Art. 854 do Novo CPC comentado artigo por artigo

Subseção V – Da penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira (art. 854 do Novo CPC)

O processo de execução, como vários institutos, sofreu algumas modificações com o advento do Novo CPC. Dando continuidade à análise do processo de execução, aborda-se, então, a a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira.

Art. 854 do Novo CPC

Art. 854.  Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução.

§ 1º No prazo de 24 (vinte e quatro) horas a contar da resposta, de ofício, o juiz determinará o cancelamento de eventual indisponibilidade excessiva, o que deverá ser cumprido pela instituição financeira em igual prazo.

§ 2º Tornados indisponíveis os ativos financeiros do executado, este será intimado na pessoa de seu advogado ou, não o tendo, pessoalmente.

§ 3º Incumbe ao executado, no prazo de 5 (cinco) dias, comprovar que:

  1. as quantias tornadas indisponíveis são impenhoráveis;
  2. ainda remanesce indisponibilidade excessiva de ativos financeiros.

§ 4º Acolhida qualquer das arguições dos incisos I e II do § 3º, o juiz determinará o cancelamento de eventual indisponibilidade irregular ou excessiva, a ser cumprido pela instituição financeira em 24 (vinte e quatro) horas.

§ 5º Rejeitada ou não apresentada a manifestação do executado, converter-se-á a indisponibilidade em penhora, sem necessidade de lavratura de termo, devendo o juiz da execução determinar à instituição financeira depositária que, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, transfira o montante indisponível para conta vinculada ao juízo da execução.

§ 6º Realizado o pagamento da dívida por outro meio, o juiz determinará, imediatamente, por sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, a notificação da instituição financeira para que, em até 24 (vinte e quatro) horas, cancele a indisponibilidade.

§ 7º As transmissões das ordens de indisponibilidade, de seu cancelamento e de determinação de penhora previstas neste artigo far-se-ão por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional.

§ 8º A instituição financeira será responsável pelos prejuízos causados ao executado em decorrência da indisponibilidade de ativos financeiros em valor superior ao indicado na execução ou pelo juiz, bem como na hipótese de não cancelamento da indisponibilidade no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, quando assim determinar o juiz.

§ 9º Quando se tratar de execução contra partido político, o juiz, a requerimento do exequente, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido por autoridade supervisora do sistema bancário, que tornem indisponíveis ativos financeiros somente em nome do órgão partidário que tenha contraído a dívida executada ou que tenha dado causa à violação de direito ou ao dano, ao qual cabe exclusivamente a responsabilidade pelos atos praticados, na forma da lei.

Art. 854, caput, do Novo CPC

(1) O art. 854, CPC/2015 prevê a forma de penhora online no processo de execução. É, então, uma modalidade de realizar a penhora pecuniária através da efetivação de créditos em meio eletrônico que tem ganhado destaque no ordenamento brasileiro. E contribui, principalmente, na hipótese de desconhecimento e/ou inexistência de bens penhoráveis do executado. Contudo, ressalta-se que o esgotamento dos meios de localização do patrimônio do devedor não é requisito.

(2) O caput do art. 854, Novo CPC, assim, traz algumas especificidades quanto ao modo de realizá-la. Observando-o, extrai-se, portanto, que:

  1. deve haver requerimento do exequente indicando que, havendo recursos do devedor, eles deverão, então, ser bloqueados. Portanto, inexistentes ou irrisórios os valores, pode-se não proceder à penhora. Ademais, é vedada a determinação ex officio. E apesar de o credor poder solicitar a medida já na petição inicial, não há vedações ao pedido posterior no curso do processo de ;
  2. A ciência do executado antes da penhora online não é obrigatória. Isto visa, assim, tanto a celeridade do procedimento, quanto a proteção do crédito.
  3. é necessário um sistema eletrônico próprio, que, no caso brasileiro, se trata do BacenJud e é gerido pelo Banco Central do Brasil.
  4. a indisponibilidade independe de notícia de valores e existentes e se limitará ao valor da execução.

(3) Por fim, o dispositivo se aplica também à execução fiscal, conforme o Enunciado 540 do Fórum Permanente de Processualistas Civis.

