquisa e divulgação da evolução dos índices, informou que, no ano de 2020, o índice IGP-DI, com alta de 23,08%, apresentou acúmulo de 21,05%, enquanto a taxa Selic seguiu em baixa atingindo o percentual de 2,75% no mesmo período acumulado.
Assim, adicionando-se o percentual de 0,5%, previsto no art. 167 do Código Tributário de Goiás, tem-se que o total da correção monetária e juros de mora dos créditos ficais do estado obteve o acúmulo de 27,05%, ao passo que, com a queda da Selic no ano passado, se tem uma vasta diferença entre os cálculos atualizados pelo IGP-DI e a taxa Selic.
No dia 08/04/2021, foi encaminhado pelo poder Executivo para a Assembleia Legislativa o projeto de lei nº 4.699/2021. O projeto visa a alteração do Código Tributário do Estado- Lei Estadual nº 11.651/1991, para que seja adotada a taxa Selic na cobrança de multas, juros de mora e de correção monetária referente aos pagamentos de tributos em atraso, seja através de parcelamentos, alcançando ainda os casos de restituição de indébito tributário.
Encaminho à apreciação e à deliberação da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás o incluso projeto de lei ordinária que visa alterar a Lei estadual nº 11.651, de 26 de dezembro de 1991, que instituiu o Código Tributário do Estado de Goiás – CTE. O intuito da alteração é utilizar o Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELlC para a cobrança de juros de mora e de correção monetária para o pagamento de tributo em atraso, inclusive multas, e para os casos de parcelamento de crédito tributário e de restituição de indébito tributário. (OFÍCIO MENSAGEM Nº 76/2021/SECC, p. 01)
Com a iniciativa do Estado de adequação do CTE-GO ao Tema 1062, aguarda-se a alteração de 9 artigos. Além de harmonizarem os critérios goianos com o entendimento do STF, os dispositivos trazem benefícios para os contribuintes e até os incentiva a regularizarem suas situações com o Fisco estadual.
Com a repercussão geral do Tema 1062 e a demonstração da diferença entre os índices de correção em 2020, espera-se que os créditos fiscais em atraso do estado de Goiás sejam reduzidos em até 30% (trinta por cento). Dessa forma, irá auxiliar os contribuintes e executados com a revisão dos seus débitos fiscais.
Os contribuintes e executados que ensejam o pagamento de créditos fiscais, portanto, podem pleitear a revisão dos mesmos com a correção limitada a SELIC, nos meses em que for mais favorável, através de ação competente para a discussão e revisão da metodologia de atualização, ou até mesmo, suscitar a discussão de excesso de execução, na própria ação de execução fiscal, por se tratar de matéria de ordem pública.
Conforme recentes decisões do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, o contribuinte que suscitar a correção monetária através da Selic com base no Tema 1062 deve apresentar, através de planilha de cálculo detalhada ou produção de prova pericial contábil, a demonstração da revisão dos cálculos para que se comprove os encargos superiores a taxa Selic.
Até que a alteração do Código Tributário Estadual aconteça, os contribuintes podem buscar a revisão dos débitos tributários perante o poder judiciário do Estado de Goiás. Destaca-se apenas que, ainda, há divergência de entendimento sobre a possibilidade de discussão do excesso de execução nas próprias ações em que o tema foi sustentado.
Em contrapartida, em ação própria, o contribuinte poderá pleitear tutela antecipada, seja de urgência ou de evidência (presentes os requisitos cumulativos previstos pelo CPC), visando a obtenção da suspensão da cobrança integral do débito ou dos valores excedentes a atualização pela taxa Selic (Tema 1062), como já concedido pela 6ª Vara de Fazenda Pública Estadual de Goiás, nos seguintes termos:
Diante do exposto, DEFIRO PARCIALMENTE a tutela requerida, determinando a suspensão da exigibilidade das CDAs tão somente em relação às parcelas de JUROS MORATÓRIOS, CORREÇÃO MONETÁRIA (tema 1062) (…) [1].
Escrito por:
Nayara Lisboa Abdala, advogada, atuante na área de Direito Tributário e Empresarial no escritório Raul Bergesch Advogados. Associada no Instituto de Estudos Avançados em Direito e membro do Núcleo de Direito Tributário. E-mail para contato: nayara.abdala@live.com. Nayara está no Instagram como @nayaraabdala.adv e no LinkedIn como Nayara Abdala.
Frederico Sardinha Ferreira Chaves, advogado, atuante na área de Direito Tributário. Vice coordenador e membro do Núcleo de Direito Tributário do Instituto de Estudos Avançados em Direito. E-mail para contato: fredericosfc@gmail.com. Frederico está no Instagram como @7frederico e no LinkedIn como Frederico Sardinha.