Bloqueio de ativos financeiros

(4) Após o pedido do exequente, no processo de execução, ser aceito pelo juiz, então, haverá uma ordem liminar de bloqueio dos ativos financeiros. A ordem de bloqueio, todavia, ainda não configura a penhora. Como coloca Didier [1], existe nesse momento inicial uma espécie de arresto. Dessa forma, ele disserta:

Assim, trata-se de meio executivo que está em conformidade com o princípio da adequação, constituindo-se na “principal modalidade executiva destinada à execução pecuniária, razão pela qual não se pode negá-la ao exequente, argumentando-se, por exemplo, não ter o órgão judiciário como proceder a tal forma de penhora ou não possuir o juiz da causa senha imprescindível para tanto”.

(5) O bloqueio, contudo, não implica em quebra de sigilo. Isto, porque, não há acesso às informações de movimentação financeira. O bloqueio é solicitado à instituição financeira, que fica, dessa maneira, responsável por efetivá-lo.

BacenJud

(6) O BacenJud, desse modo, é um sistema que interliga a Justiça ao Banco Central e às instituição bancárias. Assim, agiliza a solicitação de informações e o envio de ordens judiciais, no processo de execução, ao Sistema Financeiro Nacional, via internet.

(7) No pedido de Providências nº 2007.10.00.001581-8, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), enfim, determinou que todos os juízes de execução deveram se cadastrar no sistemas. Assim, com com senha previamente cadastrada, eles preenchem um formulário na  internet solicitando as informações necessárias a determinado processo  com o objetivo de penhora on-line ou outros procedimentos judiciais.

(8) A partir daí, então, a ordem judicial é repassada eletronicamente para os bancos, reduzindo o tempo de tramitação do pedido de informação ou bloqueio e, em consequência, dos processos.

Art. 854, parágrafo 1º, do Novo CPC

(9) O parágrafo 1º do art. 854, Novo CPC, é autoexplicativo. E trata, portanto, a eventual indisponibilidade excessiva nessa modalidade de penhora no processo de execução. Nessas hipóteses, então, o juízo deverá comunicar o cancelamento em até 24 horas. Do mesmo modo, a instituição também terá 24 horas para proceder ao cancelamento.

(10) De acordo com Didier [2] “os prazos curtíssimos se justificam por conta dos prejuízos evidentes que podem decorrer desse bloqueio indevido, sobretudo para atividades empresariais”. No entanto, por se tratar de prazo impróprio, não há penalidade para o descumprimento.

Art. 854, parágrafo 2º, do Novo CPC

(11) Como já observado, o executado não precisa ser citado previamente para que se realize a penhora online no processo de execução. Contudo, uma vez que seja efetivada a medida, ele deverá ser intimado. E, uma vez que não tenha advogado constituído, deverá ser intimado pessoalmente.

Art. 854, parágrafo 3º, do Novo CPC

(12) Intimado, portanto, o executado terá 5 dias para comprovar no processo de execução:

  1. a impenhorabilidade das quantias bloqueadas;
  2. a indisponibilidade excessiva de ativos financeiros.

(13) Caso o executado alegue alguma das hipóteses do art. 854, § 3º, Novo CPC, no processe de execução, o exequente deverá, então, ser intimado para se manifestar. E também terá 5 dias para fazê-lo.

Prazo preclusivo

(14) No caso de não realizar as alegações no processo de execução, contudo, existe divergência doutrinária acerca da natureza do prazo processual: se é preclusivo ou não.

(15) De acordo com Didier [3]: ” trata-se de prazo preclusivo: caso o executado não impugne o bloqueio nesse momento, não poderá fazê-lo posteriormente, em eventual impugnação ou embargos, caso ainda não tenham sido apresentados”.

(16) Todavia, Daniel Amorim Assumpção Neves [4] destaca:

O prazo de cinco dias previsto no art. 854, § 3º do Novo CPC não é preclusivo, porque tanto a impenhorabilidade como o excesso de penhora são matérias de ordem pública. Na realidade, a apresentação de defesa no prazo legal serve apenas para suspender – e se acolhida, impedir – a conversão da indisponibilidade em penhora.

Apesar de a defesa ser feita por meio de mera petição e versar sobre matéria de ordem pública, não deve ser confundida com a exceção de pré-executividade em razão de suas limitações cognitivas. A defesa ora analisada, em respeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa, pode demandar qualquer meio de prova, sendo do executado o ônus de provar a impenhorabilidade de bens e o excesso de penhora.

Art. 854, parágrafo 4º, do Novo CPC

(17) A matéria, então, será decidida através de decisão interlocutória no processo de execução. Desse modo, poder-se-á recorrer por meio de agravo de instrumento, nos moldes do art. 1.015, Novo CPC.

(18) Acolhida, assim, uma das alegações do parágrafo 3º do art. 854, Novo CPC, enfim, o juiz deverá determinar o cancelamento da indisponibilidade, de acordo com o parágrafo 4º do art. 854, Novo CPC. E, conforme o parágrafo 1º, portanto, a instituição deverá proceder ao cancelamento em até 24h.

Art. 854, parágrafo 5º, do Novo CPC

(19) Contudo, caso a defesa do executado seja rejeitada no processo de execução ou ele não a apresente, o bloqueio será convertido em penhora, conforme o parágrafo 5º do art. 854, Novo CPC.

(20) Será desnecessária, então, a lavratura do termo de penhora. Todavia, em até 24h da comunicação, a instituição financeira depositária deverá transferir o montante para uma conta vinculada ao juízo da execução.

Art. 854, parágrafo 6º, do Novo CPC

(21) Do mesmo modo, realizado o pagamento da dívida objeto do processo de execução por outro meio, o juiz deverá comunicar a instituição financeira acerca do cancelamento da indisponibilidade, nos moldes do parágrafo 6º do artigo 854, Novo CPC.

Art. 854, parágrafo 7º, do Novo CPC

(22) O parágrafo 7º do art. 854, Novo CPC, dessa forma, dispõe sobre as comunicações realizadas acerca da medida no processo de execução. Então, tanto a ordem de indisponibilidade, quanto as ordens de cancelamento ou penhora, deverão ser comunicadas pelo próprio sistema eletrônico.

Art. 854, parágrafo 8º, no Novo CPC

(23) O parágrafo 8º do art. 854, Novo CPC, então, apresenta a previsão da responsabilidade objetiva da instituição financeira na penhora online durante o processo de execução. Uma vez que todos os atos são realizados eletronicamente, através do sistema por ela gerido, ela é responsável pelos eventuais danos ou falhas.

(24) Nas palavras de Neves [5]:

A instituição financeira será responsável pelos prejuízos causados ao executado em decorrência da indisponibilidade de ativos financeiros em valor superior ao indicado na execução ou pelo juiz, bem como na hipótese de não cancelamento da indisponibilidade no prazo de 24 horas, quando assim determinar o juiz. Apesar da omissão legal, também responde na hipótese de falha no processo de bloqueio que frustre a constrição judicial.

A responsabilidade objetiva da instituição financeira recai sobre prejuízos causados ao exequente (quando deixa de atuar regularmente e assim frustra a penhora), ao executado (quando torna indisponível valor superior ao executado ou deixa de cancelar a indisponibilidade no prazo legal) e a terceiro (que pode ser atingido por indisponibilidade em sua conta).

(25) Essa tese, por fim, é reforçada pelo Enunciado 541 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, que dispõe:

541. (art. 854, §§ 7º e 8º) – A responsabilidade que trata o art. 854, § 8º, é objetiva e as perdas e danos serão liquidadas de forma incidental, devendo ser imediatamente intimada a instituição financeira para preservação do contraditório. (Grupo: Execução)

Art. 854, parágrafo 9º, do Novo CPC

(26) O parágrafo 9º do artigo 854, Novo CPC, por fim, dispõe acerca do processo de execução em que figure como polo passivo partido político. Desse modo, nessas hipóteses, os ativos financeiros bloqueados deverão:

  • estar em nome do órgão partidário que tenha contraído a dívida objeto do processo de execução; ou
  • estar em nome do órgão que tenha dado causa à violação de direito ou ao dano, sendo, portanto, responsável pelos atos praticados na forma do art. 15-A da Lei 9.096/1995.

(27) O art. 15-A da Lei 9.096/1995 dispõe, assim:

Art. 15-A. A responsabilidade, inclusive civil e trabalhista, cabe exclusivamente ao órgão partidário municipal, estadual ou nacional que tiver dado causa ao não cumprimento da obrigação, à violação de direito, a dano a outrem ou a qualquer ato ilícito, excluída a solidariedade de outros órgãos de direção partidária.

Parágrafo único. O órgão nacional do partido político, quando responsável, somente poderá ser demandado judicialmente na circunscrição especial judiciária da sua sede, inclusive nas ações de natureza cível ou trabalhista.

(28) A responsabilidade, portanto, não é solidária em relação ao partido.

Referências

  1. DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: execução. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2017. v. 5, p. 881.
  2. DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: execução. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2017. v. 5, p. 881.
  3. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2017, p. 1261.
  4. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2017, p. 1262.
  5. DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil: execução. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2017. v. 5, p. 84.

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